Do pagamento proporcional a jornada de trabalho do doméstico

Do pagamento proporcional a jornada de trabalho do doméstico

Advoga a tese, com fulcro na doutrina e na jurisprudência, de que o empregado doméstico pode receber remuneração proporcional à sua jornada prestada, mesmo que tal remuneração seja menor do que o mínimo legal.

Hodiernamente, dentro da sociedade moderna, a contratação de serviços domésticos possui duas facetas, a primeira se refere a necessidade da contratação em virtude das mudanças oriundas da própria sociedade, principalmente quanto ao êxodo feminino ao mercado de trabalho, deixando os afazeres do lar para aqueles que prestam serviços especializados na área. A segunda diz respeito ao alto custo monetário trazido pela contratação de tais profissionais, afinal, é notório que as famílias brasileiras possuem orçamento limitado e evitar gastos é fundamental.

Sob este prisma, a solução encontrada pelos empregadores domésticos foi a contratação de autônomos – diaristas, para a realização de tais serviços. Estes profissionais, por sua vez, não possuem vínculo empregatício com aqueles que contratam seus préstimos, posto que, conforme já mencionado, tratam-se de autônomos.

Ocorre que os diaristas nem sempre são capazes de resolver os problemas daqueles que os contratam, posto que não podem laborar todos os dias sob pena de fazer surgir o vínculo empregatício, o que encareceria demais o contrato.

Noutro ponto, a relação entre os donos do lar com um autônomo doméstico nem sempre é permeada da mesma confiança que rege os contratos de trabalho com efetivo vínculo empregatício. Ora, os serviços domésticos possuem suas peculiaridades, vez que o empregado passa a conviver com a família empregadora, muitas vezes até morando com a mesma, conhecendo, desta forma, a intimidade do núcleo familiar.

Seguindo esta lógica de pensamentos concluiríamos que um contrato de trabalho com vínculo empregatício, com a garantia de todos os direitos laborais, seria por demais oneroso para a família brasileira, enquanto que de outro lado teríamos um contrato firmado com um autônomo, que seria pago pelo dia de trabalho, mas que não supriria todas as necessidades do empregador, tendo em vista a impossibilidade legal de se comparecer diariamente ao trabalho sem configuração do vínculo empregatício.

Outrossim, acreditamos que a saída para esta problemática seria o pagamento proporcional à jornada de trabalho prestada pelo empregado doméstico. Ou seja, nos casos em que o empregado doméstico labore tão somente um expediente, e não dois como é comum, ou que labore em dias alternados, que seja remunerado com metade do salário que receberia se trabalhasse o dia inteiro, mesmo que tal remuneração seja abaixo do mínimo legal.

O ínclito juslaboralista Sérgio Pinto Martins, em sua obra Direito do Trabalho, 13ª Edição, Ed. Atlas, pág. 199, assim se posiciona sobre o pagamento proporcional a jornada de trabalho:

O salário a ser pago aos empregados sob o regime de tempo parcial será proporcional à sua jornada, em relação aos empregados que cumprem, nas mesmas funções, tempo integral.

Isso quer dizer que o empregador deverá observar o mínimo horário, o piso salarial horário da categoria profissional ou, se for o caso, o salário profissional horário. Não será possível pagar salário inferior aos mencionados.

O salário dos empregados a tempo parcial será proporcional à sua jornada em relação aos que cumprem, nas mesmas funções, tempo integral. Isso quer significar que o empregado contratado a tempo parcial deve ganhar o mesmo salário horário que outro empregado exercente da mesma função.”

Nesta mesma linha de raciocínio encontramos diversos julgados que corroboram nossa tese, seja com relação aos empregados domésticos ou não. Vejamos:

DOMÉSTICO – JORNADA REDUZIDA – SALÁRIO PROPORCIONAL – A legislação estabelece o salário por hora, dia ou mês, fixando o valor mínimo devido, inexistindo qualquer previsão legal no sentido de que a jornada reduzida para pagamento na proporção deva ser pactuada por escrito, ainda mais em se tratando de empregado doméstico, onde as regras são limitadas e não exige qualquer tipo de formalismo. (TRT 3ª R. – RO 1348/99 – 3ª T. – Rel. Juiz José Eustáquio de Vasconcelos Rocha – DJMG 12.10.1999 – p. 16)

DOMÉSTICO – SALÁRIO PROPORCIONAL – Não há irregularidade alguma no pagamento de cinqüenta por cento do salário mínimo para o trabalho doméstico inferior a cento e dez horas mensais. (TRT 3ª R. – RO 12201/97 – 1ª T. – Rel. Juiz Ricardo Antônio Mohallem – DJMG 13.03.1998)

SALÁRIO-MÍNIMO – PROPORCIONALIDADE – JORNADA DE TRABALHO REDUZIDA – Em se tratando de jornada laboral menor do que aquela prevista pela atual Carta Magna e legislação ordinária, devido o mínimo legal, proporcionalmente calculado em relação ao tempo de trabalho despendido pelo empregado. Recurso de Revista conhecido e provido. (TST – RR . 378548 – 1ª T. – Rel. Min. Conv. Vieira de Mello Filho – DJU 08.02.2002)

JCF.7 JCF.7.XIII – RECURSO DE REVISTA – SALÁRIO MÍNIMO – PROPORCIONALIDADE À JORNADA DE TRABALHO – DESNECESSIDADE DE PREVISÃO EXPLÍCITA NO CONTRATO DE TRABALHO – O art. 7º, XIII, da CF/88 estabelece a jornada de trabalho de oito horas diárias ou de quarenta e quatro semanais. O salário-mínimo, que também exsurge de regra constitucional, há de ser entendido e harmonizado com a jornada, acima prevista, daí podendo ser pago proporcionalmente ao número de horas trabalhadas pelo empregado. A jornada reduzida não necessita de previsão expressa, assim como a respectiva remuneração. Recurso de Revista conhecido e acolhido. (TST – RR 714305 – 2ª T. – Rel. Min. Conv. José Pedro de Camargo – DJU 30.03.2001 – p. 655)

JORNADA DE TRABALHO PROPORCIONAL – SALÁRIO MÍNIMO-HORA PROPORCIONAL – O salário mínimo pode ser mensal, diário (valor mensal dividido por 30) ou horário (valor mensal dividido por 220 horas). Como se vê, a Lei usou o critério de remuneração diária e previu a jornada normal. Destarte, se o empregado for admitido para trabalhar apenas cinco horas por dia, receberá proporcionalmente, sem qualquer ilegalidade. O que deve ser respeitado o salário mínimo-hora e não o salário mínimo diário que supõe o trabalho durante oito horas. (TRT 3ª R. – RO 22246/98 – 4ª T. – Rel. Juiz João Roberto Borges – DJMG 07.08.1999 – p. 8)

JORNADA REDUZIDA DE TRABALHO – SALÁRIO PROPORCIONAL – Constatada a jornada de trabalho reduzida da Reclamante, seu salário deve ser fixado proporcionalmente com as horas trabalhadas, in casu, 50% do salário mínimo. (TRT 7ª R. – REO-RVol 05978/99 – Ac. nº 07817/99-1 – Rel. Juiz João Nazareth Pereira Cardoso – J. 03.11.1999)

SALÁRIO MÍNIMO – JORNADA REDUZIDA – A garantia do salário mínimo, esta prevista para aqueles que trabalhem dentro da jornada normal prevista constitucionalmente. Assim é que, se a jornada laboral do empregado é menor do que aquela prevista pela Carta Magna, então ser-lhe-a devido o mínimo proporcionalmente ao tempo de trabalho por ele despendido. Recurso conhecido e desprovido. (TST – RR 143562/1994 – 5ª T. – Rel. Min. Armando de Brito – DJU 18.04.1997 – p. 14281)

Conforme vislumbramos nos julgados acima, o ponto base da questão cinge-se ao fato de que ao mesmo tempo em que a Carta Magna de 1988 garante o pagamento do mínimo estabelecido em lei, prevê também uma determinada jornada de trabalho. Em sendo assim, forçoso é concluir que o pagamento do mínimo legal se refere, ou está relacionado ao tempo de trabalho prestado.

Todavia, devemos ressaltar que este não é o entendimento predominante na jurisprudência pátria, que entende que ninguém deve ser remunerado com salário inferior ao mínimo legal.

Mesmo assim cremos que o pagamento proporcional a jornada de trabalho prestada traria maiores benefícios para ambas as partes, posto que de um lado estaria-se respeitando as condições econômico-financeiras das famílias brasileiras, e de outro seria um estímulo a própria contratação de mão-de-obra doméstica. Ademais, o empregado doméstico, ao contrário do diarista, seria beneficiado com todos os direitos trabalhistas, como 13º salários e férias + 1/3. Frise-se, ainda, que haverá efetivamente a contribuição ao INSS (considerando que apenas a minoria dos autônomos tem o esclarecimento suficiente para entender a necessidade de tal contribuição), que após vários anos de labor irá resultar em direito a aposentadoria, imprescindível aos corpos já cansados e calejados daqueles que alcançaram a terceira idade e que trabalharam a vida toda.

Também há de se levar em consideração o fato de que o obreiro ainda irá dispor de outro expediente, onde poderá prestar serviços em outra residência, ou mesmo trabalhar como diarista (autônomo), complementando, assim, sua renda mensal.

Importante lembrar que caso haja o pagamento integral ao trabalhador, sem considerar sua jornada de trabalho, haverá um enriquecimento sem causa por parte do empregado, posto que estará se pagando por um serviço que não foi prestado.

Em sendo assim, concluí-se que o pagamento proporcional a jornada de trabalho prestado pelo empregado doméstico, além de estar de acordo com a legislação, somente traz benefícios para ambas as partes que compõem a relação empregatícia, bem como a toda a sociedade que vê os índices de desemprego, e suas cruéis conseqüências, diminuírem.

Sobre o(a) autor(a)
Rodrigo Câmara
Advogado
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