SBT terá de indenizar cantor de funk por uso de letra de música como nome de programa

SBT terá de indenizar cantor de funk por uso de letra de música como nome de programa

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) condenou o SBT a pagar R$ 20 mil ao cantor de funk MC Leozinho, a título de danos materiais, pela utilização não autorizada da frase "Se ela dança, eu danço" – trecho da música "Ela só pensa em beijar" – como nome de um de seus programas, e manteve a indenização fixada pela Justiça do Rio de Janeiro em razão do uso da obra como fundo musical da atração.

Na ação, o cantor relatou que a música foi lançada em 2004 e, em razão do sucesso atingido, a expressão "Se ela dança, eu danço" se tornou o título de seu primeiro CD.

Ele afirmou que, em agosto de 2010, por e-mail, o SBT pediu para usar a obra na abertura de um programa, mas, em virtude do baixo valor oferecido e dos interesses comerciais que mantinha com outra emissora, não concedeu a autorização. No entanto, em janeiro de 2011, o programa estreou, tendo se apropriado do refrão, como nome, e do fonograma, como fundo musical.

Autorização expressa

Em sua defesa, o SBT sustentou que o envio do e-mail para a produtora do cantor, no qual solicitou autorização para utilizar a música, foi feito nos termos previstos em convênio existente entre as partes, e que a falta de resposta significaria autorização tácita.

Em seu voto, o ministro Villas Bôas Cueva destacou que a jurisprudência do STJ considera que o uso de obra literária, artística ou científica depende de autorização expressa e prévia do autor, nos termos do artigo 29 da Lei de Direitos Autorais. "Não há falar em autorização tácita por ausência de resposta ao e-mail enviado pela ré", enfatizou.

Além disso, o ministro apontou que, segundo o tribunal de origem, a emissora não cumpriu as formalidades do convênio para obter a autorização, não cabendo ao STJ reexaminar as provas para, eventualmente, reformar esse ponto da decisão – nos termos da Súmula 7.

Ordem descumprida

Em primeira instância, foi deferida a tutela antecipada para que a emissora se abstivesse de usar a obra musical em seu programa. Diante do descumprimento da ordem, o SBT foi condenado ao pagamento da multa prevista no artigo 14 do Código de Processo Civil de 1973.

A condenação foi mantida pela Terceira Turma do STJ. O ministro relator apontou que, apesar de instado pelo Judiciário a se abster de utilizar a obra, o SBT continuou a usá-la, persistindo na desobediência, e adotou "conduta jocosa" para se referir à ordem judicial.

Destacou, ainda, que "o que se infere dos autos é que a emissora ré tirou vantagem da controvérsia jurídica para atrair o público, veiculando o título do programa de forma invertida, utilizando o som característico de censura quando seus apresentadores mencionavam a expressão e valendo-se da tradução do nome da atração para outro idioma – condutas extremamente reprováveis".

Violação de direito autoral

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) – que reconheceu o direito à indenização por causa do uso do fonograma como fundo musical – afastou a condenação da emissora em relação ao nome do programa, por considerar que a expressão "Se ela dança, eu danço", usada na tradução dos títulos de pelo menos cinco filmes exibidos no Brasil, não é original, nem poderia ser considerada de autoria do cantor.

A Terceira Turma, contudo, entendeu que a utilização do trecho "Se ela dança, eu danço" como nome do programa configurou uma violação de direito autoral.

Villas Bôas Cueva afirmou que a citação de pequenos trechos de uma obra não viola os direitos do autor, "desde que não tenha caráter de completude nem prejudique a sua exploração pelo titular" – conforme a previsão do artigo 46, VIII, da Lei de Direitos Autorais. Para ele, porém, o caso em julgamento não se enquadra nessa situação.

O SBT – disse o ministro – "escolheu para título de seu programa semanal um trecho de uma obra sabidamente de sucesso, sem a autorização do autor, utilizando-a também como música de fundo do programa. O uso da expressão 'Se ela dança, eu danço' em conjunto com o fonograma gera uma associação inadequada do autor com a emissora".

"A escolha do nome do programa, atrelado à utilização da obra musical de sucesso, não resultou de mera aleatoriedade", acrescentou o relator, para quem a conduta da emissora "configura ofensa ao direito do autor, e não um mero uso acessório de trecho de obra musical".

RECURSO ESPECIAL Nº 1.704.189 - RJ (2016/0328383-1)
RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
RECORRENTE : TVSBT CANAL 4 DE SÃO PAULO S/A
ADVOGADOS : ILAN GOLDBERG - RJ100643
EDUARDO CHALFIN - RJ053588
GABRIEL NOBREGA GOYANES DE ANDRADE E OUTRO(S) - RJ165308
RECORRENTE : LEONARDO FREITAS MANGELI DE BRITO
ADVOGADO : SYDNEY LIMEIRA SANCHES - RJ066176
RECORRIDO : OS MESMOS
EMENTA
RECURSOS ESPECIAIS. PROCESSO CIVIL. DIREITO DE AUTOR. OBRA
MUSICAL. USO INDEVIDO. AUTORIZAÇÃO PRÉVIA E EXPRESSA. INEXISTÊNCIA.
FONOGRAMA. TRECHO DA OBRA. NOME DE PROGRAMA TELEVISIVO. DANOS
PATRIMONIAIS. CARACTERIZAÇÃO.
1. Recursos especiais interpostos contra acórdão publicado na vigência do
Código de Processo Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. Cinge-se a controvérsia a discutir se a utilização de trecho de obra musical
como nome de programa televisivo, sem a autorização prévia e expressa do titular
do direito, enseja a reparação por ofensa a direitos patrimoniais do autor.
3. O Superior Tribunal de Justiça entende não violar o art. 535 do CPC/1973 nem
importar negativa de prestação jurisdicional o acórdão que adota, para a
resolução da causa, fundamentação suficiente, porém diversa da pretendida pelo
recorrente, para decidir de modo integral a controvérsia posta.
4. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça orienta-se no sentido de que a
utilização da obra literária, artística ou científica depende de autorização expressa
e prévia do autor (art. 29 da Lei nº 9.610/1998). Precedentes.
5. Na hipótese, a conduta da emissora ré configurou desrespeito à decisão
judicial, devendo ser mantida a aplicação da multa prevista no art. 14 do
CPC/1973.
6. A alteração das conclusões adotadas pelo Tribunal local demandaria,
necessariamente, o reexame do acervo fático-probatório, sobretudo no que tange
aos convênios, e-mails e vídeos nos quais constam episódios do programa,
procedimento inadmissível em virtude do óbice da Súmula nº 7/STJ.
7. Os direitos de conteúdo patrimonial do autor estão relacionados ao aproveito
econômico que poderá ser obtido com a exploração comercial da obra. Há
configuração de ato ilícito quando sua utilização não observa o disposto no art.
29 da LDA.
8. A citação de pequenos trechos de obras preexistentes não constituirá ofensa
aos direitos autorais desde que não tenha caráter de completude nem prejudique
a sua exploração, pelo titular do direito, da obra reproduzida (art. 46, VIII, da
LDA). Precedentes.
9. No caso, a escolha do trecho de maior sucesso da obra musical como título de
programa televisivo e seu uso em conjunto com o fonograma, gerou uma
associação inadequada do autor da obra musical com a emissora, que utilizou o
sucesso da música como título em sua programação semanal também como
forma de atrair audiência.
10. Na espécie, a utilização da expressão “Se ela dança, eu danço”, na espécie,
configura ofensa ao direito do autor e não um mero uso acessório de trecho de
obra musical, não estando acobertada pelo art. 46, VIII, da LDA.
11. Recurso especial interposto por TVSBT - CANAL 4 DE SÃO PAULO S.A. não
provido.
12. Recurso especial interposto por LEONARDO FREITAS MANGELI DE BRITO
parcialmente provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a
Terceira Turma, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial interposto por
TVSBT - CANAL 4 DE SÃO PAULO S.A e dar parcial provimento ao recurso especial interposto por
LEONARDO FREITAS MANGELI DE BRITO, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs.
Ministros Moura Ribeiro, Nancy Andrighi e Paulo de Tarso Sanseverino (Presidente) votaram
com o Sr. Ministro Relator.
Impedido o Sr. Ministro Marco Aurélio Bellizze.
Brasília (DF), 13 de outubro de 2020(Data do Julgamento)
Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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