Substituição por perdas e danos da tutela inibitória contra violação de direito autoral só é possível em casos excepcionais

Substituição por perdas e danos da tutela inibitória contra violação de direito autoral só é possível em casos excepcionais

Diante da ameaça de violação de direitos autorais, como previsto pelo artigo 105 da Lei 9.610/1998, a tutela inibitória deve ser concedida para garantir ao titular da criação a possibilidade de impedir que terceiros explorem a obra protegida. Apenas em casos excepcionais é que essa tutela específica pode dar lugar a perdas e danos, como nas situações em que direitos fundamentais como o acesso à informação ou à cultura justifiquem a disponibilização imediata e integral da obra para outras pessoas.  

O entendimento foi aplicado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) para reformar acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) que, apesar de reconhecer a violação de direitos autorais na utilização de músicas e conteúdos audiovisuais por uma academia de ginástica, considerou que a tutela inibitória seria "demasiadamente gravosa" e, por isso, substituiu a medida pela indenização de perdas e danos.

O recurso teve origem em ação na qual o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) pediu a concessão da tutela inibitória para que a academia se abstivesse de utilizar as obras sem permissão, além da condenação ao pagamento de indenização.

De acordo com o TJRS, era evidente a execução ilegal das obras na academia, o que justificava o pedido de indenização feito pelo Ecad. Entretanto, o tribunal rejeitou a concessão da tutela inibitória por entender que a suspensão da reprodução dos conteúdos para os clientes poderia afetar a atividade empresarial da academia e lhe trazer prejuízo financeiro.

Reprodução infinita

O ministro Paulo de Tarso Sanseverino, relator do recurso do Ecad no STJ, explicou que a obra autoral, diferentemente dos demais bens "corpóreos" passíveis de proteção, pode ser reproduzida infinitamente e utilizada por um número ilimitado de pessoas, especialmente com as facilidades da internet. Nesses casos, segundo o relator, o direito autoral exige um meio de proteção capaz de preservar o direito de exclusividade, considerando a inadequação do procedimento do interdito proibitório.

"Nesse contexto, a tutela inibitória se apresenta como forma de proteção por excelência dos direitos autorais, diante de ameaça iminente de prática, de continuação ou de repetição do ilícito", afirmou.

O relator esclareceu que, uma vez violado o direito autoral, a obrigação de não fazer pode ser convertida em obrigação de pagar a indenização devida. Entretanto, Sanseverino apontou que o ordenamento jurídico também garante a tutela específica do direito, relegando a um segundo plano a conversão em perdas e danos, como previsto no artigo 497 do Código de Processo Civil.

Não essencial

No caso dos autos, Paulo de Tarso Sanseverino ressaltou que a academia de ginástica disponibiliza, em suas dependências, as obras autorais por rádio ou televisão como mais um atrativo para os seus clientes. Embora a utilização dessas obras seja importante para as atividades da empresa, o ministro apontou que ela não é essencial a ponto de comprometer a continuidade de seus serviços, caso seja interrompida.

Ao dar provimento ao recurso, o magistrado ainda destacou que a tutela inibitória não se confunde com a cobrança de indenização. Enquanto a tutela preventiva está voltada para o futuro, buscando impedir a continuidade do ato ilícito, a pretensão de indenização "é voltada para o passado, cobrindo todo o período em que houve utilização não autorizada das obras autorais em questão".

RECURSO ESPECIAL Nº 1.833.567 - RS (2019/0250611-2)
RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO
RECORRENTE : ESCRITÓRIO CENTRAL DE ARRECADAÇÃO E
DISTRIBUIÇÃO ECAD
ADVOGADOS : GELSA PINTO SERRANO - RS025174
HÉLIO SABOYA RIBEIRO DOS SANTOS FILHO - RJ068819
PEDRO PAULO MUANIS SOBRINHO - RJ082788
CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO FILHO - RJ079743
ADVOGADA : KARINA HELENA CALLAI - DF011620
ADVOGADA : ROSÂNGELA MARIA OLIVEIRA LOIOLA - DF026550
RECORRIDO : ACADEMIA CENTRAL LTDA
ADVOGADO : RITA BEATRIZ POSSER DESCOVI - RS047825
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. PROPRIEDADE INTELECTUAL. DIREITOS
AUTORAIS. COMUNICAÇÃO AO PÚBLICO DE OBRAS MUSICAIS,
LÍTERO-MUSICAIS, AUDIOVISUAIS E DE FONOGRAMAS SEM
AUTORIZAÇÃO DO ECAD. TUTELA INIBITÓRIA. NECESSIDADE
DE CONCESSÃO, DIANTE DA COMPROVADA VIOLAÇÃO DE
DIREITOS AUTORAIS. ART. 105 DA LEI N. 9.610/98.
1. Controvérsia em torno da possibilidade de, diante da violação a
direitos autorais, ser afastada a tutela inibitória, determinando-se que
os prejuízos decorrentes do ato ilícito sejam resolvidos em perdas e
danos.
2. Não há violação dos arts. 489, § 1º, IV e VI, e 1.022 do CPC quando
o Tribunal de origem se manifesta sobre todos os argumentos
suscitados em apelação e em embargos de declaração, decidindo,
porém, de forma contrária à pretensão recursal.
3. A tutela inibitória é a proteção por excelência dos direitos de autor,
devendo ser concedida quando evidenciada a ameaça de violação para
que seu titular possa fazer valer seu direito de excluir terceiros da
exploração não autorizada de obras protegidas. Inteligência do art. 497
do CPC e do art. 105 da Lei n. 9.610/98.
4. Apenas em casos excepcionalíssimos, nos quais outros direitos
fundamentais, como o acesso à informação ou o acesso à cultura,
justifiquem uma disponibilização imediata e incondicional da obra para
utilização de terceiros, é que a tutela específica deve ceder lugar às
perdas e danos, o que não ocorre no presente caso.
5. Tutela inibitória concedida, para que seja ordenada à demandada a
suspensão da comunicação ao público de obras musicais,
lítero-musicais, audiovisuais e de fonogramas, enquanto não obtida a
devida autorização.
6. RECURSO ESPECIAL PROVIDO

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por
unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro e Nancy
Andrighi votaram com o Sr. Ministro Relator.
Dr. PEDRO PAULO MUANIS SOBRINHO, pela parte RECORRENTE:
ESCRITÓRIO CENTRAL DE ARRECADAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO ECAD
Brasília, 15 de setembro de 2020(data do julgamento)
MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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