Anulado registro do energético Power Bull para evitar associação indevida com o Red Bull

Anulado registro do energético Power Bull para evitar associação indevida com o Red Bull

Em razão do risco de associação indevida, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a recurso dos titulares da marca Red Bull e determinou a anulação do registro da marca Power Bull, energético fabricado por outra empresa. Diante de conflito entre marcas, o colegiado afirmou que deve prevalecer aquela registrada primeiro.

"As marcas envolvidas na demanda, a despeito de não apresentarem semelhança entre as suas embalagens, atuam no mesmo segmento mercadológico, utilizam os mesmos locais de venda e visam o mesmo público, o que evidencia a possibilidade de associação equivocada quanto à origem", disse o relator, ministro Villas Bôas Cueva.

O recurso teve origem em ação de nulidade de registro com pedido de abstenção de uso da marca Power Bull, ajuizada pela Red Bull GMBH e pela Red Bull do Brasil Ltda. O Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) reconheceu ter se equivocado ao conceder o registro do último energético, pois há reprodução parcial da marca Red Bull.

O juízo de primeiro grau, identificando a possibilidade de os consumidores interpretarem que as marcas são originárias da mesma empresa, reconheceu a nulidade do registro mais novo. Contudo, o Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) reformou a decisão por entender que o termo inglês "bull", cuja tradução é "touro", remete à taurina, aminoácido presente nos energéticos e que evoca a ideia de força; por isso, não poderia ser considerado um termo distintivo da marca Red Bull.

Distintividade

O ministro Villas Bôas Cueva explicou que, para uma marca ser registrada e apropriada por alguém com exclusividade, precisa se destacar suficientemente do domínio comum, não podendo ser concedida a propriedade privada e exclusiva de palavras corriqueiramente usadas para se referir a um objeto ou serviço. Em razão disso, ressaltou, os signos descritivos, de modo geral, não são apropriáveis como marca (artigo 124, VI, da Lei 9.279/1996).

Para o relator, não há controvérsia a respeito do fato de que o composto taurina integra a lista de ingredientes dos produtos em debate. "Contudo, também é notório que a relação entre o termo 'bull' e as bebidas comercializadas não decorre de associação direta, da forma como seria exigido para fins de descaracterização da distintividade", afirmou.

De acordo com o magistrado, a conexão feita pelo TRF2 demanda uma cadeia complexa de raciocínio que exige o conhecimento da língua inglesa e dos componentes ativos da bebida, da função e da origem histórica do nome do aminoácido taurina – isolado em laboratório pela primeira vez a partir da bile de um boi, segundo o próprio acórdão recorrido.

Associação indevida

Na avaliação do relator, o uso da palavra "bull" para designar bebidas energéticas, por não estar diretamente vinculada ao produto ou às suas características, não pode ser entendido como necessário, evocativo, comum ou imediato, nos termos do artigo 124, VI, da Lei de Propriedade Industrial.

Apesar de o TRF2 ter entendido que não haveria possibilidade de confusão quanto ao conjunto marcário (cor, embalagem, leiaute e nome), o ministro lembrou que a legislação proíbe a reprodução parcial ou total de marca quando houver risco de associação indevida com a marca original.

No caso em análise, Villas Boâs Cueva considerou que o energético Power Bull – cujo pedido de registro se deu em 1999 – pode ser indevidamente associado ao concorrente Red Bull – registrado em 1993 –, uma vez que são bebidas similares, passíveis de serem fornecidas nos mesmos locais de venda e para o mesmo público.

Diluição

Na hipótese dos autos, a Terceira Turma ainda acrescentou que "a diluição da marca no exterior não é suficiente para afastar a distintividade do registro no Brasil".

A tese se contrapõe ao entendimento exposto pelo acórdão recorrido no sentido de que a expressão "bull" não possuiria mais unicidade, pois já teria sido utilizada por diversas outras empresas em âmbito internacional.

Sobre o assunto, o ministro relator observou que o registro de marcas é regido pelo princípio da territorialidade. Sendo assim, a ofensa à distintividade em outros países não influi no direito das empresas recorrentes de zelar pela integridade da marca no Brasil.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.922.135 - RJ (2018/0341586-2)
RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
RECORRENTE : RED BULL GMBH
RECORRENTE : RED BULL DO BRASIL LTDA
ADVOGADOS : MARIANA RODRIGUES MOUTELLA E OUTRO(S) - DF015651
RODRIGO DE ASSIS TORRES - RJ121429
TATIANA CAMPOS MATOS GUIDICINI - MG100244
ROBERTA DE MAGALHÃES FONTELES CABRAL - RJ133459
LUCAS MAYOL DE ALVARENGA - RJ205551
PAULO HENRIQUE DE PAIVA SANTOS - DF056343
FELIPE DANNEMANN LUNDGREN - RJ134774
RECORRIDO : FUNCIONAL DRINKS INTELIGENCIA EM DESENVOLVIMENTO DE
PRODUTOS LTDA
RECORRIDO : ULTRAPAN INDUSTRIA E COMERCIO LTDA
ADVOGADOS : JOÃO VIEIRA DA CUNHA - SP183403
JACQUES LABRUNIE - SP112649
MARCOS CHUCRALLA MOHERDAUI BLASI - SP234781
RECORRIDO : INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL E PROPRIEDADE INDUSTRIAL.
AÇÃO DE NULIDADE. REGISTRO. COLIDÊNCIA. MARCA. REPRODUÇÃO
PARCIAL. CARÁTER GENÉRICO. RELAÇÃO INDIRETA. INSUFICIÊNCIA.
ASSOCIAÇÃO INDEVIDA. FAMÍLIA DE MARCAS. SEGMENTO
MERCADOLÓGICO. IDENTIDADE. POSSIBILIDADE DE ASSOCIAÇÃO. ORIGEM
DOS PRODUTOS. RECONHECIMENTO. DILUIÇÃO. EXTERIOR. REGISTRO.
TERRITÓRIO NACIONAL. PROTEÇÃO.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código
de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. Cinge-se a controvérsia a saber se há colidência entre as marcas de bebida
energética Red Bull e Power Bull. 3. A vinculação indireta entre a marca e características do produto é insuficiente
para configurar sinal genérico, necessário, comum, vulgar ou meramente
descritivo.
4. A associação indevida a marca alheia, prevista no art. 124, XIX, da Lei nº
9.279/1996, pode ser caracterizada pelo risco de vinculação equivocada quanto à
origem dos produtos contrafeitos, ainda que inexista confusão entre os conjuntos
marcários.
5. A diluição da marca no exterior não é suficiente para afastar a distintividade do
registro no Brasil.
6. No caso em apreço, as marcas envolvidas na demanda, a despeito de não
apresentarem semelhança entre as suas embalagens, atuam no mesmo
segmento mercadológico, utilizam os mesmos locais de venda e visam ao mesmo
público, o que evidencia a possibilidade de associação equivocada quanto à
origem.
7. Na hipótese de colidência entre marcas deve prevalecer aquela que foi
registrada primeiro.
8. Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a
Terceira Turma, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do
Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro, Nancy Andrighi e
Paulo de Tarso Sanseverino (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 13 de abril de 2021(Data do Julgamento)
Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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