Dono responde por acidente mesmo que motorista e vítima tenham bebido juntos

Dono responde por acidente mesmo que motorista e vítima tenham bebido juntos

O proprietário de veículo responde com culpa grave por acidente de trânsito, mesmo que o motorista e a vítima tenham juntos bebido e ingerido medicamentos para evitar o sono, ao participarem da mesma festa. Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou decisão do Tribunal de Justiça brasiliense para condenar o proprietário a arcar com 60% da indenização por danos morais e materiais e pensão mensal em favor do carona, que ficou paraplégico.

Os três amigos viajavam no mesmo carro para passar o carnaval em Cabo Frio (RJ) e pararam em Barbacena (MG) para passar a noite toda em um baile. Durante a festa, consumiram bebidas alcoólicas e ingeriram drogas medicamentosas. Ao amanhecer, embora cansados, concordaram em seguir viagem até o destino. Durante o trajeto, o proprietário entregou a direção ao colega que sabia estar alcoolizado.

Ao tentar ultrapassar um caminhão, em curva em aclive e em faixa amarela dupla contínua, o condutor encostou na dianteira do veículo ultrapassado e capotou. Em decorrência do acidente, a vítima sofreu lesões na coluna vertebral que lhe causaram paraplegia traumática, tornando-o permanentemente inválido para o trabalho, privado da utilização dos membros inferiores e limitado em relação a algumas funções vitais. O recurso especial da vítima, autor da ação, ia contra a decisão do Tribunal de Justiça (TJ) mantendo a sentença do juiz de primeiro grau que absolveu o réu de culpa por entregar a direção a outro colega.

O ministro Antônio de Pádua Ribeiro, relator do recurso cujo julgamento foi iniciado antes de sua nomeação para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e que passou por pedidos de vista de todos os ministros da Turma, considerou inicialmente ser possível apreciar a alegação do recorrente, já que se trataria de matéria de direito e não de fato. Isso porque se buscava aferir se o proprietário de veículo que entrega sua direção a terceiro nas circunstâncias descritas na decisão do TJ deve ou não ser responsabilizado pelas conseqüências de eventual acidente.

"A meu ver, a culpa do proprietário do veículo é gravíssima", afirmou o decano do STJ. Para o relator, deve prevalecer o voto vencido no TJ, do desembargador Edson Smaniotto, que reconheceu a ocorrência de culpa grave do proprietário e fixou indenização.

Esse voto vencido citou o entendimento firmado na jurisprudência de que o proprietário do veículo sempre responde pelo ato culposo de terceiro a quem o entregou, independentemente de ser preposto. Isso porque a responsabilidade decorreria da obrigação de guarda da coisa, resultando em má escolha do agente da direção do veículo, que só poderia ser afastada com prova de que foi posto em circulação contra sua vontade. Afirma o desembargador que o motorista "demonstrou total desprezo à vida de seus semelhantes" e que a ultrapassagem fora ato de "extrema direção perigosa e gravíssima".

Quanto à adesão da vítima à vontade dos demais de prosseguir a viagem, que para o juiz levaria à isenção de responsabilidade civil do réu, o desembargador entendeu ser motivo suficiente apenas para abrandar a proporção de culpa desse.

"O comportamento do autor não foi preponderante e decisivo para a eclosão do evento, nem tampouco capaz de justificar a atribuição exclusiva da culpa para o mesmo, isentando o condutor e o proprietário do veículo da responsabilidade. Tal posição equivaleria ao reconhecimento de ausência do nexo causal entre a conduta do motorista e os danos advindos do acidente, o que, francamente, não me parece razoável", afirmou o desembargador em seu voto vencido no TJDFT e restabelecido pelo STJ.

"Por outro lado", segue o voto longamente citado, "forçoso é convir que os fatos ocorridos naquela noite de carnaval não recomendavam o prosseguimento da viagem. O resultado era perfeitamente previsível pelo homem médio." "Assim, atento ao fato de que a condição da culpabilidade é a previsibilidade ou evitabilidade dos fatos do cotidiano e que, na hipótese, o evento não exorbitou a previsão e diligência do ‘homo medius’, tenho como necessária a mitigação da responsabilidade indenizatória do réu em face do comportamento do autor", completou.

No STJ, a maioria dos ministros – o relator, Antônio de Pádua Ribeiro, Nancy Andrighi e Castro Filho – seguiu o entendimento do desembargador de fixar em 60% dos danos sofridos pela vítima a indenização a ser paga pelo proprietário. Os danos materiais serão apurados em liquidação de sentença, os morais foram fixados em R$ 30 mil e a pensão mensal vitalícia em 70% da renda mensal da vítima à época, R$ 265,55, todos a serem corrigidos.

Os ministros Humberto Gomes de Barros e Carlos Alberto Direito divergiram, respectivamente, parcial e totalmente do relator. Para o ministro Gomes de Barros a culpa deveria ser dividida igualmente entre os ocupantes do veículo, arcando cada um com 1/3 dos danos apurados, conforme proposta de acordo feita pela vítima. Já o ministro Menezes Direito não admitiu o recurso especial do autor.

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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