Compartilhamento de informações de banco de dados exige notificação prévia ao consumidor

Compartilhamento de informações de banco de dados exige notificação prévia ao consumidor

Bancos de dados que compartilham informações de consumidores devem informá-los previamente acerca da utilização desses dados, sob pena de terem que pagar indenização por danos morais.

Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o fato de as informações serem fornecidas pelo consumidor no ato de uma compra, ou até mesmo divulgadas em redes sociais, não afasta a responsabilidade do gestor do banco de dados de previamente comunicar o seu compartilhamento.

O colegiado estabeleceu esse entendimento ao negar provimento ao recurso de uma empresa gestora de dados, que foi condenada a indenizar um consumidor em R$ 8 mil pela comercialização indevida de informações pessoais e sigilosas.

Prevenção de fraudes

No recurso especial, a empresa alegou que não haveria a necessidade de notificação prévia com fundamento no artigo 43 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), pois ela não faz negativação, sendo apenas uma fonte de validação cadastral que visa evitar a ocorrência de fraudes a partir do confronto das informações prestadas pelo consumidor ao comerciante com aquelas armazenadas no banco de dados. Ainda segundo a empresa, o consumidor não comprovou a ocorrência de danos.

Segundo a ministra Nancy Andrighi, relatora, em se tratando de compartilhamento das informações do consumidor pelos bancos de dados, deve ser observada a regra do inciso V do artigo 5º da Lei 12.414/2011, a qual assegura ao cadastrado o direito de ser informado previamente sobre a identidade do gestor e sobre o armazenamento e o objetivo do tratamento dos dados pessoais.

"O fato, por si só, de se tratar de dados usualmente fornecidos pelos próprios consumidores, quando da realização de qualquer compra no comércio, que não se afiguram como os chamados dados sensíveis ou sigilosos", não afasta a responsabilidade do gestor do banco de dados, na medida em que, quando o consumidor o faz "não está, implícita e automaticamente, autorizando o comerciante a divulgá-los no mercado" – explicou a ministra ao destacar que, nessas situações, o consumidor confia na proteção de suas informações pessoais.

Dano presumido

A ministra considerou que as alterações da Lei 12.414/2011 – promovidas pela Lei Complementar 166/2019 – não eximem o gestor do banco de dados de comunicar ao consumidor o uso dos dados pessoais.

"Embora o novo texto da Lei 12.414/2011 se mostre menos rigoroso no que diz respeito ao cumprimento do dever de informar ao consumidor sobre o seu cadastro – já que a redação originária exigia autorização prévia mediante consentimento informado por meio de assinatura em instrumento específico ou em cláusula apartada –, o legislador não desincumbiu o gestor e/ou a fonte de proceder à efetiva comunicação."

Nancy Andrighi afirmou que, na hipótese do compartilhamento das informações sem a prévia informação – como ocorreu no caso analisado –, o dano moral é presumido, sendo desnecessário ao consumidor comprovar prejuízo.

Dever de informar

A relatora declarou que "as informações sobre o perfil do consumidor, mesmo as de cunho pessoal, ganharam valor econômico no mercado de consumo e, por isso, o banco de dados constitui serviço de grande utilidade, seja para o fornecedor, seja para o consumidor, mas, ao mesmo tempo, atividade potencialmente ofensiva a direitos da personalidade deste".

Para a solução do caso, ela afirmou que é importante considerar as exigências da lei quanto ao dever de informação, "que tem como uma de suas vertentes o dever de comunicar por escrito ao consumidor a abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo, quando não solicitada por ele, consoante determina o parágrafo 2º do artigo 43 do CDC".

Nancy Andrighi destacou que a situação analisada é distinta da questão enfrentada pela Segunda Seção ao julgar o Tema 710 dos recursos repetitivos, em 2014, quando o colegiado decidiu que, no sistema credit scoring, não se pode exigir o prévio e expresso consentimento do consumidor avaliado, pois não constitui um cadastro ou banco de dados, mas um modelo estatístico.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.758.799 - MG (2017/0006521-9)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : PROCOB S/A
ADVOGADO : RICARDO DOS SANTOS ABREU - PR017142
RECORRIDO : JOSÉ GALVÃO DA SILVA
ADVOGADO : THIAGO CRESTANI DAMIAN E OUTRO(S) - RS078975
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. FUNDAMENTO NÃO IMPUGNADO. SÚM. 283/STF. AÇÃO
DE COMPENSAÇÃO DE DANO MORAL. BANCO DE DADOS.
COMPARTILHAMENTO DE INFORMAÇÕES PESSOAIS. DEVER DE
INFORMAÇÃO. VIOLAÇÃO. DANO MORAL IN RE IPSA. JULGAMENTO: CPC/15.
1. Ação de compensação de dano moral ajuizada em 10/05/2013, da qual foi
extraído o presente recurso especial, interposto em 29/04/2016 e atribuído
ao gabinete em 31/01/2017.
2. O propósito recursal é dizer sobre: (i) a ocorrência de inovação recursal
nas razões da apelação interposta pelo recorrido; (ii) a caracterização do
dano moral em decorrência da disponibilização/comercialização de dados
pessoais do recorrido em banco de dados mantido pela recorrente.
3. A existência de fundamento não impugnado – quando suficiente para a
manutenção das conclusões do acórdão recorrido – impede a apreciação do
recurso especial (súm. 283/STF).
4. A hipótese dos autos é distinta daquela tratada no julgamento do REsp
1.419.697/RS (julgado em 12/11/2014, pela sistemática dos recursos
repetitivos, DJe de 17/11/2014), em que a Segunda Seção decidiu que, no
sistema credit scoring, não se pode exigir o prévio e expresso consentimento
do consumidor avaliado, pois não constitui um cadastro ou banco de dados,
mas um modelo estatístico.
5. A gestão do banco de dados impõe a estrita observância das exigências
contidas nas respectivas normas de regência – CDC e Lei 12.414/2011 – 

dentre as quais se destaca o dever de informação, que tem como uma de
suas vertentes o dever de comunicar por escrito ao consumidor a abertura
de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo, quando não
solicitada por ele.
6. O consumidor tem o direito de tomar conhecimento de que informações a
seu respeito estão sendo arquivadas/comercializadas por terceiro, sem a sua
autorização, porque desse direito decorrem outros dois que lhe são
assegurados pelo ordenamento jurídico: o direito de acesso aos dados
armazenados e o direito à retificação das informações incorretas.
7. A inobservância dos deveres associados ao tratamento (que inclui a
coleta, o armazenamento e a transferência a terceiros) dos dados do
consumidor – dentre os quais se inclui o dever de informar – faz nascer para
este a pretensão de indenização pelos danos causados e a de fazer cessar,
imediatamente, a ofensa aos direitos da personalidade.
8. Em se tratando de compartilhamento das informações do consumidor
pelos bancos de dados, prática essa autorizada pela Lei 12.414/2011 em
seus arts. 4º, III, e 9º, deve ser observado o disposto no art. 5º, V, da Lei
12.414/2011, o qual prevê o direito do cadastrado ser informado
previamente sobre a identidade do gestor e sobre o armazenamento e o
objetivo do tratamento dos dados pessoais
9. O fato, por si só, de se tratarem de dados usualmente fornecidos pelos
próprios consumidores quando da realização de qualquer compra no
comércio, não afasta a responsabilidade do gestor do banco de dados, na
medida em que, quando o consumidor o faz não está, implícita e
automaticamente, autorizando o comerciante a divulgá-los no mercado;
está apenas cumprindo as condições necessárias à concretização do
respectivo negócio jurídico entabulado apenas entre as duas partes,
confiando ao fornecedor a proteção de suas informações pessoais.
10. Do mesmo modo, o fato de alguém publicar em rede social uma
informação de caráter pessoal não implica o consentimento, aos usuários
que acessam o conteúdo, de utilização de seus dados para qualquer outra
finalidade, ainda mais com fins lucrativos.
11. Hipótese em que se configura o dano moral in re ipsa. 

12. Em virtude do exame do mérito, por meio do qual foram rejeitadas as
teses sustentada pela recorrente, fica prejudicada a análise da divergência
jurisprudencial.
13. Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer em parte do recurso
especial e, nesta parte, negar-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra
Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco
Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 12 de novembro de 2019(Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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