Motorista assaltado mais de dez vezes receberá indenização de indústria de cigarros
Um motorista que sofreu mais de dez assaltos ao transportar cigarros para a Phillip Morris Brasil vai receber indenização de R$ 11 mil. A decisão é da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, que considerou alta a exposição do empregado ao risco em razão de a mercadoria ser muito visada por assaltantes.
Violência urbana
Na reclamação trabalhista, o motorista, promovido posteriormente a vendedor de varejo, disse que trabalhava em áreas de risco no Rio de Janeiro e que, nessas circunstâncias, havia sofrido os assaltos, durante os quais fora rendido por homens armados que roubaram a carga e o dinheiro dos pagamentos recebidos. Em uma das ocasiões, relatou que havia ficado em poder dos assaltantes por mais de 1h dentro de uma comunidade.
O Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ) julgou improcedente o pedido de indenização, por entender que não se pode considerar como risco da atividade a exposição do trabalhador à violência urbana, fruto da ineficiência do Estado, à qual todos os cidadãos estão sujeitos, independentemente das atividades que realizam”.
Responsabilidade sem culpa
O relator do recurso de revista do empregado, ministro Mauricio Godinho Delgado, explicou que, de maneira geral, exige-se a configuração da culpa do empregador pelo ato ou pela situação que provocou dano ao empregado. “Contudo, quando a atividade desenvolvida pela empresa envolve, por sua natureza, risco para os direitos de outrem, a responsabilidade passa a ser objetiva e independe de culpa”, assinalou.
Para a Terceira Turma, o risco corrido pelo motorista-entregador era muito maior do que o vivenciado pelo homem médio, pois o trabalho envolvia transporte de mercadoria sabidamente visada por assaltantes. “O fato é que também ficou comprovada a conduta culposa da empresa nos eventos ocorridos com o empregado, ao se omitir de ações que fossem capazes de protegê-lo”, afirmou o relator. “Sob qualquer ângulo que se analise a controvérsia, permanece o dever de indenizar”.
Processo: RR-101016-29.2017.5.01.0040
A)AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE
REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI
13.015/2014 E ANTERIOR À LEI
13.467/2017. DANO MORAL. TRANSPORTE DE
CARGAS (CIGARROS). ATIVIDADE DE RISCO.
ASSALTOS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA.
Demonstrado no agravo de instrumento
que o recurso de revista preenchia os
requisitos do art. 896 da CLT, dá-se
provimento ao agravo de instrumento,
para melhor análise da violação do art.
927, parágrafo único, do CCB, suscitada
no recurso de revista. Agravo de
instrumento provido.
B) RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A
ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E ANTERIOR À
LEI 13.467/2017. 1. PRELIMINAR
SUSCITADA PELA RECLAMADA EM
CONTRARRAZÕES. AUSÊNCIA DOS
PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS.
ENQUADRAMENTO JURÍDICO EM DISSONÂNCIA
COM JURISPRUDÊNCIA DO TST. Estando o
enquadramento jurídico em dissonância
com o entendimento jurisprudencial
desta Corte, não há que falar em
ausência de pressupostos intrínsecos.
Preliminar rejeitada. 2. DANO MORAL.
TRANSPORTE DE CARGAS (CIGARROS).
ATIVIDADE DE RISCO. ASSALTOS.
RESPONSABILIDADE OBJETIVA. Nos casos
em que o risco ao qual se expõe o
trabalhador (em razão de sua função
prevista no contrato de trabalho) é
muito maior do que o vivenciado pelo
indivíduo médio, é possível a aplicação
da responsabilidade civil objetiva do
empregador (parágrafo único do art. 927
do CCB). Na hipótese dos autos, a Corte
de origem registrou que o Autor foi
contratado pela Reclamada para exercer
a função de entregador/motorista de
mercadorias comercializadas pela
Reclamada, tendo comprovado que sofreu
assaltos no curso do contrato de
trabalho, o que demonstra que o risco ao
qual se expôs, no exercício das suas
atividades, era muito maior do que o
vivenciado pelo homem médio, pois
trabalhava com mercadoria sabidamente
visada por assaltantes. A esse
respeito, destaques da sentença que
foram transcritos no acórdão regional:
“os documentos acostados com a inicial
deixam certo que o autor, durante o
exercício do trabalho e em razão dele,
foi assaltado diversas vezes, inclusive
sob arma de fogo, o que também foi
corroborado pela testemunha arrolado
pela empresa, Sr. José Ricardo Silva:
„que o autor já foi assaltado mais de 10
vezes‟" (g.n.). Tal circunstância
evidencia o risco mais elevado a que se
submetia o Reclamante em face da
atividade desempenhada na empresa. No
caso, o risco de assalto era oriundo da
própria carga transportada pelo
Reclamante em veículos da empresa
(cigarros), razão pela qual resta
caracterizado o nexo de causalidade
entre os assaltos sofridos pelo
Reclamante e a atividade exercida.
Presentes o dano, o nexo de causalidade
e a responsabilidade cabe a
correspondente indenização. Recurso de
revista conhecido e provido.