No processo penal, suspensão do prazo de prescrição termina com efetiva citação do réu por carta rogatória

No processo penal, suspensão do prazo de prescrição termina com efetiva citação do réu por carta rogatória

Ao interpretar o Código de Processo Penal (CPP), a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que o termo final para a suspensão do prazo de prescrição, decorrente da comunicação por carta rogatória, é a data da citação, e não o dia da juntada da carta aos autos.

Com esse entendimento, o colegiado reformou acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região para reconhecer a prescrição retroativa e declarar a extinção da punibilidade de um réu condenado por evasão de divisas.

A denúncia foi recebida em 6 de maio de 2004, e a sentença condenatória, proferida em 16 de setembro de 2019. A defesa requereu o reconhecimento da prescrição com base na pena concretamente fixada, já que a sentença condenatória teria transitado em julgado para a acusação.

Contudo, o Ministério Público Federal argumentou que o processo ficou suspenso, aguardando cumprimento da carta rogatória para a citação do réu no Paraguai, a qual foi enviada em 14 de abril de 2005 e devolvida apenas em 7 de fevereiro de 2013. A citação ocorreu em 1º de julho de 2011.

Imprecisão legal

Segundo o relator do recurso no STJ, ministro Ribeiro Dantas, a defesa e o Ministério Público não divergem sobre as datas, mas sobre qual seria o marco final da suspensão do prazo de prescrição no caso de citação por carta rogatória, considerando que o CPP, no artigo 368, dispõe: "Estando o acusado no estrangeiro, em lugar sabido, será citado mediante carta rogatória, suspendendo-se o curso do prazo de prescrição até o seu cumprimento".

Para a acusação, a data de cumprimento da carta rogatória deveria ser a de sua juntada aos autos (2013, no caso), o que afastaria a prescrição; para a defesa, a data de cumprimento é a da efetiva citação no estrangeiro (2011), o que conduz à extinção da punibilidade. De acordo com o ministro, essa diferença de situações decorre do tempo considerável que transcorreu entre a realização da comunicação processual no estrangeiro e a juntada do comprovante aos autos.

Ribeiro Dantas afirmou que ambas as interpretações são razoáveis, pois há imprecisão e omissão no texto legal quanto aos marcos inicial e final exatos para a suspensão da prescrição – circunstância que aumenta a margem de discricionariedade do julgador, pois não há precedente vinculante nem jurisprudência dominante acerca do tema nos tribunais superiores.

Processo penal

De acordo com o relator, no entanto, deve prevalecer a posição da defesa, em razão da Súmula 710 do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual, no processo penal, os prazos são contados da data da intimação, e não da juntada aos autos do mandado ou da carta precatória ou de ordem – raciocínio que também deve valer para a carta rogatória.

"Isso, aliás, como bem coloca a defesa, tem por base a regra específica do artigo 798, parágrafo 5º, 'a', do CPP, que diferencia a sistemática adotada para os processos criminais em relação aos processos cíveis", disse o ministro.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.882.330 - PR (2020/0161752-4)
RELATOR : MINISTRO RIBEIRO DANTAS
RECORRENTE : JUAN CARLOS GARCIA BOBADILLA
ADVOGADOS : TRACY JOSEPH REINALDET DOS SANTOS - PR056300A
MATTEUS BERESA DE PAULA MACEDO - PR083616A
RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
EMENTA
PENAL E PROCESSO PENAL. DECISÃO SURPRESA. ART. 10, DO CPC.
INEXISTÊNCIA. COISA JULGADA. OFENSA. NÃO OCORRÊNCIA.
CITAÇÃO POR ROGATÓRIA. SUSPENSÃO DA PRESCRIÇÃO.
RETORNO DA CONTAGEM. DATA DA EFETIVA CITAÇÃO. LAPSO
TEMPORAL SUPERADO. PRESCRIÇÃO RETROATIVA. EXTINÇÃO DA
PUNIBILIDADE. RECUSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Não há que se falar em decisão surpresa, ou em ofensa ao art. 10, do CPC,
quando o acórdão recorrido utilizou os fundamentos questionados para decidir
embargos de declaração opostos pela própria defesa, os quais desejavam
justamente ver todas as suas alegações apreciadas, tampouco havendo nulidade
do julgado em face da ausência de prejuízo, diante da devolução da matéria na via
do recurso especial.
2. O fato de o órgão acusatorial renunciar ao direito de recurso contra decreto
condenatório não o impede de posteriormente impugnar decisão judicial
superveniente que reconhece a prescrição retroativa, ainda que os marcos de
início e fim da suspensão do prazo prescricional tivessem sido mencionados
quando da anterior sentença não recorrida, seja porque na primeira oportunidade
não havia interesse recursal, seja porque a coisa julgada não abrange os motivos
da decisão, na forma do art. 504, I, do CPC.
3. O art. 368, do CPP, embora seja claro ao estabelecer a suspensão do prazo
prescricional pela expedição de carta rogatória para citação do acusado no
exterior, não é preciso quanto ao termo final da referida suspensão, devendo ser
interpretado de forma sistemática, com o art. 798, § 5º, “a”, do CPP, bem como
com a Súmula 710, do STF, voltando a correr o lapso prescricional da data da
efetivação da comunicação processual no estrangeiro, ainda que haja demora
para a juntada da carta rogatória cumprida aos autos.
4. Prescrição retroativa. Extinção da punibilidade.
5. Recurso especial provido, restabelecendo a decisão de 1ª instância que
declarou a extinção da punibilidade pelo reconhecimento da prescrição da
retroativa.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar
provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Joel Ilan
Paciornik, Felix Fischer, João Otávio de Noronha e Reynaldo Soares da Fonseca votaram com o
Sr. Ministro Relator.
PRESENTE NA VIDEOCONFERÊNCIA: DR. TRACY JOSEPH
REINALDET DOS SANTOS (P/RECTE)
Brasília (DF), 06 de abril de 2021 (data do julgamento)
MINISTRO RIBEIRO DANTAS
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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