Suspensa aplicação de falta grave que não foi objeto de procedimento administrativo disciplinar

Suspensa aplicação de falta grave que não foi objeto de procedimento administrativo disciplinar

Para o reconhecimento da prática de falta disciplinar no âmbito da execução penal, é imprescindível a instauração de procedimento administrativo disciplinar pelo diretor do estabelecimento prisional, assegurado o direito de defesa ao apenado por meio de advogado ou defensor público.

A jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça (STJ) foi aplicada pelo vice-presidente da corte, ministro Humberto Martins, no exercício da presidência, ao deferir pedido liminar e suspender a aplicação dos efeitos de decisão de um juízo de execuções penais do Paraná que, sem a instauração de PAD, determinou a regressão definitiva do regime semiaberto para o fechado, em virtude do cometimento de falta grave.

Após a decisão do magistrado de primeiro grau, a defesa do apenado apresentou recurso ao Tribunal de Justiça do Paraná, porém o tribunal manteve a regressão do regime por considerar que a realização da audiência de justificação, com a oitiva do condenado acompanhado pela defesa, teria suprido a não instauração do procedimento administrativo disciplinar.

Por esse motivo, a corte paraense entendeu que não houve a violação dos princípios constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa.

O ministro Humberto Martins lembrou que, em 2013, ao julgar recurso especial repetitivo, a Terceira Seção fixou entendimento no sentido da imprescindibilidade do processo administrativo disciplinar para o reconhecimento de falta disciplinar de natureza grave. Posteriormente, em 2015, o STJ editou a Súmula 533, cujo enunciado também confirma a necessidade do PAD nos casos de falta disciplinar no âmbito da execução penal.

O mérito do habeas corpus ainda será analisado pela Sexta Turma, sob relatoria do ministro Nefi Cordeiro.

HABEAS CORPUS Nº 459.330 - PR (2018/0173975-5)

RELATOR : MINISTRO NEFI CORDEIRO
IMPETRANTE : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO PARANÁ
ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO PARANÁ
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ
PACIENTE : CLAUDEMIR RIBEIRO DE OLIVEIRA

DECISÃO
Vistos.
Cuida-se de habeas corpus substitutivo de recurso especial, com
pedido de liminar, impetrado em favor de CLAUDEMIR RIBEIRO DE
OLIVEIRA contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná assim
ementado (fls. 7-8, e-STJ):
"RECURSO DE AGRAVO – EXECUÇÃO PENAL – REGIME
SEMIABERTO COM MONITORAÇÃO ELETRÔNICA –
DESCUMPRIMENTO DAS CONDIÇÕES IMPOSTAS – FALTA
GRAVE HOMOLOGADA – INSTAURAÇÃO DE
PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR –
DESNECESSIDADE – AUDIÊNCIA DE JUSTIFICAÇÃO
REALIZADA – CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA
ASSEGURADOS – AGRAVO DESPROVIDO.
A realização da audiência de justificação, com a ouvida do
condenado assistido pela defesa técnica, supre a não instauração
do Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD) porque se
atinge sua principal finalidade, razão pela qual não há que se falar
em inobservância dos preceitos constitucionais do devido processo
legal, do contraditório e da ampla defesa (artigo 5º, incisos LIV e
LV, da Constituição da República)."
Consta dos autos que o juízo das execuções penais determinou a
regressão definitiva de regime do semiaberto para o fechado, em razão do
cometimento de falta grave.
O Tribunal de origem negou provimento ao recurso de agravo em
execução, mantendo a decisão de regressão para o regime fechado.
No presente writ, o impetrante requer, liminarmente, o
afastamento do reconhecimento de falta grave por ausência de processo
administrativo disciplinar, com oportuna ratificação meritória.
É, no essencial, o relatório.
A concessão da tutela de emergência, em juízo de cognição sumária
e singular, exige a demonstração concomitante, e em grau bastante satisfatório,
da plausibilidade do direito arguido e do perigo na demora. Com efeito, o
Tribunal de origem, ao afastar a preliminar de nulidade por ausência de
procedimento administrativo disciplinar, decidiu sob os seguintes fundamentos
(fls. 9-11, e-STJ):
"Diversamente do sustentado pelo agravante inexiste a
aventada nulidade, porquanto a ouvida do condenado na audiência
de justificação na presença do seu defensor e do Ministério
Público, supre possível nulidade decorrente da ausência de
instauração do Procedimento
Administrativo Disciplinar (PAD) para apurar a prática de
falta grave durante o cumprimento da pena privativa de liberdade.
Nesse sentido, ainda que o Superior Tribunal de Justiça haja
fixado o entendimento por meio da Súmula nº 533/STJ de que
“Para o reconhecimento da prática de falta disciplinar no âmbito
da execução penal, é imprescindível a instauração de procedimento
administrativo pelo diretor do estabelecimento prisional,
assegurado o direto de defesa, a ser realizado por advogado
constituído ou defensor público nomeado”, no caso dos autos a
situação concreta não se enquadra na hipótese porque não se trata
de infração disciplinar cometida dentro do estabelecimento
prisional, ou seja, infração às normas disciplinares do sistema
penitenciário, mas fora dele, pois o agravante cumpria pena no
regime semiaberto harmonizado, tendo descumprido
reiteradamente as condições impostas no sistema de monitoração
eletrônica (execução penal, mov. 287.1).
Desse modo, não se evidencia violação de qualquer direito de
defesa, pois ao agravante foram assegurados o pleno exercício do
contraditório e da ampla defesa porque ouvido pessoalmente em
audiência de justificação (execução penal, mov. 320.2), tendo-se
inclusive oportunizado a manifestação da defesa técnica, que se
limitou a requerer a instauração de Procedimento Administrativo
Disciplinar (execução penal, mov. 336.1)."
Contudo, a Terceira Seção desta Corte, ao julgar, em 23/10/2013, o
REsp n. 1.378.557/RS, representativo de controvérsia, Rel. Ministro MARCO
AURÉLIO BELLIZZE, fixou entendimento no sentido da imprescindibilidade do
processo administrativo disciplinar, cuja ementa é a que se segue:
"RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. EXECUÇÃO PENAL. 1. RECONHECIMENTO
DE FALTA GRAVE. IMPRESCINDIBILIDADE DE
INSTAURAÇÃO DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO
DISCIPLINAR (PAD). DETERMINAÇÃO EXPRESSA DO ART. 59
DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL. PODER DISCIPLINAR.
ATRIBUIÇÃO DO DIRETOR DO PRESÍDIO (LEP, ARTS. 47 E
48). DIREITO DE DEFESA A SER EXERCIDO POR ADVOGADO
CONSTITUÍDO OU DEFENSOR PÚBLICO NOMEADO.
OBSERVÂNCIA DA GARANTIA DO DEVIDO PROCESSO
LEGAL, DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO. 2.
RECURSO NÃO PROVIDO.
1. Para o reconhecimento da prática de falta disciplinar, no
âmbito da execução penal, é imprescindível a instauração de
procedimento administrativo pelo diretor do estabelecimento
prisional, assegurado o direito de defesa, a ser realizado por
advogado constituído ou defensor público nomeado.
2. Recurso especial não provido." (REsp 1378557/RS, Rel.
Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA SEÇÃO,
julgado em 23/10/2013, DJe 21/03/2014)
Nesse sentido, confiram-se, ainda, os seguintes julgados:
"EXECUÇÃO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO
DE RECURSO PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA.
DESCUMPRIMENTO DE CONDIÇÕES DO REGIME ABERTO.
FALTA GRAVE. OBRIGATORIEDADE DE INSTAURAÇÃO
DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR.
RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA.
RESP N. 1.378.557/RS. SÚMULA N. 533 DO STJ. WRIT NÃO
CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. [...] 3.
Segundo diretriz jurisprudencial consagrada por este Tribunal, o
descumprimento de condições do regime aberto constitui falta
disciplinar de natureza grave. 4. Por outro lado, esta Superior
Corte de Justiça consolidou entendimento no sentido de que o
reconhecimento de falta disciplinar de natureza grave somente é
possível com a devida instauração de procedimento administrativo
disciplinar pelo diretor do presídio. Precedentes. 5. Habeas corpus
não conhecido. Contudo, ordem concedida de ofício para cassar o
acórdão prolatado pela Corte de origem e, em consequência,
declarar a impossibilidade de reconhecimento da referida falta
grave sem a instauração de PAD." (HC 414.459/DF, Rel. Ministro
REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA,
julgado em 10/10/2017, DJe de 20/10/2017; sem grifo no original.)
"HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO
PRÓPRIO. DESCABIMENTO. EXECUÇÃO. FALTA GRAVE.
PRÉVIA INSTAURAÇÃO DE PROCEDIMENTO
ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR - PAD.
IMPRESCINDIBILIDADE. RESP N. 1.378.557/RS
REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. SÚMULA N. 533 DO
STJ. VIOLAÇÃO AO DEVIDO PROCESSO LEGAL.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. WRIT NÃO
CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. 1. Diante da
hipótese de habeas corpus substitutivo de recurso próprio, a
impetração não deve ser conhecida, segundo orientação
jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal - STF e do próprio
Superior Tribunal de Justiça - STJ. Contudo, considerando as
alegações expostas na inicial, razoável a análise do feito para
verificar a existência de eventual constrangimento ilegal. 2. O STJ,
apreciando recurso representativo da controvérsia - REsp.
1.378.557/RS -, pacificou o entendimento no sentido da
imprescindibilidade da instauração, pelo Diretor do
estabelecimento prisional, de Procedimento Administrativo
Disciplinar - PAD para a apuração e reconhecimento da falta
grave. Inteligência da Súmula n. 533/STJ. Ademais, a
imprescindibilidade do PAD não nasceu com a edição do
enunciado sumular, pois o Resp 1.378.557/RS foi julgado em
23/10/2013 e, conforme o entendimento desta Corte Superior,
"antes da edição do enunciado sumular 533, já apregoava a
necessidade de se garantir, na execução penal, a ampla defesa do
sentenciado" (HC 385.486/SC, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE
ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 09/03/2017, DJe
16/03/2017). 3. A oitiva do preso em audiência de justificação não
torna desnecessário o procedimento administrativo para a
apuração de falta grave. Habeas corpus não conhecido. Ordem
concedida, de ofício, para afastar o reconhecimento da falta grave
e seus consectários legais, sem prejuízo de que nova apuração seja
levada a efeito, após prévia instauração de Procedimento
Administrativo Disciplinar, observando-se a jurisprudência desta
Corte." (HC 395.329/SC, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK,
QUINTA TURMA, julgado em 22/08/2017, DJe de 04/09/2017;
sem grifo no original.)
Tal orientação foi consolidada no seguinte verbete sumular desta
Corte: "Para o reconhecimento da prática de falta disciplinar no âmbito da
execução penal, é imprescindível a instauração de procedimento administrativo
pelo diretor do estabelecimento prisional, assegurado o direito de defesa, a ser
realizado por advogado constituído ou defensor público nomeado." (Súmula n.º
533, Terceira Seção, DJe 15/06/2015.)
Ante o exposto, DEFIRO o pedido liminar para suspender os
efeitos da decisão que reconheceu a falta grave, até o julgamento do presente
writ.
Oficie-se ao Juízo das Execuções e ao Tribunal de Justiça do
Paraná, encaminhando-se-lhes cópia da presente decisão.
Solicitem-se informações pormenorizadas ao Tribunal a quo.
Após, remetam-se os autos ao Ministério Público Federal.
Publique-se. Intimem-se.

Brasília (DF), 17 de julho de 2018.
MINISTRO HUMBERTO MARTINS
Vice-Presidente, no exercício da Presidência

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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