Cabe agravo de instrumento contra decisões proferidas durante processo de recuperação e falência

Cabe agravo de instrumento contra decisões proferidas durante processo de recuperação e falência

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que as hipóteses legais de cabimento do agravo de instrumento elencadas no parágrafo único do artigo 1.015 do Código de Processo Civil de 2015 devem ser interpretadas extensivamente, englobando também a recuperação judicial e a falência. Dessa forma, o colegiado deu provimento a um recurso especial para admitir a interposição de agravo de instrumento contra decisão proferida após a sentença de habilitação de crédito.

De acordo com os autos, os recorrentes pediram a habilitação de seus créditos na recuperação judicial de uma empresa de transporte – o primeiro relativo a indenização de danos originados em acidente de trânsito e o segundo decorrente dos honorários de sucumbência fixados na ação indenizatória.

O advogado pediu prioridade de pagamento alegando que, devido a um grave problema de saúde, seu crédito deveria se sobrepor ao dos credores trabalhistas, os quais já estavam recebendo os valores devidos em razão de acordo judicial.

Após o indeferimento do pedido, o advogado interpôs agravo de instrumento, que não foi conhecido pelo Tribunal de Justiça de Sergipe, ao entendimento de que não haveria previsão no rol taxativo do artigo 1.015 do CPC.

Sistema recursal

O relator do recurso no STJ, ministro Villas Bôas Cueva, explicou que a Lei de Falência e Recuperação de Empresas (LFRE) tem normas de direito material e processual, instituindo um regime recursal próprio. “Prevê, em linhas gerais, que contra as sentenças cabe agravo de instrumento e contra decisões interlocutórias cabe apelação”, disse.

O ministro esclareceu que contra a sentença que decreta a falência cabe agravo de instrumento, o qual não tem efeito suspensivo, permitindo que, pelo princípio da celeridade, seja iniciada a realização do ativo, como forma de evitar a desvalorização dos bens. Nessas hipóteses, a concessão de efeito suspensivo passa a ser excepcional, dependendo de decisão do relator do recurso.

“Tal regramento próprio, porém, não é exaustivo, prevendo o artigo 189 da LFRE a aplicação do Código de Processo Civil ‘no que couber’. A utilização desse termo indica que a aplicação da lei adjetiva somente se dará quando a lei especial não regular o tema e com ela não for incompatível”, ressaltou.

Recuperação judicial

Em seu voto, o relator destacou que as questões interlocutórias proferidas durante o processamento da recuperação judicial e da falência – não enquadradas nos incisos do artigo 1.015 do CPC – não poderão ser revistas em eventual apelação, conforme estabelece o artigo 1.009, parágrafo 1°, do CPC.

Segundo Villas Bôas Cueva, as sentenças previstas na LFRE são as que encerram a recuperação judicial (artigo 63), decretam a falência (artigo 99), julgam improcedente o pedido de falência (artigo 100), julgam as contas do administrador (artigo 154, parágrafo 4°), encerram a falência e extinguem as obrigações (artigos 154 e 156). A primeira é objeto de agravo de instrumento, enquanto as demais são proferidas em fases processuais nas quais os atos de recuperação e falência já produziram efeitos.

“Observa-se, portanto, que na forma como a LFRE está estruturada, é necessário que as decisões interlocutórias sejam decididas desde logo. A recuperação judicial não é um processo em que há uma sucessão ordenada de atos que termina na sentença. Na realidade, a recuperação judicial busca coordenar o interesse dos credores e do devedor, a partir da realização de diversos atos paralelos, que ao final serão alinhados para possibilitar a votação do plano e sua eventual aprovação ou a decretação da quebra. Assim, questões surgidas nas fases postulatória e deliberativa não podem aguardar a sentença de encerramento”, ressaltou.

O ministro concluiu que as disposições do parágrafo único do artigo 1.015 do CPC devem ser interpretadas ampliativamente, “englobando a recuperação judicial e a falência, que, na parte recursal, em tudo se assemelham aos casos ali descritos, de modo que seja possível a interposição de agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias proferidas durante sua tramitação”.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.786.524 - SE (2018/0330542-8)
RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
RECORRENTE : OSVALDO SILVA DO BOMFIM
REPR. POR : MARILENE SILVA DO BOMFIM
RECORRENTE : KLEVERSON EDUARDO DE JESUS PRADO
ADVOGADO : EPAMINONDAS TOURINHO DE MORAES NETO - SE005914
RECORRIDO : VIAÇÃO PROGRESSO LTDA
ADVOGADOS : PATRÍCIA MACHADO DIDONE - BA016528
FLAVIA ORSINI DE CASTRO MACIEIRA - SE000478B
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. EMPRESARIAL. LEI DE
RECUPERAÇÃO JUDICIAL E FALÊNCIA. SISTEMA RECURSAL PRÓPRIO.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. APLICAÇÃO SUPLETIVA. DECISÕES
INTERLOCUTÓRIAS. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CABIMENTO.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código
de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. Cinge-se a controvérsia a definir se é cabível a interposição de agravo de
instrumento contra decisão proferida após a sentença de habilitação de crédito,
para a qual a LREF não prevê recurso específico.
3. A Lei nº 11.101/2005 tem normas de direito material e processual, instituindo
um regime recursal próprio. Esse regramento não é exaustivo, prevendo a lei a
aplicação supletiva do Código de Processo Civil quando for cabível.
4. Nas hipóteses em que a lei especial apontar o recurso próprio, esse é o que
deve ser utilizado, somente se cogitando da incidência das normas adjetivas se
não houver previsão expressa do remédio aplicável.
5. As questões interlocutórias proferidas durante o processamento da
recuperação judicial e da falência (e que não se enquadram nos incisos do artigo
1.015 do CPC/2015) não terão oportunidade de revisão em eventual apelação,
como prevê o art. 1.009, § 1º, do CPC/2015.
6. Na forma como a Lei de Recuperação de Empresas e Falência está
estruturada, é necessário que as decisões interlocutórias sejam decididas desde
logo. A recuperação judicial não é um processo em que há uma sucessão
ordenada de atos que termina na sentença. A recuperação judicial busca
coordenar o interesse dos credores e do devedor, a partir da realização de
diversos atos paralelos, que ao final serão alinhados para possibilitar a votação
do plano e sua eventual aprovação ou a decretação da quebra. As questões
surgidas nas fases postulatória e deliberativa não podem aguardar a sentença de
encerramento.
7. O legislador elencou outras situações em que, como no caso da recuperação
judicial e falência, não será possível a revisão de questões interlocutórias em
futura apelação, admitindo sua impugnação por agravo de instrumento, norma
que deve ser aplicada por interpretação extensiva aos processos de recuperação
e falência.
8. Recurso especial conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a
Terceira Turma, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do
Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro (Presidente), Nancy

Andrighi e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 23 de abril de 2019(Data do Julgamento)
Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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