O princípio da boa-fé objetiva nas relações contratuais

O princípio da boa-fé objetiva nas relações contratuais

Análise acerca da evolução histórica da boa-fé objetiva no Direito, bem como versa sobre o atual entendimento doutrinário e jurisprudencial sobre o tema.

No campo do Direito contemporâneo, o princípio da boa-fé objetiva, muito embora não expressamente previsto na Constituição Federal, tem importância relevante no campo de pacificação das relações sociais e efetivação da dignidade da pessoa humana. Tal relevância se acentuou quando, em 2002, passou a haver previsão expressa no Código Civil, impondo significativas condutas no desenvolvimento das relações jurídicas.

Com especial incidência nas esferas obrigacional e contratual, a consolidação da boa-fé objetiva como regra de conduta exerce, na atualidade, papel norteador no sistema jurídico civil. Trata-se, portanto, de princípio de fundamental relevância no campo das relações jurídicas, com destaque para as relações entre particulares, mas também em âmbito de direito público.

No presente trabalho, serão visitados elementos relativos à evolução histórica deste conceito, bem como o entendimento doutrinário e jurisprudencial atual sobre o tema, na realidade brasileira.

Boa-fé objetiva: breve percurso histórico  

As raízes históricas da boa-fé estão no Direito Romano. Iniciou-se através de uma espécie de preceito ético, pautado em ideais de confiança, que garantiriam o cumprimento de contratos celebrados (fides). Posteriormente, à fides se acrescentou o adjetivo bona, passando a fides bona, já significando boa-fé em sentido objetivo, enquanto uma norma de comportamento na celebração de negócios (SILVA, 2015)

Posteriormente, em meio aos ideais do positivismo exegético, à figura do juiz cabia tão somente a interpretação no sentido literal da lei, não sendo cabível, portanto, a consideração do princípio da boa-fé em um caso concreto pela ausência deste nas leis vigentes (SILVA, 2015).

Foi, no entanto, o Direito Germânico, que, mediante a inserção de uma nova cláusula em seu código civil no ano de 1900, inseriu a boa-fé de forma positivada, passando a prever a obrigação de cumprimento de direitos emergentes dos contratos, bem como a necessidade da observância dos interesses da outra parte, no exercício dos direitos (LIGMANOVSKI & GOMES, 2008).

Assim, nas palavras de Silva (2015), foi “(...) cunhada a expressão Treu und Glauben (lealdade e crença/confiança à palavra dada) consagrada na doutrina germânica, indicativa da boa-fé obrigacional, de acepção objetiva, a qual deve presidir às relações negociais, sendo corporificada numa regra de conduta a ser observada pelas partes no cumprimento das suas obrigações.” (p. 1142)

Esta mudança foi bastante significativa, uma vez que, até este momento, a boa-fé estava situada no campo moral, ou seja, interna, subjetiva  e sem possibilidade de ser algo exigível. A partir desta positivação, criou-se espaço para que houvesse coerção legal a quem descumprisse tal princípio (REALE, 2003).

A partir deste percurso, no Direito Contemporâneo, o princípio da boa-fé objetiva já está previsto expressamente nas legislações de diversos outros países, confirmando a relevância de sua força normativa no ordenamento jurídico atual (SILVA, 2015).

Considerando-se a realidade brasileira, conforme Reale (2003), no processo de elaboração do Código Civil de 2002, já foi incluída a chamada “eticidade”, que, segundo ele, tem raiz na boa-fé, elementos que marcam importantes diferenças do Código atual em relação ao anterior, de 1916. Nas palavras do autor:

“Como se vê, a boa-fé não constitui um imperativo ético abstrato, mas sim uma norma que condiciona e legitima toda a experiência jurídica, desde a interpretação dos mandamentos legais e das cláusulas contratuais até as suas últimas consequências. Daí a necessidade de ser ela analisada como conditio sine qua non da realização da justiça ao longo da aplicação dos dispositivos emanados das fontes do direito, legislativa, consuetudinária, jurisdicional e negocial.” (REALE, 2003).

Trata-se, portanto, de preceito jurídico com peso e relevância reconhecidos pela doutrina e jurisprudência brasileiras, como se verá a seguir.

Boa-fé objetiva: entendimento doutrinário           

Inicialmente, importante destacar que a boa-fé é uma expressão que contém muitos significados e que estes podem variar conforme a cultura local e também com a história do país. 

Conforme Reale (2003), no Direito contemporâneo brasileiro, é possível dizer que ela apresenta duas formas diferentes de expressão, sendo uma objetiva e outra subjetiva. A esta segunda corresponde, fundamentalmente, um atributo psicológico, que reflete uma decisão da vontade, voltada para a inclinação individual da parte em agir dentro do que preceitua o Direito. Neste contexto, no plano subjetivo, “a boa-fé se relaciona à intenção do sujeito da relação jurídica, seu estado psicológico ou íntima convicção”  (LIGMANOVSKI & GOMES, 2008, p. 4613).

Por outro lado, a chamada boa-fé objetiva caracteriza-se como uma espécie de “exigência de lealdade, modelo objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe o poder-dever que cada pessoa ajuste a própria conduta a esse arquétipo, obrando como obraria uma pessoa honesta, proba e leal” (REALE, 2003). Sob este prisma, a conduta da parte dotada de boa-fé objetiva é entendida como sinônimo de honestidade, reconhecida publicamente.

É no Código Civil de 2002 que se encontram os principais registros formais acerca da boa-fé objetiva, em nosso ordenamento jurídico brasileiro. Conforme entendimento doutrinário, a boa-fé objetiva foi inserida em referido Código na condição de um princípio de cunho social, mediante a cláusula geral constante no artigo 422, a saber: “Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.”

Assim, conforme Pamplona Filho e Hora Neto (2020), os efeitos desta positivação da boa-fé objetiva em nosso ordenamento jurídico, na forma pela qual se realizou, implica que os deveres de conduta que emanam da da probidade e da boa-fé objetiva devem, obrigatoriamente, permear todas as fases do contrato.

Com base neste contexto doutrinário, os contratantes necessitam ser entendidos como parceiros leais, que deverão auferir suas vantagens a partir de expectativas legítimas, sem excessos irracionais ou desproporcionais (LIGMANOVSKI & GOMES, 2008).

Desta forma, a partir do entendimento de alguns autores, o princípio da boa-fé objetiva se mostra como principal tradução do princípio da confiança, e, a partir dele, impõe-se aos contratantes que se comportem com lisura e retidão, a fim de se evitar a frustração da legítima expectativa e confiança despertada na outra parte (TARTUCE, 2020).

Considerando-se a legislação vigente no Brasil, no que tange à positivação da boa-fé objetiva, importante destacar também o contido no artigo 187 do Código Civil, a saber: “Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.”

Emana, de referido artigo, uma espécie de função limitadora da boa-fé objetiva, no sentido de coibir o exercício abusivo dos direitos subjetivos (SILVA,2015).  Assim, ao limitar a atuação dos contratantes, estabelece, conforme o entendimento destes autores, um novo modelo de atuação não abusiva, baseado em confiança e respeito mútuo.

Há ainda, outro artigo do Código Civil que também menciona aa boa-fé objetiva, a saber:

“Art. 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração.

§ 1º A interpretação do negócio jurídico deve lhe atribuir o sentido que:

(...) III - corresponder à boa-fé; “

Tal dispositivo insere, conforme PAMPLONA FILHO & HORA NETO (2020) uma dimensão interpretativa, na medida em que preceitua que os contratos devem ser interpretados com base no princípio da boa-fé. Isto porque, conforme referidos autores,  todo contrato é a expressão de um acordo de vontades, interessando, portanto, também à sociedade, para além das partes envolvidas. 

Assim, conforme entendimento doutrinário, é através da hermenêutica que se descobre o sentido contido nas declarações, através da atribuição de uma verdade apropriada. Pode-se depreender, a partir deste dispositivo legal, a normativa de que mantenha-se como parâmetro, na interpretação dos negócios jurídicos, a dignidade da pessoa humana (TARTUCE, 2020).

Na contemporaneidade, conforme reconhecem os doutrinadores, as condutas previstas pelo princípio da boa-fé objetiva  têm sido cada vez mais exigidas e observadas nas relações jurídicas contratuais de nossos dias, o que revela um espírito maior de colaboração e cooperação entre os contratantes (SILVA, 2015).

Assim, para alguns doutrinadores, pode-se inferir que o princípio da boa-fé objetiva deve ser considerado princípio constitucional, a ser aplicado pelo Poder Judiciário nos  casos concretos, de forma a se efetivarem princípios como o da dignidade da pessoa humana (PAMPLONA FILHO & HORA NETO, 2020). Tais aspectos se revelariam, sobretudo, numa dimensão interpretativa da lei e doutrina, mediante a aplicação das mesmas sobre demandas judiciais, podendo ser evidenciados a partir do entendimento jurisprudencial a respeito, conforme tópico a seguir.

Boa-fé objetiva: entendimento jurisprudencial

A aplicação do Direito requer uma atividade hermenêutica ou interpretativa, que visa enquadrar a demanda do caso concreto em questão numa norma jurídica que lhe caiba. Assim, antes de aplicar o Direito, é fundamental a interpretação da norma, para que esta se transforme numa realidade eficiente tanto no plano do indivíduo como no da coletividade (TARTUCE, 2020).  

Importa, neste âmbito, garantir segurança jurídica, mediante congruência e consistência nas decisões judiciais, sendo este um meio de atingir o bem de todos e garantir a dignidade da pessoa humana. Vários são os princípios que regem a contratualização na contemporaneidade, a saber: função social do contrato, boa-fé objetiva e equilíbrio contratual, devendo estes, portanto, nortear decisões judiciais a respeito (PAMPLONA FILHO & HORA NETO, 2020).

Neste âmbito, torna-se, portanto, relevante o papel das cortes para introduzir no sistema brasileiro enunciados referentes a estas temáticas, podendo nortear decisões futuras sobre o mesmo assunto. A seguir, alguns exemplos de julgados recentes nesta seara, com finalidade ilustrativa acerca da forma como o princípio da boa-fé objetiva tem sido aplicado em âmbito civil.

APELAÇÃO CÍVEL. CIVIL. PLANO DE SAÚDE. ENTIDADE DE AUTOGESTÃO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. TRANSPLANTE CARDÍACO. PRESERVAÇÃO DA VIDA. RESOLUÇÃO NORMATIVA Nº 428/2017. PATAMAR MÍNIMO DE COBERTURA. RELATIVIZAÇÃO. FORÇA OBRIGATÓRIA DOS CONTRATOS. BOA-FÉ OBJETIVA. LEGÍTIMA EXPECTATIVA. DANO MORAL. RECURSO DESPROVIDO. 1. Hipótese de pretensão deduzida para compelir a ré a custear o procedimento de transplante cardíaco indicado à recorrida. 1.1. Além disso, objetivou ainda a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais alegadamente suportados. 2. É inaplicável o Código de Defesa do Consumidor a contratos de plano de saúde administrados por entidades de autogestão. 3. Comprovado que o procedimento em questão é a última via disponível para preservar a saúde da recorrida, não é legítima a alegação de que o procedimento cirúrgico pretendido não encontra amparo contratual ou normativo. 4. A Resolução Normativa nº 428/2017, em seu Anexo I, estabelece o patamar mínimo de cobertura, o que não impede a realização de outros procedimentos que não constem no aludido rol. 5. A relativização da força obrigatória dos contratos, somada aos avanços constantes da medicina, retiram da administradora do plano a possibilidade de delimitar ou limitar os métodos e alternativas de tratamento. 6. A recusa da prestação do tratamento indicado pelo médico, no caso, malfere o princípio da boa-fé objetiva, bem como a legítima expectativa da paciente nutrida no momento da contratação do plano de saúde. 6.1. Interpretação em favor da recorrida compatível com a equidade, boa-fé e com o princípio da dignidade da pessoa humana. 7. O fato de dispor o SUS de equipamento e pessoal aptos a executar o procedimento em questão, essa peculiaridade não afasta a prestação do serviço médico contratado. 8. Diante das circunstâncias específicas do caso concreto, a negativa de cobertura do procedimento de transplante cardíaco indicado pelo médico responsável, além de ilegítima, é também apta a ensejar danos à esfera jurídica extrapatrimonial da demandante. Precedentes. 9. Recurso conhecido e desprovido. (TJ-DF 07065923120208070007 DF 0706592-31.2020.8.07.0007, Relator: ALVARO CIARLINI, Data de Julgamento: 14/04/2021, 3ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no PJe : 29/04/2021 . Pág.: Sem Página Cadastrada.)

AÇÃO DE COBRANÇA - BOA-FÉ OBJETIVA - INADIMPLEMENTO - INEXISTÊNCIA. Dentre os princípios que norteiam o direito contratual, em meio àqueles de maior importância, está o da boa-fé objetiva, que obriga os contratantes a agirem, seja na fase de negociação ou de execução do contrato, segundo padrões éticos de confiança, lealdade e probidade. Nas hipóteses em que inexiste efetivo inadimplemento deve ser julgado improcedente o pedido inicial de cobrança. Para que se configure a litigância de má-fé é necessário que se demonstre conduta intencionalmente maliciosa da parte ou o manejo de lide temerária, bem como a existência de dano processual à parte adversa. (TJ-MG - AC: 10024131845703001 MG, Relator: Estevão Lucchesi, Data de Julgamento: 27/08/0019, Data de Publicação: 06/09/2019)

APELAÇÃO CÍVEL. CIVIL. CONTRATOS. BOA-FÉ OBJETIVA. AUTONOMIA. LIMITAÇÃO. PLATAFORMA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE PESSOAL (99). RESCISÃO CONTRATUAL UNILATERAL. POSSIBILIDADE. LIBERDADE CONTRATUAL. NECESSIDADE DE AVISO PRÉVIO COM TEMPO RAZOÁVEL. EFICÁCIA HORIZONTAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. DANOS MORAIS. SENTENÇA REFORMADA. 1. Em que pese ser valor preponderante nas relações privadas entre particulares, a autonomia da vontade não é ilimitada, encontrando baliza em princípios como a boa-fé objetiva e a razoabilidade, de forma que o descredenciamento do motorista do aplicativo de transporte demanda notificação prévia. 2. Os direitos fundamentais, que originalmente foram concebidos para serem oponíveis contra as arbitrariedades do Estado, hodiernamente têm sido invocados e admitidos nas relações interprivadas, nos termos da denominada "Teoria da eficácia horizontal dos direitos fundamentais". 3. O bloqueio do perfil do motorista no aplicativo sem notificação prévia e, ainda, sem explicação posterior plausível causa lesão aos direitos de personalidade porque o aplicativo é utilizado para auferir renda para seu sustento, sendo certo que a impossibilidade repentina de utilizá-lo ultrapassa o mero dissabor cotidiano. 4. O valor da indenização por danos morais tem o intuito meramente compensatório e é fixado em razão da gravidade da ilicitude do ato cometido, com atenção ao necessário caráter pedagógico, e da capacidade econômica dos envolvidos, para que seja proporcional e não resulte em enriquecimento sem causa. 5. Recurso conhecido e parcialmente provido. (TJ-DF 07282558820198070001 DF 0728255-88.2019.8.07.0001, Relator: LEILA ARLANCH, Data de Julgamento: 27/02/2020, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 18/03/2020 . Pág.: Sem Página Cadastrada.)

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA. 1. SEGURO FINANCEIRO HABITACIONAL. NECESSIDADE DE NOVA APRECIAÇÃO PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS COM OBSERVÂNCIA DA ORIENTAÇÃO MAIS RECENTE DESTA CORTE SOBRE A MATÉRIA. 2. AGRAVO IMPROVIDO. 1. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que, à luz da boa-fé objetiva que rege os contratos, é nula a cláusula contratual que, em seguro habitacional, exclui a cobertura dos danos causados pelos vícios de construção. Destarte, constata-se a necessidade de apreciação pelas instâncias ordinárias sob o enfoque das novas orientações desta Corte. 2. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ - AgInt no AREsp: 1754816 PR 2020/0229245-6, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Julgamento: 15/03/2021, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 17/03/2021)

Nos diversos exemplos, observou-se decisões judiciais que reconheceram a boa-fé objetiva como princípio norteador das relações intrapartes, elemento que se sobrepôs aos termos dos próprios contratos celebrados pelas mesmas. Assim, restou reafirmado, nestes julgados, a interpretação de que a boa-fé objetiva precisa, necessariamente, balizar as relações jurídicas, sendo tal entendimento aplicado diretamente sobre os casos levados à apreciação da justiça.

Nas citadas ações exemplificativas, tramitavam demandas relativas a relações entre planos de saúde e usuários, inadimplemento contratual, rescisão contratual unilateral, e indenização securitária.  A aplicação da lei sobre estas questões, pelos magistrados, revelou que o princípio da boa-fé objetiva foi mobilizado, nestas decisões, de forma a impor limites à vontade celebrada entre as partes. Com isto, cláusulas e requisitos contratuais foram relativizados, quando da inobservância da boa-fé objetiva.  Com isto, resta reafirmada, através da jurisprudência, a efetividade constitucional dos boa-fé objetiva e dos direitos fundamentais, como norteadores das relações jurídicas entre particulares.           

Conclusão

O chamado princípio da boa-fé objetiva tem raízes bastante antigas, remontando ao Direito Romano, mas sendo positivado pelo Direito Germânico, e passando posteriormente a integrar o ordenamento jurídico de diversos países, inclusive o Brasil.

Em nossa realidade, é no Código Civil que se encontram os dispositivos que reconhecem a boa-fé como elemento dotado de uma tríplice função: interpretativa, limitativa e geradora de deveres. Tais definições envolvem um entendimento doutrinário de que o princípio da boa-fé objetiva tem o condão de reafirmar princípios constitucionais da dignidade humana, mostrando também seu caráter ético.

Assim, à noção de boa-fé objetiva alinham-se, no contexto atual do Direito Civil, conceitos de lealdade, honestidade e justa expectativa, que devem, necessariamente, nortear as relações jurídicas.

A partir de exemplos de casos concretos recentes, onde foram proferidas decisões judiciais em ações que versavam sobre demandas de naturezas diversas, envolvendo questões contratuais, observou-se que a vontade celebrada espontaneamente entre as partes não foi considerada absoluta, devendo curvar-se ao princípio da boa-fé objetiva. Assim, cláusulas contratuais foram relativizadas, a partir do entendimento dos magistrados, quando foi julgado seu descumprimento em relação a este importante princípio.

A boa-fé objetiva, portanto, se fortalece na jurisprudência como um dos princípios contemporâneos do Direito Civil, carregando, em si, a reafirmação de valores constitucionais e dando destaque à ética, equidade e transparência nas relações jurídicas.

Referências

LIGMANOVSKI, P. A. C.; GOMES, S. A. . O princípio da boa-fé objetiva à luz da Constituição. Anais do XVII Encontro Preparatório para o Congresso Nacional do CONPEDI. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2008, v. , p. 4604-4625., disponível em: http://www.publicadireito.com.br/conpedi/manaus/arquivos/anais/salvador/patricia_ayub_da_costa.pdf

PAMPLONA FILHO, R.; HORA NETO, J. O juízo discricionário da boa-fé objetiva e o panprincipiologismo. Revista Direito UNIFACS, n. 246, 2020.

REALE, M. Boa-fé no código civil. Agosto/2003. Texto online, disponível em: http://www.miguelreale.com.br/artigos/boafe.htm

SILVA, M. C. Convergências e assimetrias do princípio da boa-fé objetiva no direito contratual contemporâneo. RJLB, Ano 1 (2015), nº 4, p. 1133-1186.

TARTUCE, F. Direito Civil. Vol. Único, 10ª edição, 2020, São Paulo, Método.

Sobre o(a) autor(a)
Nicole Medeiros Guimarães
Nicole Medeiros Guimarães, acadêmica de Direito pela Universidade de Ribeirão Preto, é psicóloga judiciária no Tribunal de Justiça de São Paulo, mestre e doutora em Psicologia pela Universidade de São Paulo - campus Ribeirão...
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