A redução da maioridade penal e a obtenção da Carteira Nacional de Habilitação

A redução da maioridade penal e a obtenção da Carteira Nacional de Habilitação

Demonstra os reflexos da redução da maioridade penal nas atuais exigências para a obtenção da Carteira Nacional de Habilitação.

Muito tem se discutido a respeito da redução da maioridade penal no Brasil, assunto que tem atraído, cada vez mais, a atenção da mídia, dos parlamentares e da sociedade em geral, principalmente em decorrência da crescente violência em nosso país, que tem revelado uma triste realidade, estampada na participação de menores de idade nos mais diversos crimes.

O polêmico assunto encontra-se, atualmente, na pauta de seis propostas de emenda à Constituição Federal, em tramitação na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado Federal. Sem a intenção de tomar partido na questão, que é merecedora de cuidadoso debate, prefiro a cautela expressada nas recentes declarações da Exma. Srª. Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministra Ellen Gracie, segundo a qual o combate à violência em nosso país depende de um conjunto de soluções e não pode ser encarada como um problema cujo remédio esteja apenas na mudança e recrudescimento da lei, opinião compartilhada pelo Sr. Presidente da Câmara dos Deputados, Deputado Federal Arlindo Chinaglia, que se manifestou contrário à pressão social exercida atualmente, para que haja uma rápida análise e votação dos projetos que se encontram em tramitação no Congresso Nacional e que tratam da segurança pública (opiniões estas que foram motivo de notícias veiculadas pela imprensa nas últimas semanas).

Feita esta consideração inicial, a fim de justificar meu enfoque estritamente racional sobre o tema, pretendo, com este artigo, demonstrar um aspecto específico de nossa legislação de trânsito, que será diretamente atingido, caso a imputabilidade penal seja reduzida dos atuais 18 anos, conforme previsão estabelecida no artigo 228 da Constituição Federal e reiterada no artigo 27 do Código Penal: trata-se do requisito constante do inciso I do artigo 140 do Código de Trânsito Brasileiro, segundo o qual o candidato à habilitação para conduzir veículo automotor e elétrico deve ser “penalmente imputável”. Veja-se que, ao contrário do que normalmente se imagina, não estabelece nosso Código de Trânsito uma idade mínima para a obtenção da Carteira Nacional de Habilitação, mas a referência se dá, única e exclusivamente, à imputabilidade penal, pois pretendeu o legislador de trânsito estabelecer a possibilidade de responsabilização criminal daquele que dirige um veículo, pelos eventuais delitos cometidos nesta condição.

De modo diverso, verifica-se que, em outras circunstâncias, o mesmo Código de Trânsito preferiu não vincular determinada exigência na condução de veículos automotores a uma condição referencial, mas estabeleceu, de maneira taxativa, qual é a idade biológica que se constitui como requisito legal, como se vê nos artigos 138 e 145:

“Art. 138 - O condutor de veículo destinado à condução de escolares deve satisfazer os seguintes requisitos:

I - ter idade superior a vinte e um anos;...”

“Art. 145 - Para habilitar-se nas categorias D e E ou para conduzir veículo de transporte coletivo de passageiros, de escolares, de emergência ou de produto perigoso, o candidato deverá preencher os seguintes requisitos:

I - ser maior de vinte e um anos;...”

Assim, nos casos acima assinalados, ao contrário do que alguns imaginam, a redução da maioridade civil, decorrente da alteração do Código Civil, ex vi o artigo 5º da Lei nº 10.406/02 (“A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil”) nenhuma mudança ocasionou nos requisitos estabelecidos nos artigos 138 e 145 do CTB, permanecendo a regra fixa dos vinte e um anos, posto que, neste caso, a exigência legal nada tinha a ver com a maioridade civil, mas se tratava de um limite preestabelecido pelo legislador, a partir do qual este entendeu ter o candidato àquelas habilitações um desenvolvimento psico-biológico adequado às diversidades profissionais a elas inerentes.

No caso sob análise, entretanto, a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos (ou qualquer outra idade que porventura se decida), sem alteração específica na Lei nº 9.503/97 (Código de Trânsito Brasileiro), automaticamente possibilitará o início do processo de habilitação aos novos “maiores de idade”, o que exige uma análise crítica sobre esta possível futura realidade, já que é notório o fato de que os acidentes de trânsito constituem uma das maiores causas de mortalidade em nosso país e que a conquista da habilitação pelos mais jovens representa, muitas vezes (e sem exageros), a concessão de uma licença para conduzir uma potencial arma, em especial se o condutor não estiver preparado psico-biologicamente para esta nova fase de sua vida, preocupação que se evidencia justamente no ano em que o tema “O jovem e o trânsito” foi escolhido pelo CONTRAN, para as campanhas educativas de trânsito, em especial durante a Semana Nacional de Trânsito (18 a 25 de setembro), mantendo e reforçando as diretrizes estabelecidas para a I Semana Internacional de Prevenção de Acidentes de Trânsito, programada pela Organização Mundial de Saúde e pela Organização Pan-Americana de Saúde, em Genebra, entre os dias 23 e 29 de abril de 2007.

(Obs.: para ler o release sobre a Semana Nacional de Trânsito de 2007, visite a homepage do DENATRAN, clicando em http://www.denatran.gov.br/campanhas/semana/2007/semana2007.htm).

Sobre o(a) autor(a)
Julyver Modesto de Araujo
Mestre em Direito do Estado pela PUC/SP e Especialista em Direito Público pela Escola Superior do Ministério Público de SP. Oficial da Polícia Militar do Estado de São Paulo, tendo realizado diversas atividades relacionadas ao...
Ver perfil completo
O conteúdo deste artigo é de responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
Lista de leitura
Adicione este artigo à sua lista de itens para ler depois
Adicionar à lista

Artigos relacionados

Leia mais artigos sobre o tema publicados no DN

Notícias relacionadas

Veja novidades e decisões judiciais sobre este tema

Economize tempo e aumente sua produtividade com o DN PRO Seja um assinante DN PRO e tenha acesso ilimitado a todo o conteúdo que agiliza seu processo de elaboração de peças e mantém você sempre atualizado sobre o mundo jurídico. 7.530 modelos e documentos essenciais para o seu dia a dia Atualizados regularmente por especialistas em Direito Ideal para advogados e profissionais da área jurídica Apenas R$ 24,90 por mês Veja exemplos gratuitos