Roubo em estacionamento aberto e de livre acesso não gera responsabilidade para o comerciante
O estabelecimento comercial não pode ser responsabilizado pelos prejuízos decorrentes de assalto à mão armada ocorrido em seu estacionamento quando este representa mera comodidade aos consumidores e está situado em área aberta, gratuita e de livre acesso. Em tais situações, o roubo é fato de terceiro que exclui a responsabilidade da empresa, por se tratar de fortuito externo.
Com esse entendimento, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento a embargos de divergência e pacificou o tema no tribunal, tendo em vista decisões divergentes nas duas turmas de direito privado.
Segundo o processo, o roubo da moto e de pertences pessoais de um consumidor ocorreu no estacionamento gratuito e aberto de uma lanchonete. Ele buscou ser indenizado pelo prejuízo, mas o pedido foi rejeitado em primeira instância.
O Tribunal de Justiça de São Paulo deu provimento à apelação para condenar a lanchonete ao pagamento de danos materiais, aplicando a Súmula 130 do STJ. Ao julgar o recurso especial, a Terceira Turma, por maioria, afastou a aplicação da súmula.
O consumidor entrou com embargos de divergência, citando julgado da Quarta Turma que havia reconhecido a responsabilidade civil da mesma empresa em situação semelhante.
Área aberta
Para a ministra Isabel Gallotti, relatora dos embargos, não é possível responsabilizar a lanchonete por um roubo que ocorreu em área aberta, sem controle de acesso.
“Entendimento diverso transferiria a responsabilidade pela guarda da coisa – a qual cabe, em princípio, ao respectivo proprietário – e pela segurança pública – incumbência do Estado – para comerciantes em geral, onerando, sem causa legítima e razoável, o custo de suas atividades, em detrimento da atividade econômica nacional”, afirmou a ministra.
Ela reconheceu a existência de decisões em sentido diverso nas turmas de direito privado do tribunal.
Isabel Gallotti ressaltou que “o STJ, conferindo interpretação extensiva à Súmula 130, entende que estabelecimentos comerciais, tais como grandes shoppings centers e hipermercados, ao oferecerem estacionamento, ainda que gratuito, respondem pelos assaltos à mão armada praticados contra os clientes quando, apesar de o estacionamento não ser inerente à natureza do serviço prestado, gera legítima expectativa de segurança ao cliente em troca dos benefícios financeiros indiretos decorrentes desse acréscimo de conforto aos consumidores”.
Entretanto, a relatora disse que tal entendimento não pode ser estendido às hipóteses nas quais o estacionamento representa mera comodidade e é área aberta, gratuita e sem controle de acesso, como no caso dos embargos de divergência apreciados pela Segunda Seção.
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RESP Nº 1.431.606 - SP (2014/0015227-3)
RELATORA : MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI
EMBARGANTE : RENATO MARTINEZ DA SILVA
ADVOGADOS : RONALDO RODRIGUES FERREIRA E OUTRO(S) - SP090986
CÉLIA REGINA MARTINS BIFFI - SP068416
EMBARGADO : ARCOS DOURADOS COMÉRCIO DE ALIMENTOS LTDA
ADVOGADOS : VÂNIA WONGTSCHOWSKI - SP183503
CAIO VASCONCELOS ARAÚJO E OUTRO(S) - SP309287
ADVOGADOS : RAFAELA DOS PASSOS MIRANDA DAMASCENO - DF040867
JOAO CARLOS SIQUEIRA RIBEIRO FILHO E OUTRO(S) - DF054233
EMENTA
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. RECURSO ESPECIAL. LANCHONETE. ROUBO EM
ESTACIONAMENTO GRATUITO, EXTERNO E DE LIVRE ACESSO. EMPREGO DE
ARMA DE FOGO. CASO FORTUITO EXTERNO. SÚMULA Nº 130/STJ.
INAPLICABILIDADE. RISCO ESTRANHO À NATUREZA DO SERVIÇO PRESTADO.
AUSÊNCIA DE LEGÍTIMA EXPECTATIVA DE SEGURANÇA.
1. O Superior Tribunal de Justiça, conferindo interpretação extensiva à Súmula n°
130/STJ, entende que estabelecimentos comerciais, tais como grandes shoppings
centers e hipermercados, ao oferecerem estacionamento, ainda que gratuito,
respondem pelos assaltos à mão armada praticados contra os clientes quando, apesar
de o estacionamento não ser inerente à natureza do serviço prestado, gera legítima
expectativa de segurança ao cliente em troca dos benefícios financeiros indiretos
decorrentes desse acréscimo de conforto aos consumidores.
2. Nos casos em que o estacionamento representa mera comodidade, sendo área
aberta, gratuita e de livre acesso por todos, o estabelecimento comercial não pode ser
responsabilizado por roubo à mão armada, fato de terceiro que exclui a
responsabilidade, por se tratar de fortuito externo.
3. Embargos de divergência não providos.
ACÓRDÃO
Suscitada preliminar de não conhecimento pelo Sr. Ministro Antonio
Carlos Ferreira, a Segunda Seção, por maioria, negou provimento aos embargos de
divergência, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora, vencidos, em parte, os Srs.
Ministros Antonio Carlos Ferreira e Moura Ribeiro, que não conheceram dos embargos
de divergência. Os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Buzzi, Marco
Aurélio Bellizze, Luis Felipe Salomão e Raul Araújo votaram com a Sra. Ministra
Relatora.
Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Nancy Andrighi.
Consignada a presença do Dr. PAULO HENRIQUE DE PAIVA SANTOS,
representando o EMBARGADO ARCOS DOURADOS COMÉRCIO DE ALIMENTOS
LTDA.
Brasília (DF), 27 de março de 2019 (Data do Julgamento)
MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI
Relatora