STJ aplica desconsideração da personalidade jurídica para permitir defesa de sócio em execução fiscal

STJ aplica desconsideração da personalidade jurídica para permitir defesa de sócio em execução fiscal

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que é necessária a instauração do Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica (IDPJ) – previsto pelo artigo 133 do Código de Processo Civil de 2015 – quando há o redirecionamento da execução fiscal a pessoa jurídica que integra o mesmo grupo econômico da sociedade originalmente executada, mas que não foi identificada no ato de lançamento (na Certidão de Dívida Ativa) ou que não se enquadra nas hipóteses dos artigos 134 e 135 do Código Tributário Nacional (CTN).

De acordo com o colegiado – conforme prevê o artigo 50 do Código Civil –, para haver o redirecionamento da execução, é necessária a comprovação do abuso de personalidade, caracterizado por desvio de finalidade ou confusão patrimonial.

Com base nesse entendimento, os ministros, por unanimidade, cassaram acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) que havia concluído pela solidariedade das pessoas jurídicas e dispensado a instauração do incidente.

Na decisão, a turma aplicou o IDPJ para permitir a defesa de um dos sócios do grupo econômico executado, mas manteve a possibilidade de a Fazenda Nacional executar o sócio ou a empresa do mesmo grupo econômico por meio da aplicação do CTN – que prevê o chamado redirecionamento e não exige defesa prévia.

Cobrança

O caso é inédito no STJ e envolve recurso de uma sociedade empresária, incluída em cobrança de outra empresa do mesmo grupo econômico. O valor da execução fiscal proposta pela União alcança cerca de R$ 108 milhões.

A empresa recorrente (contra a qual foi redirecionada a execução) pediu a revisão da decisão do TRF4, requerendo a instauração do IDPJ para apresentar sua defesa e poder questionar a desconsideração. Alegou que apenas a existência de grupo econômico não autorizaria o redirecionamento da execução.

O TRF4 negou o recurso da sociedade e reconheceu a responsabilidade solidária de outras pessoas jurídicas na execução promovida pela Fazenda Nacional, por comporem as empresas um mesmo grupo econômico.

Sócios

A Primeira Turma ressalvou que o IDPJ não pode ser instaurado no processo executivo fiscal nos casos em que a Fazenda pretenda alcançar pessoa jurídica distinta daquela contra a qual originalmente foi ajuizada a execução, mas cujo nome conste da CDA ou, mesmo o nome não estando no título executivo, o fisco demonstre sua responsabilidade, na qualidade de terceiro, em consonância com os artigos134 e 135 do CTN.

“Sem a indicação da pessoa jurídica no ato de lançamento, ou sendo inexistentes as hipóteses dos artigos 134 e 135 do CTN, a imputação da responsabilidade ao grupo econômico ou à pessoa jurídica dele integrante dependerá da desconsideração da personalidade jurídica, cujo reconhecimento somente pode ser obtido com a instauração do referido incidente”, explicou o relator do recurso especial, ministro Gurgel de Faria.

Segundo ele, o artigo 134 do CPC/2015 estabelece que o incidente de desconsideração é cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial.

Todavia, segundo o ministro, no parágrafo 2º do artigo 134, o CPC dispensa "a instauração do incidente se a desconsideração da personalidade jurídica for requerida na petição inicial, hipótese em que será citado o sócio ou a pessoa jurídica".

Jurisprudência

Citando a jurisprudência da corte, o relator destacou que o CTN, em seu artigo 134, autoriza o redirecionamento da execução fiscal aos sócios quando não for possível exigir o crédito tributário da sociedade empresária liquidada, sem desconsiderar a personalidade da pessoa jurídica devedora, pois a legislação estabelece previamente a responsabilidade tributária do terceiro e permite a cobrança do crédito tributário.

“Caso o pedido de redirecionamento da execução fiscal mire pessoas jurídicas não elencadas na Certidão de Dívida Ativa, após a comprovação, pela Fazenda, da caracterização de hipótese legal de responsabilização dos terceiros indicados, o magistrado também pode decidir pela inclusão no polo passivo sem a instauração do incidente de desconsideração, pois a responsabilização de terceiros tratada no Código Tributário Nacional não necessita da desconsideração da pessoa jurídica devedora”, observou.

Responsabilidade

De acordo com Gurgel de Faria, com exceção de previsão prévia expressa em lei sobre a responsabilidade de terceiros e do abuso de personalidade jurídica, o fato de integrar grupo econômico não torna uma pessoa jurídica responsável pelos tributos não pagos pelas outras.

Ao decidir aplicar o IDPJ ao caso em análise, o relator explicou que “o redirecionamento de execução fiscal a pessoa jurídica que integra o mesmo grupo econômico da sociedade empresária originalmente executada, mas que não foi identificada no ato de lançamento (nome na CDA) ou que não se enquadra nas hipóteses dos artigos 134 e 135 do CTN, depende da comprovação do abuso de personalidade, caracterizado pelo desvio de finalidade ou confusão patrimonial, tal como consta do artigo 50 do Código Civil – daí porque, nesse caso, é necessária a instauração do incidente de desconsideração da personalidade da pessoa jurídica devedora”, disse.

O ministro destacou ainda que a atribuição de responsabilidade tributária aos sócios-gerentes, nos termos do artigo 135 do CTN, não depende do IDPJ previsto no artigo 133 do CPC/2015, pois a responsabilidade dos sócios é atribuída pela própria lei, de forma pessoal e subjetiva, na hipótese de “atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos”.

Ao dar provimento ao recurso, a turma determinou o retorno dos autos ao TRF4 para que ordene a instauração do IDPJ no caso antes de decidir a pretensão da Fazenda Nacional.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.775.269 - PR (2018/0280905-9)
RELATOR : MINISTRO GURGEL DE FARIA
RECORRENTE : AGROINDUSTRIAL IRMAOS DALLA COSTA LTDA.
ADVOGADOS : MARCIO RODRIGO FRIZZO E OUTRO(S) - PR033150
RODRIGO LAFFITTE E OUTRO(S) - PR065979
RECORRIDO : FAZENDA NACIONAL
INTERES. : ORIGINAL INDUSTRIA COMERCIO NEGOCIOS E
PARTICIPACOES LTDA
INTERES. : PALMALI AGROINDUSTRIAL LTDA
INTERES. : PALMALI INDUSTRIAL DE ALIMENTOS LTDA
INTERES. : DALLA COSTA TRANSPORTES DE CARGAS RODOVIARIAS
LTDA
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL.
REDIRECIONAMENTO A PESSOA JURÍDICA. GRUPO
ECONÔMICO "DE FATO". INCIDENTE DE
DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. CASO
CONCRETO. NECESSIDADE.
1. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica (art. 133 do
CPC/2015) não se instaura no processo executivo fiscal nos casos em
que a Fazenda exequente pretende alcançar pessoa jurídica distinta
daquela contra a qual, originalmente, foi ajuizada a execução, mas cujo
nome consta na Certidão de Dívida Ativa, após regular procedimento
administrativo, ou, mesmo o nome não estando no título executivo, o fisco
demonstre a responsabilidade, na qualidade de terceiro, em consonância
com os artigos 134 e 135 do CTN.
2. Às exceções da prévia previsão em lei sobre a responsabilidade de
terceiros e do abuso de personalidade jurídica, o só fato de integrar
grupo econômico não torna uma pessoa jurídica responsável pelos
tributos inadimplidos pelas outras.
3. O redirecionamento de execução fiscal a pessoa jurídica que integra o
mesmo grupo econômico da sociedade empresária originalmente
executada, mas que não foi identificada no ato de lançamento (nome na
CDA) ou que não se enquadra nas hipóteses dos arts. 134 e 135 do
CTN, depende da comprovação do abuso de personalidade,
caracterizado pelo desvio de finalidade ou confusão patrimonial, tal como
consta do art. 50 do Código Civil, daí porque, nesse caso, é necessária a
instauração do incidente de desconsideração da personalidade da pessoa
jurídica devedora.
4. Hipótese em que o TRF4, na vigência do CPC/2015, preocupou-se em
aferir os elementos que entendeu necessários à caracterização, de fato,
do grupo econômico e, entendendo presentes, concluiu pela solidariedade
das pessoas jurídicas, fazendo menção à legislação trabalhista e à Lei n.
8.212/1991, dispensando a instauração do incidente, por compreendê-lo
incabível nas execuções fiscais, decisão que merece ser cassada.
5. Recurso especial da sociedade empresária provido.

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por
unanimidade, dar provimento ao recurso especial, para cassar o acórdão recorrido e determinar o
retorno dos autos ao Tribunal de origem para que ordene a instauração do incidente de
desconsideração da personalidade da pessoa jurídica antes de decidir a pretensão atinente ao
redirecionamento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Napoleão Nunes
Maia Filho, Benedito Gonçalves, Sérgio Kukina e Regina Helena Costa (Presidente) votaram
com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 21 de fevereiro de 2019 (Data do julgamento).
MINISTRO GURGEL DE FARIA
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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