Notificação de infração de trânsito por via postal não exige aviso de recebimento

Notificação de infração de trânsito por via postal não exige aviso de recebimento

Com base na interpretação dos artigos 280, 281 e 282 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concluiu que a autoridade de trânsito tem a obrigação de comprovar o envio de notificação da autuação e da imposição de penalidade decorrente de infração, mas não há a necessidade de aviso de recebimento.

O colegiado julgou improcedente pedido de uniformização de interpretação de lei apresentado por um cidadão contra acórdão da 4ª Turma da Fazenda do Colégio Recursal Central de São Paulo, que entendeu não ser necessário comprovar a ciência inequívoca da notificação da infração e que a não indicação do condutor no momento da infração de trânsito faz presumir autoria do proprietário, o qual tem a obrigação de manter seu endereço atualizado.

No pedido de uniformização, o requerente afirmou que o colégio recursal, ao interpretar os artigos 281 e 282 do CTB, divergiu das turmas recursais de diversos estados, além de afrontar a Súmula 312 do STJ. Ele solicitou ainda que prevalecesse o entendimento acerca da necessidade da comprovação efetiva de que o infrator recebeu as notificações de trânsito, sob pena de ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa.

O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), como amicus curiae, defendeu que a remessa postal simples é suficiente para a finalidade de cientificar o infrator. Os requeridos – o município de São Paulo e o Departamento Estadual de Trânsito de São Paulo (Detran) – manifestaram-se no mesmo sentido.

AR

Ao analisar o caso, o relator, ministro Gurgel de Faria, afirmou que, em observância aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, o CTB determina que a autoridade de trânsito expeça a notificação da infração no prazo de até 30 dias, caso o condutor não seja cientificado no local, para fins de defesa prévia (artigo 280, VI, e artigo 281 do CTB), além da notificação acerca da imposição da penalidade e do prazo para a interposição de recurso ou recolhimento da multa (artigo 282).

Segundo o relator, a legislação é imperativa quanto à necessidade de garantir a ciência do infrator ou do responsável pelo veículo sobre a aplicação da penalidade, seja por remessa postal (telegrama, Sedex, cartas simples ou registrada) ou "qualquer outro meio tecnológico hábil" que assegure o seu conhecimento.

Gurgel de Faria ressaltou, no entanto, que a lei não obriga que o órgão de trânsito realize a notificação mediante aviso de recebimento (AR).

"Se o CTB reputa válidas as notificações por remessa postal, sem explicitar a forma de sua realização, e tampouco o Contran o fez, não há como atribuir à administração pública uma obrigação não prevista em lei ou, sequer, em ato normativo, sob pena de ofensa aos princípios da legalidade, da separação dos poderes e da proporcionalidade, considerando o alto custo da carta com AR e, por conseguinte, a oneração dos cofres públicos", observou.

Correios

Gurgel de Faria destacou que o envio da notificação, tanto por carta simples quanto por carta registrada, satisfaz a formalidade legal. E acrescentou que, quando a administração pública cumpre o comando legal utilizando os serviços da Empresa de Correios e Telégrafos – empresa pública cujos serviços gozam de legitimidade e credibilidade –, "não há se falar em ofensa ao contraditório e à ampla defesa no âmbito do processo administrativo, até porque, se houver falha nas notificações, o artigo 28 da Resolução 619/2016 do Contran prevê que a autoridade de trânsito poderá refazer o ato, observados os prazos prescricionais".

"Cumpre lembrar que é dever do proprietário do veículo manter atualizado o seu endereço junto ao órgão de trânsito e, se a devolução de notificação ocorrer em virtude da desatualização do endereço ou recusa do proprietário em recebê-la, considerar-se-á válida para todos os efeitos", apontou o ministro.

PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI Nº 372 - SP
(2017/0173205-8)
RELATOR : MINISTRO GURGEL DE FARIA
REQUERENTE : WELLINGTON JESUS VIANA
ADVOGADOS : SILSI DE OLIVEIRA MENDES HENRIQUE BARBOSA - SP096122
TIAGO JOSÉ MENDES CORRÊA - SP324999
Alan Bohrer Bucco E OUTRO(S) - RS093196
REQUERIDO : DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRÂNSITO DO ESTADO DE
SÃO PAULO - DETRAN SP
PROCURADOR : FREDERICO JOSÉ FERNANDES DE ATHAYDE E OUTRO(S) - SP270368
REQUERIDO : MUNICÍPIO DE SÃO PAULO
PROCURADOR : ANA LÚCIA MARINO ROSSO E OUTRO(S) - SP108117
INTERES. : DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRAESTRUTURA DE
TRANSPORTES - DNIT - "AMICUS CURIAE"
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE
UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI. JUIZADO
ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. CÓDIGO DE TRÂNSITO
BRASILEIRO. AUTO DE INFRAÇÃO. NOTIFICAÇÃO.
REMESSA POSTAL. AVISO DE RECEBIMENTO. PREVISÃO
LEGAL. AUSÊNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA E OFENSA
AO CONTRADITÓRIO. DESCARACTERIZAÇÃO. SÚMULA 312
DO STJ. VIOLAÇÃO. INEXISTÊNCIA.
1. De acordo com o art. 18, § 3º, da Lei n. 12.153/2009, o mecanismo de
uniformização de jurisprudência e de submissão das decisões das
Turmas Recursais ao crivo do Superior Tribunal de Justiça, no âmbito
dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, restringe-se a questões de
direito material, quando as Turmas de diferentes Estados derem a lei
federal interpretações divergentes, ou quando a decisão proferida estiver
em contrariedade com súmula do Superior Tribunal de Justiça.
2. Em observância ao princípio insculpido no art. 5º, LV, da Constituição
Federal, o Código de Trânsito Brasileiro determina que a autoridade de
trânsito deve expedir a notificação do cometimento da infração no prazo
de até 30 (trinta), caso o condutor não seja cientificado no local do
flagrante, para fins de defesa prévia (art. 280, VI, e 281 do CTB), bem
como acerca da imposição da penalidade e do prazo para a interposição
de recurso ou recolhimento do valor da multa (art. 282).
3. A legislação especial é imperativa quanto à necessidade de garantir a
ciência do infrator ou responsável pelo veículo da aplicação da
penalidade, seja por remessa postal (telegrama, sedex, cartas simples ou
registrada) ou "qualquer outro meio tecnológico hábil" que assegure o
seu conhecimento, mas não obriga ao órgão de trânsito à expedição da
notificação mediante Aviso de Recebimento (AR).
4. Se o CTB reputa válidas as notificações por remessa postal, sem
explicitar a forma de sua realização, tampouco o CONTRAN o fez, não

há como atribuir à administração pública uma obrigação não prevista em
lei ou, sequer, em ato normativo, sob pena de ofensa aos princípios da
legalidade, da separação dos poderes e da proporcionalidade,
considerando o alto custo da carta com AR e, por conseguinte, a
oneração dos cofres públicos.
5. O envio da notificação, por carta simples ou registrada, satisfaz a
formalidade legal e, cumprindo a administração pública o comando
previsto na norma especial, utilizando-se, para tanto, da Empresa de
Correios e Telégrafos - ECT (empresa pública), cujos serviços gozam de
legitimidade e credibilidade, não há se falar em ofensa ao contraditório e
à ampla defesa no âmbito do processo administrativo, até porque, se
houver falha nas notificações, o art. 28 da Resolução n. 619/16 do
Contran prevê que "a autoridade de trânsito poderá refazer o ato,
observados os prazos prescricionais".
6. Cumpre lembrar que é dever do proprietário do veículo manter
atualizado o seu endereço junto ao órgão de trânsito e, se a devolução de
notificação ocorrer em virtude da desatualização do endereço ou recusa
do proprietário em recebê-la considera-se-á válida para todos os efeitos
(arts. 271 § 7º, e 282 § 1º, c/c o art. 123, § 2º, do Código de Trânsito).
7. Além do rol de intimações estabelecido no art. 26, § 3º, da Lei
9.784/99 ser meramente exemplificativo, a própria lei impõe em seu art.
69 que "os processos administrativos específicos continuarão a reger-se
por lei própria, aplicando-se-lhes apenas subsidiariamente os preceitos
desta Lei".
8. O critério da especialidade "tem sua razão de ser na inegável idéia de
que o legislador, quanto cuidou de determinado tema de forma mais
específica, teve condições de reunir no texto da lei as regras mais
consentâneas com a matéria disciplinada" (MS 13939/DF, Relator
Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, Órgão Julgador S3 - TERCEIRA SEÇÃO, DJe 09/11/2009).
9. Da interpretação dos arts. 280, 281 e 282 do CTB, conclui-se que é
obrigatória a comprovação do envio da notificação da autuação e da
imposição da penalidade, mas não se exige que tais expedições sejam
acompanhadas de aviso de recebimento.
10. Pedido de uniformização julgado improcedente.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por
unanimidade, julgar improcedente o Pedido de Uniformização, nos termos do voto do Sr. Ministro
Relator. Os Srs. Ministros Francisco Falcão, Herman Benjamin, Napoleão Nunes Maia Filho, Og
Fernandes, Mauro Campbell Marques, Assusete Magalhães, Sérgio Kukina e Regina Helena
Costa votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 11 de março de 2020 (Data do julgamento).
MINISTRO GURGEL DE FARIA
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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