STJ rejeita pretensão do Ecad de cobrar direitos autorais por shows de Roberto Carlos em navio

STJ rejeita pretensão do Ecad de cobrar direitos autorais por shows de Roberto Carlos em navio

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento a recurso por meio do qual o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) cobrava direitos autorais decorrentes de apresentações do cantor Roberto Carlos no cruzeiro "Emoções em Alto Mar", realizado em 2010 em um navio de bandeira italiana.

As instâncias ordinárias julgaram a ação improcedente ao fundamento de que competia ao Ecad comprovar que os shows ocorreram dentro dos limites marítimos brasileiros, já que o navio era estrangeiro. Esse entendimento foi ratificado no STJ.

Ônus da prova

No recurso ao STJ, o Ecad afirmou que a prova era tecnicamente impossível, visto que os planos de navegação e outros documentos indicadores do trajeto efetivamente percorrido se encontrariam em poder exclusivo dos réus. Sob esse argumento, o Ecad solicitou a inversão do ônus da prova, sustentando que caberia aos responsáveis pelo cruzeiro demonstrar, em sua defesa, que o navio se encontrava em águas internacionais.

Segundo o relator do caso, ministro Villas Bôas Cueva, a mera dificuldade de comprovar que o navio estava em mar territorial brasileiro não justifica a inversão do ônus da prova, visto que o autor da ação dispõe de meios legalmente admitidos para demonstrar o fato constitutivo de seu direito, tais como a requisição de documentos em poder dos réus, a oitiva de testemunhas, a realização de fiscalização presencial ou de perícia técnica.

Limites da jurisdição

“Sendo incontroverso que as apresentações do cantor Roberto Carlos aconteceram em navio estrangeiro, só seria viável acolher a pretensão do Ecad caso comprovado que os fatos geradores ocorreram dentro das divisas marítimas brasileiras, mais especificamente no mar territorial, haja vista os limites espaciais da jurisdição, da legislação e da própria soberania nacional”, disse o ministro.

Villas Bôas Cueva destacou que não há dúvidas a respeito da ocorrência do evento em si, o que não foi comprovado é se ocorreu ou não no Brasil. Ele destacou que não houve sequer pedido de produção de provas, pois o próprio Ecad requereu o julgamento antecipado da demanda.

“Acolher a tese do recorrente equivaleria a atribuir à referida entidade, por vias transversas, o poder de demandar a contrapartida por direitos autorais de toda e qualquer embarcação estrangeira, dentro ou fora dos limites marítimos brasileiros, criando uma espécie de inversão de ônus da prova sem previsão legal, nem proporcionalidade, e que poderia, em última análise, implicar ofensa a compromissos assumidos pelo Brasil no âmbito internacional”, fundamentou o relator ao negar provimento ao recurso.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.561.671 - SP (2015/0070627-1)
RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
RECORRENTE : ESCRITÓRIO CENTRAL DE ARRECADAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO ECAD
ADVOGADOS : KARINA HELENA CALLAI E OUTRO(S) - DF011620
RODRIGO KOPKE SALINAS - SP146814
LEO WOJDYSLAWSKI E OUTRO(S) - SP206971
RECORRIDO : COSTA CRUZEIROS AGÊNCIA MARÍTIMA E TURISMO LTDA
RECORRIDO : RENÊ HERMANN
ADVOGADO : JOSÉ RUBENS DE MACEDO SOARES SOBRINHO E OUTRO(S) - SP070893
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DIREITOS AUTORAIS.
NULIDADE DO ACÓRDÃO RECORRIDO. AUSÊNCIA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO
JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. ECAD. CRUZEIRO MARÍTIMO.
APRESENTAÇÃO MUSICAL. LIMITES TERRITORIAIS. ÔNUS DA PROVA. FATO
CONSTITUTIVO. ATRIBUIÇÃO DO AUTOR. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL.
REQUISITOS. NÃO PREENCHIMENTO.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código
de Processo Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. Cinge-se a controvérsia a saber (i) se houve negativa de prestação
jurisdicional, (ii) se é devida a cobrança de direitos autorais decorrentes da
execução pública de obras musicais em navio estrangeiro durante cruzeiro
marítimo no litoral brasileiro e (iii) de quem é o ônus da prova dos fatos.
3. No caso concreto, o ECAD objetiva o recebimento dos direitos autorais
decorrentes de apresentações do cantor Roberto Carlos promovidas em navio de
bandeira italiana durante cruzeiro turístico.
4. A pretensão de recebimento dos direitos autorais exige a comprovação de que
o fato gerador ocorreu dentro dos limites territoriais marítimos brasileiros.
5. Enquanto transitem no mar territorial, os navios estão sujeitos, em principio, à
jurisdição do Estado costeiro, por força das normas de Direito Internacional,
notadamente a Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar - CNUDM III
ou UNCLOS -, ratificada pelo Brasil e regulamentada pela Lei nº 8.617/1993. Em
alto-mar, a regra é a subordinação dos navios à jurisdição do Estado de sua
bandeira.
6. A realização do show dentro do território nacional é circunstância fática que
configura atributo constitutivo do próprio direito pleiteado, além de condição para
pleno exercício da jurisdição brasileira, motivo pelo qual o ônus da prova incumbe
ao autor, nos termos do art. 333, inciso I, do CPC/1973.
7. A mera dificuldade de obtenção da prova não justifica a inversão da carga
probatória, visto que o autor pode dispor de meios legalmente admitidos para
comprovar o fato constitutivo de seu direito, tais como a requisição de
documentos em poder dos réus, a oitiva de testemunhas, a realização de
fiscalização presencial ou de perícia técnica.
8. Na hipótese em que o julgamento antecipado da lide ocorre a pedido do autor,
com expressa dispensa de dilação probatória, não lhe é lícito alegar
posteriormente a negativa de prestação jurisdicional, inclusive por força da
preclusão lógica.
9. É manifestamente inadimissível o recurso especial fundado em divergência
jurisprudencial quando não demonstrada a similitude fática entre os arestos
confrontados mediante o devido cotejo analítico, nos parâmetros legais e

regimentais. Incidência da Súmula nº 13/STJ no que se refere a paradigma
proferido pelo mesmo Tribunal de origem.
10. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a
Terceira Turma, por unanimidade, conhecer em parte do recurso especial e, nesta parte,
negar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Marco
Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro (Presidente), Nancy Andrighi e Paulo de Tarso Sanseverino
votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 02 de outubro de 2018(Data do Julgamento)
Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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