Cobrança de direitos autorais por músicas em TV a cabo não depende de identificação das obras

Cobrança de direitos autorais por músicas em TV a cabo não depende de identificação das obras

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) condenou uma operadora de TV por assinatura ao pagamento de direitos autorais ao Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) pela reprodução de obras musicais protegidas na programação. Por unanimidade, o colegiado reformou conclusão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) no sentido de que, para que houvesse a remuneração a título de direitos autorais, seria necessária a identificação individual das músicas e dos respectivos autores.

O relator do recurso, ministro Marco Aurélio Bellizze, apontou que "o afastamento da cobrança é que dependeria de efetiva demonstração e comprovação de que não houve a comunicação ao público assinante de obra protegida, ou de contratação direta de licença para transmissão, o que, a propósito, deveria ser comunicado previamente pelo próprio autor ao órgão de gestão coletiva (artigo 97, parágrafo 15, da Lei 9.610/1998)".

O recurso se originou de ação proposta pelo Ecad para que, nos termos do artigo 68 da Lei 9.610/1998, a operadora pagasse o equivalente a 2,55% de seu faturamento bruto para a remuneração dos direitos autorais. Em contestação, a operadora alegou desproporção no percentual cobrado pelo escritório, já que deveriam ser levadas em consideração especificidades como o nível de exploração das músicas em diferentes canais e a reprodução das obras em emissoras abertas.

Em primeiro grau, a ação foi julgada improcedente, com sentença mantida pelo TJRJ. Segundo o tribunal estadual, apesar da legitimidade do Ecad para a cobrança, seria indispensável a demonstração da efetiva e quantitativa transmissão de obras musicais na programação da operadora.

Usuária permanente

O ministro Marco Aurélio Bellizze destacou que, de acordo com o artigo 68, parágrafo 6º, da Lei 9.610/1998, aquele que explora obras musicais tem o dever de fornecer a relação completa dos conteúdos utilizados, viabilizando a cobrança do valor adequado relativo à retribuição dos direitos autorais. No mesmo sentido, apontou, o parágrafo 7º obriga as empresas cinematográficas e de radiodifusão a disponibilizar todos os contratos relativos à execução pública de obras protegidas.

Segundo o relator, a operadora de TV a cabo é caracterizada como usuária permanente do conteúdo protegido pela Lei de Direitos Autorais. Por isso, ao contrário da conclusão do TJRJ, favorece o Ecad a presunção de ocorrência da transmissão pública das obras e, por consequência, da necessidade de pagamento da retribuição.

Métodos próprios

Sobre a possibilidade de revisão do valor de retribuição, Bellizze lembrou que a jurisprudência do STJ está orientada no sentido de que compete ao Ecad – seja diretamente, seja por intermédio das associações – a fixação dos percentuais de pagamento, pois o escritório possui métodos próprios para a elaboração dos cálculos, especialmente em razão da diversidade das obras musicais passíveis de reprodução.

Para o ministro, mesmo que se constatasse abusividade nos preços praticados, o Poder Judiciário não poderia realizar a revisão, já que a precificação não está sujeita à rígida regra legal e, portanto, segue a lei de mercado.

"Dessa forma, em regra, está no âmbito de atuação do Ecad a fixação de critérios para a cobrança dos direitos autorais, que serão definidos no regulamento de arrecadação elaborado e aprovado em Assembleia Geral, composta pelos representantes das associações que o integram, e que mantém uma tabela especificada de preços, conforme a redação do parágrafo 3° do artigo 98 da Lei 9.610/1998", concluiu o ministro.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.418.695 - RJ (2011/0124596-6)
RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE
RECORRENTE : WAY TV BELO HORIZONTE S/A
ADVOGADOS : MARCOS ALBERTO SANT´ANNA BITELLI E OUTRO(S) - SP087292
MÁRCIO LAMONICA BOVINO - SP132527
ANDRÉA MARIA RODRIGUES E OUTRO(S) - RJ102236
ALEX CARLOS CAPURA DE ARAUJO E OUTRO(S) - SP296255
RECORRENTE : ESCRITÓRIO CENTRAL DE ARRECADAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO
ECAD
ADVOGADOS : HÉLIO SABOYA RIBEIRO DOS SANTOS FILHO E OUTRO(S) - RJ068819
PEDRO PAULO MUANIS SOBRINHO E OUTRO(S) - RJ082788
CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO FILHO E OUTRO(S) - RJ079743
ADVOGADOS : KARINA HELENA CALLAI - DF011620
NORMANDA SIQUEIRA NUNES E OUTRO(S) - RJ093236
ADVOGADA : ROSÂNGELA MARIA OLIVEIRA LOIOLA E OUTRO(S) - DF026550
RECORRIDO : OS MESMOS
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA. RECONVENÇÃO. DIREITOS AUTORAIS.
ECAD. EXECUÇÕES PÚBLICAS. COMUNICAÇÃO AO PÚBLICO DE ACESSO RESTRITO. 1.
PRESCRIÇÃO. SUCESSÃO DE LEIS NO TEMPO. 2. ÔNUS DA PROVA. UTILIZAÇÃO POR
USUÁRIO PERMANENTE. PRESUNÇÃO DE UTILIZAÇÃO DAS OBRAS. DEVER LEGAL DO
USUÁRIO DE INFORMAR AS OBRAS UTILIZADAS. 3. TABELA DE PREÇOS. LEGALIDADE.
LEGITIMIDADE DO ECAD PARA COBRANÇA. 4. RECURSO ESPECIAL DO ECAD PROVIDO.
RECURSO ESPECIAL DE WAY TV BELO HORIZONTE S.A. DESPROVIDO.
1. Debate-se o prazo prescricional aplicável à pretensão de cobrança de retribuição
decorrente de comunicação ao público de obra protegida, bem como de quem é o ônus da
prova acerca das obras utilizadas e a validade dos critérios adotados para apuração do valor
devido.
2. Uma vez expressamente revogada a Lei n. 5.988/1973, o prazo prescricional passou a ser
regulado pelo art. 177 do CC/1916, definindo-o em 20 anos, até a vigência do atual Código
Civil.
3. O Código Civil de 2002 não trouxe regra específica à prescrição das pretensões
decorrentes de violação de direitos do autor, aplicando-se o prazo de 10 anos (art. 205),
quando a ofensa ao direito autoral se assemelhar a um descumprimento contratual, como na
hipótese. Precedentes.
4. A presente demanda exige o pagamento de contribuição ao Ecad em razão de ato de
comunicação ao público consistente em emissão, transmissão e recepção de imagens,
acompanhadas ou não de sons, que resulta na entrega de conteúdo audiovisual
exclusivamente a assinantes da TV por assinatura, de modo que a comunicação ao público
é, portanto, presumida.
5. A Lei n. 9.610/1998 estabelece para o usuário de obras protegidas o dever de comunicar
quais obras foram utilizadas, além de manter acessível todos os contratos, ajustes e acordos
acerca da autorização e remuneração devidas.
6. Este Tribunal Superior já assentou ser válida a tabela de preços instituída pelo ECAD, uma
vez que, em se tratando de direito de autor, compete a ele a fixação do seu valor, que pode
se dar, contudo, diretamente ou por intermédio das associações e do próprio ECAD.
Precedentes.
7. Recurso especial do Ecad conhecido e provido. Recurso especial de Way TV Belo
Horizonte S.A. conhecido e desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam
os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar
provimento ao recurso especial do ECAD e negar provimento ao recurso especial de Way TV
Belo Horizonte S.A., nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, Nancy Andrighi, Paulo de Tarso Sanseverino
(Presidente) e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 08 de setembro de 2020 (data do julgamento).
MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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