Inclusão judicial do executado em cadastro de inadimplentes não depende de prévia recusa administrativa

Inclusão judicial do executado em cadastro de inadimplentes não depende de prévia recusa administrativa

Embora o juiz não esteja obrigado a deferir o pedido de inclusão do nome do devedor em cadastro de inadimplentes, conforme previsto pelo artigo 782, parágrafo 3º, do Código de Processo Civil (CPC) de 2015, não é permitido ao magistrado condicionar a medida judicial à prévia recusa do registro por parte das entidades mantenedoras do cadastro.

A tese foi fixada pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) segundo o qual o acionamento do aparato judicial para inscrever o nome do devedor só teria justificativa caso fosse comprovada a recusa do pedido administrativo.

O recurso teve origem em agravo de instrumento interposto por empresa de fomento mercantil contra decisão de primeiro grau que, em fase de cumprimento de sentença, indeferiu o pedido de inscrição do nome do executado no cadastro de inadimplentes, sob o fundamento de que a medida é de iniciativa exclusiva do credor. A decisão foi mantida pelo TJPR.

Efetividade do processo

O relator do recurso especial da empresa de fomento mercantil, ministro Marco Aurélio Bellizze, lembrou que o ordenamento jurídico brasileiro deve tutelar não apenas o reconhecimento do direito postulado pela parte no Judiciário, mas também a efetivação desse direito.

Como resultado dessa orientação – destacou o ministro –, o CPC/2015 criou diversos mecanismos para garantir a efetividade da tutela jurisdicional, a exemplo da possibilidade de protesto da decisão judicial transitada em julgado depois de ultrapassado o prazo para pagamento voluntário (artigo 517) e da constituição da hipoteca judiciária (artigo 495), entre outros.

"Além disso, estabeleceu-se a permissão para a adoção de medidas executórias atípicas, a fim de coagir indiretamente o executado a satisfazer a obrigação, dando maior efetividade ao processo civil, possibilitando, por exemplo, a restrição de alguns direitos, como a retenção de passaporte e/ou da Carteira Nacional de Habilitação", apontou o relator.

Segundo Bellizze, uma das medidas executivas típicas é a possibilidade de inclusão do nome do devedor nos cadastros de inadimplentes. Esse ato judicial, contudo, só é possível mediante requerimento da parte, nunca por iniciativa do juiz.

"Vale ressaltar que a medida prevista no artigo 782, parágrafo 3º, do CPC/2015 não impõe ao juiz o dever de determinar a negativação do nome do devedor, pois se trata de mera faculdade – em razão do uso da forma verbal 'pode' –, e não de uma obrigação legal, devendo ser analisadas as particularidades do caso concreto", ponderou o ministro.

Requisito ilegal

No entanto, o relator ressaltou que o TJPR, ao condicionar a averbação à prévia recusa administrativa, criou requisito não previsto em lei. Ademais – enfatizou –, o entendimento está na contramão da sistemática trazida pelo CPC, a qual busca a máxima efetividade na tutela jurisdicional.

Bellizze afirmou que não há impedimento para que o credor requeira diretamente a inclusão do nome do devedor à gestora do cadastro de restrição de crédito, mas também não existe óbice para que esse pedido seja feito na via judicial, no curso da execução.

Como as instâncias ordinárias indeferiram o pedido de inscrição apenas com fundamento na falta de prévia recusa administrativa, Bellizze concluiu ser necessário o retorno dos autos ao TJPR, a fim de que sejam analisadas as circunstâncias do caso concreto para se verificar a necessidade da inscrição e o seu potencial de coagir o devedor a pagar a dívida.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.835.778 - PR (2018/0264494-0)
RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE
RECORRENTE : FINANZA FOMENTO MERCANTIL LTDA
ADVOGADO : EVANDRO BUENO DE OLIVEIRA E OUTRO(S) - PR040760
RECORRIDO : ANA PAULA DOS ANJOS SAMESIMA BIM
ADVOGADOS : ANÍBAL BIM E OUTRO(S) - PR005904
ROGÉRIO EDUARDO DE CARVALHO BIM - PR030299
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. AUSÊNCIA DE NEGATIVA DE
PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. QUESTÕES DEVIDAMENTE APRECIADAS PELO TRIBUNAL
DE ORIGEM. REQUERIMENTO DE INCLUSÃO DO NOME DO EXECUTADO EM CADASTROS
DE INADIMPLENTES, NOS TERMOS DO ART. 782, § 3º, DO CPC/2015. DESNECESSIDADE
DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. NORMA QUE DEVE SER INTERPRETADA
DE FORMA A GARANTIR AMPLA EFICÁCIA À EFETIVIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL
EXECUTIVA. REFORMA DO ACÓRDÃO RECORRIDO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO EM
PARTE.
1. A controvérsia posta no presente recurso especial consiste em saber, além da adequação
da tutela jurisdicional prestada, se o requerimento de inclusão do nome do executado em
cadastros de inadimplentes, nos termos do que dispõe o art. 782, § 3º, do Código de
Processo Civil de 2015, depende da comprovação de prévia recusa administrativa das
entidades mantenedoras do respectivo cadastro.
2. Da leitura do acórdão recorrido, verifica-se que a Corte local apreciou expressamente a
questão relacionada à norma do art. 139, inciso IV, do CPC/2015, não havendo que se falar
em negativa de prestação jurisdicional.
3. O ordenamento jurídico brasileiro deve tutelar não apenas o reconhecimento do direito
postulado pela parte perante o Poder Judiciário, mas, também, a efetivação desse direito.
Trata-se do princípio da efetividade, corolário do devido processo legal, o qual foi alçado
pelo Código de Processo Civil de 2015 como norma fundamental, ao estabelecer em seus
arts. 4º e 6º o direito à obtenção da atividade satisfativa.
4. Nessa linha, foram implementados no novo CPC diversas medidas executivas visando
garantir a efetividade da tutela jurisdicional prestada, permitindo-se ao Magistrado, ainda, a
aplicação de medidas atípicas, a fim de coagir indiretamente o executado a satisfazer a
obrigação, em conformidade com o teor do art. 139, inciso IV, do CPC/2015.
5. Em relação às medidas executivas típicas, uma das novidades trazidas pelo novo diploma
processual civil é a possibilidade de inclusão do nome do devedor nos cadastros de
inadimplentes, a qual encontra previsão expressa no art. 782, § 3º, do CPC de 2015.
6. Tal norma deve ser interpretada de forma a garantir maior amplitude possível à
concretização da tutela executiva, em conformidade com o princípio da efetividade do
processo, não se mostrando razoável que o Poder Judiciário imponha restrição ao
implemento dessa medida, condicionando-a à prévia recusa administrativa das entidades
mantenedoras do respectivo cadastro, em manifesto descompasso com o propósito
defendido pelo CPC/2015, especialmente em casos como o presente, em que as tentativas
de satisfação do crédito foram todas frustradas.
7. Considerando que o único fundamento utilizado pelas instâncias ordinárias foi a
necessidade de requerimento administrativo prévio pelo exequente, não havendo, portanto,
qualquer análise acerca das circunstâncias do caso concreto para se verificar a necessidade
e a potencialidade de a negativação coagir o devedor à satisfação da obrigação, impõe-se o
retorno dos autos para que o pedido seja novamente analisado.
8. Recurso especial parcialmente provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam
os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar parcial
provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Moura Ribeiro (Presidente), Nancy Andrighi, Paulo de Tarso
Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 04 de fevereiro de 2020 (data do julgamento).
MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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