Data de ajuizamento define qual das ações de inventário e partilha idênticas deve prosseguir

Data de ajuizamento define qual das ações de inventário e partilha idênticas deve prosseguir

Na hipótese de existência de ações de inventário e partilha idênticas, propostas por diferentes partes legítimas, a data de ajuizamento é o critério mais preciso e seguro para a definição sobre qual delas deverá permanecer em trâmite. A adoção da data de nomeação do inventariante como marco de definição da litispendência, além de não ter respaldo legal, configura baliza insegura, inclusive porque está sujeita a atos que não dependem das partes, mas do próprio Poder Judiciário.

O entendimento foi adotado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que, ao decidir a prevenção entre duas ações de inventário idênticas, optou pela data mais antiga de nomeação do inventariante como critério de definição.

Após o falecimento de sua mãe, a recorrente propôs ação de inventário e partilha em fevereiro de 2016. Posteriormente, verificou-se que a irmã dela também havia ingressado com processo idêntico, tendo sido nomeada como inventariante em março do mesmo ano.

Em virtude da existência da outra ação, a sentença extinguiu o processo sem resolução de mérito. Segundo o juiz, ainda que a ação analisada tenha sido proposta primeiro, deveria prevalecer como marco temporal para definição da litispendência a data da nomeação do inventariante – que, no caso, ocorreu primeiro no outro processo.

A sentença foi mantida pelo TJMG. Para o tribunal, numa ação de inventário, que é procedimento de jurisdição voluntária, não há a citação da parte contrária, mas apenas o chamamento dos herdeiros para se manifestarem sobre as primeiras declarações. Por isso, segundo o TJMG, o juízo que proceder primeiro à nomeação do inventariante deveria ser considerado prevento para processar e julgar a ação.

Natureza contenciosa

Relatora do recurso especial, a ministra Nancy Andrighi observou que a legitimidade para a propositura de ação de inventário tem características peculiares, por ser ao mesmo tempo concorrente – porque admite propositura por qualquer das partes elencadas nos artigos 615 e 616 do CPC/2015 – e disjuntiva – porque o exercício do direito de ação por um dos legitimados automaticamente excluiu a possibilidade de exercício pelos demais colegitimados, que passarão a ocupar o polo processual oposto ao do autor.

Nesse sentido, Nancy Andrighi destacou que, ao contrário do que apontou o TJMG, esse tipo de processo não é procedimento de jurisdição voluntária, inclusive em razão do frequente litígio entre os herdeiros. Por isso, tendo natureza contenciosa, o processo está submetido às regras que disciplinam o momento de propositura da ação, prevenção e caracterização de litispendência.

De acordo com o artigo 59 do CPC/2015, o registro ou a distribuição da petição inicial torna prevento o juízo. Para a ministra, a adoção de outro marco, a exemplo da data de nomeação da inventariante, não tem previsão legal e, como está sujeita a ato do Judiciário, atrai a regra do artigo 240 do CPC, segundo a qual a parte não será prejudicada por demora imputável exclusivamente ao serviço judiciário.  

“Na hipótese, tendo sido a ação de inventário ajuizada pelo recorrente anterior à mesma ação ajuizada pela recorrida, deve permanecer em tramitação aquela que foi primeiramente proposta, marco que possui amparo legal e que, ademais, é o mais preciso e seguro para a definição acerca de qual ação deverá permanecer em curso após o reconhecimento da litispendência”, concluiu a ministra ao reformar o acórdão do TJMG.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.739.872 - MG (2018/0109094-0)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : FABIO AUGUSTO FERREIRA CLEMENTINO DA SILVA
ADVOGADOS : MARTINA GATTI GRUPPIONI CORTES ZENOBIO - MG118389
ADRIANO CAMPOS CALDEIRA - MG055141N
INTERES. : VIRGINIA ALICE FERREIRA CLEMENTINO DA SILVA
ADVOGADOS : MARIA TEOMAR DA COSTA OLIVEIRA LOPES E OUTRO(S) - MG075135
JANAINA CRISTINE PINTO DINIZ - MG115713
INTERES. : MARIA DAS DORES FERREIRA CLEMENTINO - ESPÓLIO
EMENTA
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INVENTÁRIO E PARTILHA. PREJUÍZO
CAUSADO PELO SERVIÇO JUDICIÁRIO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO.
SÚMULA 211/STJ. ARGUMENTAÇÃO RECURSAL DISSOCIADA DA QUESTÃO
DECIDIDA. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. SÚMULA 284/STF.
LITISPENDÊNCIA ENTRE AÇÕES DE INVENTÁRIO E PARTILHA PROPOSTAS POR
DIFERENTES COLEGITIMADOS. TRÍPLICE IDENTIDADE CONFIGURADA, AINDA
QUE AS PARTES OCUPEM POLOS DISTINTOS. LEGITIMIDADE CONCORRENTE
E DISJUNTIVA. AÇÃO DE NATUREZA CONTENCIOSA E PROCESSADA SOB RITO
ESPECIAL. OBSERVÂNCIA DAS REGRAS CONTIDAS NA PARTE GERAL DO
CPC/15. CRITÉRIO TEMPORAL PARA DEFINIÇÃO SOBRE QUAL AÇÃO
LITISPENDENTE DEVE PROSSEGUIR. DATA DE NOMEAÇÃO DO
INVENTARIANTE. IMPOSSIBILIDADE. INSEGURANÇA JURÍDICA E AUSÊNCIA DE
PREVISÃO LEGAL. DEFINIÇÃO A PARTIR DA DATA DA PROPOSITURA DA
AÇÃO. OBSERVÂNCIA DOS ARTS. 59 E 312 DO CPC/15. DIVERGÊNCIA
JURISPRUDENCIAL PREJUDICADA.
1- Ação proposta em 17/02/2016. Recurso especial interposto em
21/11/2017 e atribuído à Relatora em 11/05/2018.
2- O propósito recursal é definir o critério a ser utilizado para decidir qual
processo judicial deverá permanecer em trâmite na hipótese em que há
litispendência decorrente do ajuizamento, por diferentes colegitimados, de
mais de uma ação de inventário e partilha de bens do mesmo de cujus. 3- Não se conhece do recurso especial que se funda em prejuízo imputável
ao serviço judiciário na hipótese em que o acórdão recorrido não examinou
a questão federal relacionada ao art. 240, §3º, do CPC/15, mesmo após a
oposição de embargos de declaração, mas não tendo a parte alegado
violação aos arts. 1.022 e 1.025 do CPC/15. Súmula 211/STJ. Precedentes.
4- É deficiente a fundamentação recursal em que se alega desrespeito à
ordem de nomeação do inventariante prevista no art. 617 do CPC/15 quando
o acórdão recorrido indica que essa matéria deverá ser examinada na ação
de inventário e partilha remanescente. Súmula 284/STF.

5- Há litispendência entre duas ações de inventário e partilha ajuizadas por
distintos colegitimados quando presente a tríplice identidade – mesmas
partes, mesmas causas de pedir e mesmos pedidos –, sendo irrelevante o
fato de as partes ocuparem polos processuais contrapostos nas duas ações
em virtude da legitimação concorrente e disjuntiva para o ajuizamento da
ação.
6- A ação de inventário e de partilha de bens é de natureza contenciosa e se
submete a procedimento especial regulado pelo próprio CPC/15, de modo
que a ela se aplicam às regras relacionadas ao momento de propositura da
ação, à prevenção e à litispendência e que se encontram na parte geral do
Código.
7- A data da nomeação do inventariante não pode ser elemento temporal
definidor acerca de qual ação litispendente deve seguir em tramitação, seja
porque inexiste previsão legal nesse sentido, seja porque se trata de marco
temporal inseguro, porque vinculado à movimentações e atos processuais
que independem exclusivamente das partes, devendo ser fixado, como
marco definidor acerca de qual das ações idênticas deve prosseguir, a data
de seu registro ou distribuição, nos termos dos arts. 59 e 312, ambos do
CPC/15.
8- Fica prejudicado o exame do recurso especial fundado em divergência
jurisprudencial quando a pretensão é acolhida com base na violação da lei
federal.
9- Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido,
ficando prejudicado o agravo interno interposto na TP/1442, em que se
pretendia a concessão de efeito suspensivo ao recurso especial.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer em parte do recurso
especial e, nesta parte, dar-lhe provimento ficando prejudicado o agravo interno
interposto na TP/1442, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs.
Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva e Moura Ribeiro votaram
com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Marco Aurélio
Bellizze.
Brasília (DF), 13 de novembro de 2018(Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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