Dano moral por inclusão indevida em cadastro restritivo é possível mesmo com inscrição preexistente

Dano moral por inclusão indevida em cadastro restritivo é possível mesmo com inscrição preexistente

A orientação contida na Súmula 385 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) pode ser flexibilizada para permitir o reconhecimento de dano moral decorrente da inscrição indevida em cadastro restritivo de crédito, mesmo que as ações ajuizadas para questionar as inscrições anteriores ainda não tenham transitado em julgado, desde que haja elementos suficientes para demonstrar a verossimilhança das alegações do consumidor.

A Terceira Turma do STJ aplicou esse entendimento para condenar um banco a indenizar um consumidor em R$ 5 mil, em decorrência da inscrição indevida de seu nome em cadastro de restrição de crédito.

Em ação movida contra o banco, o consumidor conseguiu que fossem reconhecidas a inexistência do débito e a ilegalidade do registro na Serasa. Entretanto, seu pedido de danos morais foi rejeitado em primeira instância, em razão da existência de anotações anteriores contra ele no cadastro.

Inscrições contestadas

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve a sentença, citando – entre outros fundamentos para negar a indenização – a Súmula 385, segundo a qual não cabe reparação de dano moral se o consumidor tem alguma anotação legítima anterior.

No recurso especial, o consumidor alegou que a súmula não pode ser aplicada ao caso, pois as outras inscrições de seu nome também são indevidas e estão sendo questionadas judicialmente.

Segundo a ministra Nancy Andrighi, relatora, é correto o entendimento do TJSP no sentido de que, até o reconhecimento judicial definitivo acerca da inexigibilidade do débito, deve ser presumida como legítima a anotação feita pelo credor nos cadastros restritivos. Ela destacou que essa presunção, em regra, não é afastada pela simples juntada de extratos que comprovem o ajuizamento de ações com a finalidade de contestar as demais inscrições.

Defesa dificultada

Entretanto, afirmou a relatora, em determinadas hipóteses, o consumidor pode ficar em situação excessivamente desfavorável, especialmente quando as ações que questionam os débitos e pedem a compensação por danos morais forem ajuizadas concomitantemente – como ocorreu no caso analisado.

"Não se pode admitir que seja dificultada a defesa dos direitos do consumidor em juízo, exigindo-se, como regra absoluta, o trânsito em julgado de todas as sentenças que declararam a inexigibilidade de todos os débitos e, consequentemente, a irregularidade de todas as anotações anteriores em cadastro de inadimplentes para, só então, reconhecer o dano moral", disse.

Nancy Andrighi mencionou que o consumidor ajuizou outras três ações para questionar as inscrições. Em duas, já transitadas em julgado, obteve a declaração de inexistência das dívidas, mas não conseguiu os danos morais por causa das demais inscrições. Em outro, ainda pendente de recursos, a sentença cancelou a dívida e determinou a indenização.

Círculo vicioso

"O contexto dos autos, a um só tempo, bem revela o dito 'círculo vicioso' em que se pôs o consumidor recorrente e evidencia a verossimilhança das alegações deduzidas por ele, reforçando as razões de direito que fundamentaram o ajuizamento desta ação", avaliou.

A ministra concluiu que a falta do trânsito em julgado em apenas um desses processos autoriza o afastamento da Súmula 385 para se reconhecer a procedência do pedido de indenização.

Ela lembrou que a Terceira Turma já flexibilizou a aplicação da súmula em situação semelhante, quando julgou o REsp 1.647.795, em outubro de 2017.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.704.002 - SP (2017/0266552-2)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : LEONARDO JOAO DE ARAUJO
ADVOGADOS : ROBERTO NUNES DE MENEZES - SP141747
DANILO LELLES DE MENEZES E OUTRO(S) - SP329969
RECORRIDO : BANCO BRADESCO CARTÕES S.A
ADVOGADOS : FLAVIA GONÇALVES RODRIGUES DE FARIA E OUTRO(S) - SP237085
MARIA CELINA VELLOSO CARVALHO DE ARAUJO - SP269483
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C
PEDIDO DE COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. INSCRIÇÃO INDEVIDA.
ANOTAÇÕES PRETÉRITAS DISCUTIDAS JUDICIALMENTE. VEROSSIMILHANÇA
DAS ALEGAÇÕES DO CONSUMIDOR. FLEXIBILIZAÇÃO DA SÚMULA 385/STJ.
DANO MORAL CONFIGURADO. JULGAMENTO: CPC/15.
1. Ação declaratória de inexistência de débito c/c pedido de compensação
por dano moral ajuizada em 17/02/2016, da qual foi extraído o presente
recurso especial, interposto em 11/04/2017 e atribuído ao gabinete em
20/10/2017.
2. O propósito recursal consiste em decidir se a anotação indevida do nome
do consumidor em órgão de restrição ao crédito, quando preexistentes
outras inscrições cuja regularidade é questionada judicialmente, configura
dano moral a ser compensado.
3. Consoante a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça,
não cabe indenização por dano moral por inscrição irregular em órgãos de
proteção ao crédito quando preexistem anotações legítimas, nos termos da
Súmula 385/STJ, aplicável também às instituições credoras.
4. Até o reconhecimento judicial definitivo acerca da inexigibilidade do
débito, deve ser presumida como legítima a anotação realizada pelo credor
junto aos cadastros restritivos, e essa presunção, via de regra, não é ilidida
pela simples juntada de extratos comprovando o ajuizamento de ações com
a finalidade de contestar as demais anotações.
5. Admite-se a flexibilização da orientação contida na súmula 385/STJ para
reconhecer o dano moral decorrente da inscrição indevida do nome do
consumidor em cadastro restritivo, ainda que não tenha havido o trânsito
em julgado das outras demandas em que se apontava a irregularidade das
anotações preexistentes, desde que haja nos autos elementos aptos a
demonstrar a verossimilhança das alegações.
6. Hipótese em que apenas um dos processos relativos às anotações
preexistentes encontra-se pendente de solução definitiva, mas com sentença
de parcial procedência para reconhecer a irregularidade do registro, tendo
sido declarada a inexistência dos demais débitos mencionados nestes autos,
por meio de decisão judicial transitada em julgado.
7. Compensação do dano moral arbitrada em R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
8. Recurso especial conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer e dar provimento ao
recurso especial nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de
Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro
votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 11 de fevereiro de 2020(Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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