Ação de reintegração em cargo público por ex-preso político é imprescritível

Ação de reintegração em cargo público por ex-preso político é imprescritível

Para a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), são imprescritíveis as ações de reintegração em cargo público movidas por ex-presos políticos que sofreram perseguição durante o regime militar brasileiro, ficando, contudo, eventuais efeitos retroativos sujeitos à prescrição quinquenal.

Com base nesse entendimento, o colegiado decidiu, por unanimidade, prover recurso especial de ex-servidor da Assembleia Legislativa do Paraná contra decisão do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR). O autor da ação buscava sua reintegração ao cargo anteriormente ocupado sob a alegação de que seu desligamento ocorreu em razão de perseguição política na época da ditadura.

“O retorno ao serviço público, nessa perspectiva, corresponde à reparação intimamente ligada ao princípio da dignidade humana, porquanto o trabalho representa uma das expressões mais relevantes do ser humano, sem o qual o indivíduo é privado do exercício amplo dos demais direitos constitucionalmente garantidos”, afirmou a relatora, ministra Regina Helena Costa.

Anistiado

Ao determinar o retorno dos autos para nova apreciação do TJPR – que havia afastado a imprescritibilidade do direito, ao fundamento de que o servidor não havia sido declarado anistiado pela Comissão de Anistia –, a ministra Regina Helena considerou fato novo, já que o autor da ação foi reconhecido como anistiado político pelo Ministério da Justiça em março de 2018.

“A Constituição da República não prevê lapso prescricional para o exercício do direito de agir quando se trata de defender o direito inalienável à dignidade humana, sobretudo quando violados durante o período do regime de exceção”, frisou.

A relatora explicou que o STJ tem entendimento de que é imprescritível a reparação de danos, material ou moral, “decorrentes de violação de direitos fundamentais perpetrada durante o regime militar, período de supressão das liberdades públicas”.

Regra

A ministra afirmou que a prescrição representa a regra, devendo o seu afastamento apoiar-se em previsão legal. Todavia, segundo ela, a Primeira Seção do STJ reconhece que o direito ao pedido de reparação de danos patrimoniais decorrentes da prática de tortura também está protegido pela imprescritibilidade, independentemente de estar expresso ou não em texto legal.

“Com efeito, esta corte orienta-se no sentido de reconhecer a imprescritibilidade da reparação de danos, moral e/ou material, decorrentes de violação de direitos fundamentais perpetrada durante o regime militar, período de supressão das liberdades públicas”, ressaltou.

Efeitos patrimoniais

A relatora ressaltou ainda que a imprescritibilidade da ação que visa a reparar danos provocados pelos atos de exceção não implica o afastamento da prescrição quinquenal sobre as parcelas eventualmente devidas ao ex-preso político.

Isso porque, segundo ela, “não se deve confundir imprescritibilidade da ação de reintegração com imprescritibilidade dos efeitos patrimoniais e funcionais dela decorrentes, sob pena de prestigiar a inércia do autor, o qual poderia ter buscado seu direito desde a publicação da Constituição da República”.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.565.166 - PR (2015/0280295-9)
RELATORA : MINISTRA REGINA HELENA COSTA
RECORRENTE : JOSÉ MARCOS DE ALMEIDA FORMIGHIERI
ADVOGADO : AURACYR AZEVEDO DE MOURA CORDEIRO E
OUTRO(S) - PR005133
ADVOGADA : ANA PAULA SWIECH - PR043737
RECORRIDO : ESTADO DO PARANÁ
PROCURADOR : EUNICE FUMAGALLI MARTINS E SCHEER E OUTRO(S) - PR010501
RECORRIDO : ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO PARANÁ
ADVOGADOS : ROGÉRIO DISTEFANO - PR004952
EMANUEL DE ANDRADE BARBOSA - PR033069
EMENTA
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO
CIVIL DE 1973. APLICABILIDADE. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL.
PRETENSÃO DE REINTEGRAÇÃO AO CARGO PÚBLICO, CUJO
AFASTAMENTO FOI MOTIVADO POR PERSEGUIÇÃO POLÍTICA.
VIOLAÇÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS. PRISÃO E TORTURA
PERPETRADOS DURANTE O REGIME MILITAR.
IMPRESCRITIBILIDADE DA AÇÃO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
I – Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada
em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da
publicação do provimento jurisdicional impugnado. Assim sendo, in casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 1973.
II – Trata-se, na origem, de ação ordinária proposta por ex-servidor da
Assembleia Legislativa do Paraná buscando sua reintegração ao cargo
anteriormente ocupado, além dos efeitos financeiros e funcionais, com
fundamento no art. 8º do ADCT e na Lei n. 10.559/02, sob a alegação de
que seu desligamento ocorreu em razão de perseguição política,
perpetrada na época da ditadura militar.
III – A Constituição da República não prevê lapso prescricional ao direito
de agir quando se trata de defender o direito inalienável à dignidade
humana, sobretudo quando violada durante o período do regime de
exceção.
IV – Este Superior Tribunal de Justiça orienta-se no sentido de ser
imprescritível a reparação de danos, material e/ou moral, decorrentes de
violação de direitos fundamentais perpetrada durante o regime militar,
período de supressão das liberdades públicas.
V – A 1ª Seção desta Corte, ao julgar EREsp 816.209/RJ, de Relatoria da
Ministra Eliana Calmon, afastou expressamente a tese de que a
imprescritibilidade, nesse tipo de ação, alcançaria apenas os pleitos por
dano moral, invocando exatamente a natureza fundamental do direito
protegido para estender a imprescritibilidade também às ações por danos
patrimoniais, o que deve ocorrer, do mesmo modo, em relação aos
pleitos de reintegração a cargo público.
VI – O retorno ao serviço público, nessa perspectiva, corresponde a
reparação intimamente ligada ao princípio da dignidade humana,

porquanto o trabalho representa uma das expressões mais relevantes do
ser humano, sem o qual o indivíduo é privado do exercício amplo dos
demais direitos constitucionalmente garantidos.
VII – A imprescritibilidade da ação que visa reparar danos provocados
pelos atos de exceção não implica no afastamento da prescrição
quinquenal sobre as parcelas eventualmente devidas ao Autor. Não se
deve confundir imprescritibilidade da ação de reintegração com
imprescritibilidade dos efeitos patrimoniais e funcionais dela decorrentes,
sob pena de prestigiar a inércia do Autor, o qual poderia ter buscado seu
direito desde a publicação da Constituição da República.
VIII – Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da
Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos
votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, dar provimento ao
recurso especial, para, afastada a prescrição, nos termos da fundamentação,
determinar o retorno dos autos ao tribunal de origem para que prossiga no
julgamento da demanda, como entender de direito, nos termos do voto da Sra.
Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Gurgel de Faria, Napoleão Nunes Maia
Filho, Benedito Gonçalves e Sérgio Kukina votaram com a Sra. Ministra
Relatora.
Assistiu ao julgamento o Dr. ARNALDO VERSIANI LEITE
SOARES, pela parte RECORRENTE: JOSÉ MARCOS DE ALMEIDA
FORMIGHIERI.
Brasília (DF), 26 de junho de 2018(Data do Julgamento)
MINISTRA REGINA HELENA COSTA
Relatora

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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