Cabe à Justiça castrense julgar crime de militar contra patrimônio militar anterior à Lei 13.491

Cabe à Justiça castrense julgar crime de militar contra patrimônio militar anterior à Lei 13.491

A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a Justiça castrense é competente para processar e julgar crime praticado por militar em atividade contra patrimônio sob a administração militar antes do advento da Lei 13.491/17.

O conflito negativo de competência foi suscitado pela 1ª Circunscrição Judiciária Militar do Rio de Janeiro após a 4ª Vara Federal Criminal do estado, diante da nova redação dada ao Código Penal Militar, declinar da competência para julgar um comandante acusado de contratar, sem licitação, a empresa que realizaria obras em unidade do Exército.

O juízo suscitante entendeu que, pelo princípio da irretroatividade da lei penal, havendo modificação em regra própria do direito material, a aplicação a fatos anteriores à sua vigência somente é possível quando a nova lei introduz mudanças favoráveis à situação do réu.

Segundo a relatora do conflito, ministra Laurita Vaz, a nova redação alterou a própria definição de crime militar, “o que permite identificar a natureza material do regramento, mas também ampliou, por via reflexa, de modo substancial, a competência da Justiça Militar, o que constitui matéria de natureza processual”.

Caráter híbrido

Em seu voto, a ministra explicou que, como a lei pode ter caráter híbrido em temas relativos ao aspecto penal, a aplicação para fatos praticados antes de sua vigência somente será cabível em benefício do réu, conforme o disposto no artigo 2º, parágrafo 1º, do Código Penal Militar e no artigo 5º, inciso XL, da Constituição.

“Por sua vez, no que concerne às questões de índole puramente processual – hipótese dos autos –, o novo regramento terá aplicação imediata, em observância ao princípio do tempus regit actum”, disse.

Segundo ela, o mesmo entendimento foi adotado pelo STJ no Conflito de Competência 29.026, ao examinar a mudança de competência promovida pela Lei 9.299/96, a qual alterou o Código Penal Militar e o Código de Processo Penal Militar, em que também se decidiu pela aplicabilidade imediata do regramento, hipótese semelhante ao caso em discussão.

A relatora ainda disse que a Lei 13.491/17 promoveu alteração da competência em razão da matéria e, dessa forma, não tem aplicação a regra da perpetuatio jurisdictionis, prevista noartigo 43 do Código de Processo Civil e de emprego subsidiário no processo penal.

“Por conseguinte, os inquéritos e processos que tramitam na Justiça comum devem ser imediatamente remetidos à Justiça Militar, salvo se, à época da vigência da nova lei, já houver sido proferida sentença de mérito”, informou.

Assim, a ministra entendeu que, por tratar a situação dos autos de competência absoluta em razão da matéria, não tendo sido proferida sentença de mérito, não se aplica a regra da perpetuação da jurisdição, devendo ser remetidos os autos à Justiça Militar, à qual caberá o processo e julgamento do feito.

CONFLITO DE COMPETÊNCIA Nº 160.902 - RJ (2018/0238712-4)
RELATORA : MINISTRA LAURITA VAZ
SUSCITANTE : JUÍZO AUDITOR DA 4A AUDITORIA DA 1A CIRCUNSCRIÇÃO
JUDICIÁRIA MILITAR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
SUSCITADO : JUÍZO FEDERAL DA 4A VARA CRIMINAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA
DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
INTERES. : EDUARDO XAVIER FERREIRA GLASER MIGON
INTERES. : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
EMENTA
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. PENAL E
PROCESSUAL PENAL. CRIME CONTRA A LEI DE LICITAÇÕES
PRATICADO POR MILITAR EM SITUAÇÃO DE ATIVIDADE CONTRA
PATRIMÔNIO SOB A ADMINISTRAÇÃO MILITAR. SUPERVENIÊNCIA
DA LEI N.º 13.491/2017. AMPLIAÇÃO DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA
CASTRENSE. APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO. PRINCÍPIO DO
TEMPUS REGIT ACTUM. SENTENÇA DE MÉRITO NÃO PROFERIDA.
NÃO APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA PERPETUATIO JURISDICTIONIS. CONFLITO CONHECIDO PARA DECLARAR COMPETENTE O JUÍZO
SUSCITANTE.
1. Hipótese em que a controvérsia apresentada cinge-se à definição do
Juízo competente para processar e julgar crime praticado, em tese, por militar em
situação de atividade contra patrimônio sob a administração militar antes do
advento da Lei n.º 13.491/2017.
2. A Lei n.º 13.491/2017 promoveu alteração na própria definição de
crime militar, o que permite identificar a natureza material do regramento, mas
também ampliou, por via reflexa, de modo substancial, a competência da Justiça
Militar, o que constitui matéria de natureza processual. É importante registrar que,
como a lei pode ter caráter híbrido em temas relativos ao aspecto penal, a
aplicação para fatos praticados antes de sua vigência somente será cabível em
benefício do réu, conforme o disposto no art. 2.º, § 1.º, do Código Penal Militar e
no art. 5.º, inciso XL, da Constituição da República. Por sua vez, no que concerne
às questões de índole puramente processual – hipótese dos autos –, o novo
regramento terá aplicação imediata, em observância ao princípio do tempus regit
actum. 3. Tratando-se de competência absoluta em razão da matéria e
considerando que ainda não foi proferida sentença de mérito, não se aplica a
regra da perpetuação da jurisdição, prevista no art. 43 do Código de Processo
Civil, aplicada subsidiariamente ao processo penal, de modo que os autos devem
ser remetidos para a Justiça Militar.
4. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo Auditor da 4.ª
Auditoria da 1.ª Circunscrição Judiciária Militar do Estado do Rio de Janeiro, ora
Suscitante.
ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a
seguir, por unanimidade, conhecer do conflito e declarar competente o suscitante, Juízo Auditor
da 4.ª Auditoria da 1.ª Circunscrição Judiciária Militar do Estado do Rio de Janeiro, nos termos do
voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Jorge Mussi, Sebastião Reis Júnior, Nefi
Cordeiro, Reynaldo Soares da Fonseca, Ribeiro Dantas, Antonio Saldanha Palheiro, Joel Ilan
Paciornik e Felix Fischer votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Rogerio Schietti Cruz.
Brasília (DF), 12 de dezembro de 2018 (Data do Julgamento)
MINISTRA LAURITA VAZ
Relatora

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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