Ajuizamento de segunda ação pelo devedor para questionar o débito não afeta prazo prescricional

Ajuizamento de segunda ação pelo devedor para questionar o débito não afeta prazo prescricional

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento ao recurso especial de uma clínica para declarar prescrita a cédula de crédito comercial da qual era devedora, ao entendimento de que, após o ajuizamento de uma ação anulatória em 2000 e de outra em 2011, não houve a interrupção do prazo prescricional pela última ação, tendo transcorrido o prazo para o banco credor cobrar a dívida.

O recurso teve origem na segunda ação ajuizada pela recorrente, na qual pleiteou a declaração da prescrição da pretensão de cobrança de dívida documentada em cédula de crédito comercial, já que, após o vencimento do título, o banco não exigiu seu pagamento. A primeira ação anulatória foi proposta em fevereiro de 2000, tendo a sentença de improcedência transitado em julgado em março de 2008.

O juízo de primeiro grau julgou improcedente o pedido da segunda ação, e a apelação foi negada pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, o qual entendeu não ter havido prescrição, pois, ainda que a primeira ação tenha interrompido o prazo, a segunda também o fez.

Interrupção do prazo

A relatora do recurso no STJ, ministra Nancy Andrighi, explicou que a jurisprudência da corte se firmou no sentido de que, não se tratando de execução (cujo prazo é trienal), a prescrição da pretensão do credor em ação de cobrança de título de crédito está sujeita ao prazo de 20 anos das ações pessoais, na vigência do Código Civil de 1916 – prazo reduzido para cinco anos no código de 2002.

Segundo a relatora, a jurisprudência considera que a propositura de demanda judicial pelo devedor – seja anulatória, seja de sustação de protesto –, que importe em impugnação do débito contratual ou de cártula representativa do direito do credor, é causa interruptiva da prescrição.

"Na hipótese em julgamento, portanto, mesmo que a ação tenha sido proposta pela devedora, ora recorrente, percebe-se que ela tem o condão de interromper o prazo prescricional", ressaltou.

Reinício

A ministra lembrou que, no caso de interrupção do prazo prescricional por propositura de ação judicial, a legislação é expressa ao dispor que o reinício da contagem ocorre após o encerramento do processo, conforme dispõe o parágrafo único do artigo 202 do Código Civil.

No mesmo dispositivo, afirmou a relatora, está expresso que a interrupção da prescrição se dá apenas uma vez. Citando, entre outros, os juristas Maria Helena Diniz e Humberto Teodoro Júnior, a ministra destacou que "a doutrina é uníssona ao afirmar que a interrupção somente ocorre uma única vez para determinado prazo prescricional".

Para ela, reconhecida a interrupção da prescrição em fevereiro de 2000, quando a primeira ação foi ajuizada, é impossível ocorrer uma segunda interrupção, com o ajuizamento da segunda ação em dezembro de 2011, "ainda mais por se tratar da mesma causa interruptiva".

Unicidade da interrupção

No caso julgado, a relatora verificou que a cédula de crédito comercial firmada entre as partes venceu em agosto de 2000, porém, no mesmo ano, a recorrente ajuizou ação anulatória cuja sentença de improcedência transitou em julgado em março de 2008.

"A partir desse momento, reiniciou-se a contagem do prazo prescricional de cinco anos, não tendo, todavia, transcorrido por inteiro o prazo até o ajuizamento da presente demanda, em 2011. Contudo, como discutido acima, essa nova lide é incapaz de interromper mais uma vez o decurso do prazo prescricional da cédula de crédito comercial", disse.

Em conclusão, observou a ministra, a prescrição para a cobrança do título em discussão reiniciou-se com o trânsito em julgado da primeira demanda (março de 2008) e, sem ser interrompida novamente em dezembro de 2011, transcorreu em 2013.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.810.431 - RJ (2015/0017915-4)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : CLINICA WAJNBERG LTDA
ADVOGADOS : SARA REGINA DE OLIVEIRA E OUTRO(S) - RJ074964
FERNANDA BERNARDINO DE ALMEIDA E OUTRO(S) - RJ195869
MARIANA CAMPOS PEDROSO E OUTRO(S) - RJ195980
RECORRIDO : BANCO BRADESCO S/A
ADVOGADOS : MONICA DENISE CARLI E OUTRO(S) - SP082112
MATILDE DUARTE GONÇALVES E OUTRO(S) - RJ151753
ÉZIO PEDRO FULAN E OUTRO(S) - RJ151756
RAFAEL MARQUES DE OLIVEIRA E OUTRO(S) - RJ152284
BRUNO MORAES PIRES VIEIRA - RJ165692
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA. PRESCRIÇÃO.
CÉDULA DE CRÉDITO COMERCIAL. PRAZO QUINQUENAL. AJUIZAMENTO DE
AÇÃO ANULATÓRIA PELO DEVEDOR. INTERRUPÇÃO DO PRAZO ATÉ O
TRÂNSITO EM JULGADO. NOVA INTERRUPÇÃO PELO AJUIZAMENTO DE
OUTRA DEMANDA. IMPOSSIBILIDADE. PRESCRIÇÃO. RECONHECIDA.
1. Ação ajuizada em 07/12/2011. Recurso interposto em 20/10/2014 e
atribuído ao gabinete em 25/08/2016.
2. Ação declaratória ajuizada pelo devedor de cédula de crédito comercial,
na qual pretende que seja declarada a prescrição da pretensão de cobrança
da dívida, com a consequente extinção de garantia hipotecária.
3. Não se tratando de execução, cujo prazo é trienal, a prescrição da
pretensão de cobrança de dívida documentada em título de crédito
regula-se pelo prazo quinquenal. Precedentes.
4. A propositura de demanda judicial pelo devedor, seja anulatória, seja de
sustação de protesto, que importe em impugnação do débito contratual ou
de cártula representativa do direito do credor, é causa interruptiva da
prescrição. Precedentes.
5. Em se tratando de causa interruptiva judicial, a contagem do prazo
prescricional reinicia após o último ato do processo, ou seja, o trânsito em
julgado. Precedentes.
6. Conforme dispõe o art. 202, caput, do CC/2002, a interrupção da
prescrição ocorre somente uma única vez, ainda mais quando se trata, como
na hipótese dos autos, da mesma causa interruptiva.
7. Recurso especial conhecido e provido.
ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer e dar provimento ao
recurso especial nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de
Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva e Moura Ribeiro votaram com a Sra.
Ministra Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Marco Aurélio Bellizze. Dr(a).
FERNANDA BERNARDINO DE ALMEIDA, pela parte RECORRENTE: CLINICA WAJNBERG
LTDA.
Brasília (DF), 04 de junho de 2019(Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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