STJ nega habeas corpus de Eduardo Cunha para suspender ação penal
O ministro Humberto Martins, vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no exercício da Presidência, indeferiu o pedido liminar em habeas corpus impetrado pela defesa do ex-deputado Eduardo Cunha para que ação penal instaurada contra ele fosse suspensa.
O ex-deputado foi denunciado pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Segundo a defesa, após a abertura de prazo para a manifestação das partes na fase do artigo 402 do CPC, o juízo de primeiro grau indeferiu os 48 pedidos de diligências formulados por ela e encaminhou os autos para alegações finais ministeriais.
A defesa de Cunha sustentou que “muito além de requisição de documentos citados pela decisão de primeiro grau, foram requeridas as oitivas de várias pessoas cuja necessidade surgiu ao longo dos depoimentos prestados; quebras de sigilos bancário e fiscal de algumas pessoas, especialmente delatores; perícia grafotécnica em documentos que foram trazidos aos autos durante a instrução pela defesa do delator/acusado Lúcio Funaro, atribuindo-se ao paciente a suposta assinatura dos mesmos; acareação entre pessoas que prestaram depoimentos claramente contraditórios durante a instrução”.
Assim, a decisão do juízo de primeiro grau teria violado o dever jurídico de motivação das decisões judiciais, uma vez não ter analisado “qualquer dos requerimentos, parecendo [...] um recorta/cola padrão que se presta a qualquer requerimento de tão evasiva e sem fundamentos que é”.
Ausência de ilegalidade
Em sua decisão, o ministro Humberto Martins afirma não ter verificado nenhuma ilegalidade que autorize a superação da Súmula 691 do Supremo Tribunal Federal.
Segundo Martins, o juízo de primeiro grau consignou a desnecessidade das diligências requeridas, sob o argumento de que a própria defesa pode providenciar a apresentação dos documentos requeridos, sem a necessidade de intervenção judicial. Por sua vez, a decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, que indeferiu a liminar, declarou a inexistência de vício no ato impugnado.
“Em exame perfunctório, não constato nas decisões supracitadas ofensa ao entendimento consagrado na jurisprudência desta Corte superior, no sentido de que ‘o deferimento de diligências é ato que se inclui na esfera de discricionariedade regrada do juiz natural do processo, com opção de indeferi-las, motivadamente, quando julgar que são protelatórias ou desnecessárias e sem pertinência com a sua instrução’”, afirmou o ministro.
Além disso, Humberto Martins destacou que o TRF1 não realizou o julgamento de mérito da questão, reservando-se, assim, primeiramente àquele órgão a apreciação da matéria desse habeas corpus, “sendo defeso ao STJ adiantar-se nesse exame, sobrepujando a competência da Corte a quo, mormente se o writ está sendo regularmente processado”.
O vice-presidente solicitou informações pormenorizadas ao TRF1 e, após, determinou a remessa dos autos ao Ministério Público Federal para parecer.
O mérito do habeas corpus será julgado pela Sexta Turma, sob a relatoria do ministro Rogerio Schietti Cruz.
HABEAS CORPUS Nº 434.426 - DF (2018/0016282-1)
RELATOR : MINISTRO ROGERIO SCHIETTI CRUZ
IMPETRANTE : DELIO FORTES LINS E SILVA JUNIOR E OUTROS
ADVOGADOS : DÉLIO FORTES LINS E SILVA - DF003439
DÉLIO FORTES LINS E SILVA JÚNIOR - DF016649
LARISSA LOPES BEZERRA - DF044550
IMPETRADO : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1A REGIÃO
PACIENTE : EDUARDO COSENTINO DA CUNHA
DECISÃO
Vistos.
Cuida-se de habeas corpus, com pedido de medida liminar,
impetrado em favor de EDUARDO COSENTINO DA CUNHA contra decisão
monocrática de Desembargador Federal do Tribunal Regional Federal da 1ª
Região, que indeferiu pedido liminar suscitado nos autos do HC nº 1000307-
39.2018.4.01.000 (fls. 159-163, e-STJ).
Consta dos autos que o paciente foi denunciado perante a 10ª Vara
Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal (Ação Penal nº 60203-
83.2016.4.01.3400) como incurso nos arts. 317, por dezoito vezes, 319, por uma
vez, 325, por treze vezes, c.c. os arts. 29, 30, 69 e 327, § 2º, todos do Código
Penal, e no art. 1º, § 4º, da Lei nº 9.613/1998, por trezentas e vinte e uma vezes.
Narram os impetrantes, em síntese, que, após a abertura de prazo
para a manifestação das partes na fase do art. 402 do Código de Processo Penal, o
Juízo de primeiro grau de jurisdição indeferiu os quarenta e oito pedidos de
diligências formulados pela defesa do paciente e encaminhou os autos para
alegações finais ministeriais.
Salientam, no ponto, que "muito além de requisição de documentos
citadas pela decisão de primeiro grau, foram requeridas as OITIVAS de várias
pessoas cuja necessidade surgiu ao longo dos depoimentos prestados;
QUEBRAS DE SIGILOS BANCÁRIO E FISCAL de algumas pessoas,
especialmente delatores; PERÍCIA GRAFOTÉCNICA em documentos que foram
trazidos aos autos durante a instrução pela defesa do delator/acusado Lúcio
Funaro, atribuindo-se ao paciente a suposta assinatura nos mesmos;
ACAREAÇÃO entre pessoas que prestaram depoimentos claramente
contraditórios durante a instrução" (fl.15, e-STJ).
Argumentam, nesses termos, que a decisão proferida pelo Juízo
processante violou o dever jurídico de motivação das decisões judiciais, haja
vista não ter analisado "qualquer dos requerimentos, parecendo [...] um
recorta/cola padrão que se presta a qualquer requerimento de tão evasiva e sem
fundamentos que é" (fl. 16, e-STJ).
Pede, liminarmente, que seja determinada a imediata suspensão do
andamento da ação penal (fl. 19, e-STJ).
É, no essencial, o relatório.
Inicialmente, cumpre ressaltar que, consoante o posicionamento
aplicado pelos Tribunais Superiores, não se admite habeas corpus contra decisão
negativa de liminar proferida em outro writ na instância de origem, sob pena de
indevida supressão de instância, o que tem inclinado o Supremo Tribunal Federal
a nem sequer conhecer da impetração, a teor da Súmula 691: "Não compete ao
Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão
do Relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a
liminar".
No entanto, a despeito do óbice processual, têm entendido as Cortes
Superiores que, nesses casos excepcionais, deve preponderar a necessidade de
garantir a efetividade da prestação da tutela jurisdicional de urgência, a fim de
preservar o direito à liberdade, tarefa a ser desempenhada caso a caso.
Todavia, esse atalho processual não pode ser ordinariamente usado,
senão em situações em que se evidenciar decisão absolutamente teratológica e
desprovida de qualquer razoabilidade, na medida em que força o pronunciamento
adiantado da Instância Superior, suprimindo a competência da Inferior,
subvertendo a regular ordem do processo.
No caso, não verifico ilegalidade patente a autorizar a mitigação da
Súmula 691 do Supremo Tribunal Federal.
O Juízo de primeiro grau de jurisdição consignou a desnecessidade
das diligências requeridasm "uma vez que a própria defesa pode providenciar a
apresentação dos documentos requeridos, sem a necessidade de intervenção
judicial" (fl. 140, e-STJ).
Por sua vez, a decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região
que indeferiu a liminar declarou a inexistência vício no ato impugnado, nos
seguintes termos (fls. 161-163, e-STJ):
"Em exame perfunctório inerente ao atual momento
processual, não se pode afirmar o constrangimento ilegal sofrido
pela paciente. A presente impetração, ao meu sentir, não logrou
demonstrar a existência de circunstância a caracterizar o fumus
boni iuris, o que impossibilita a concessão da medida liminar
requerida.
Nesse diapasão, a pretendida medida excepcional por meio de
liminar em sede de habeas corpus somente se justifica quando, de
plano, evidenciar-se o dano irreparável a ser suportado pela ora
paciente, o que não restou atendido na impetração, pelo que não
se pode atestar o constrangimento ilegal alegado.
Demais disso, tenho que decisão ora impugnada não está
eivada de ilegalidade ou teratologia de modo a propiciar
excepcional reforma em sede mandamental. Ao contrário, reputo
o decisum devidamente fundamentado, em estrita consonância com
os postulados constitucionais de garantia da ampla defesa e
contraditório.
[...]
Por oportuno, transcrevo excertos da decisão proferida pelo
magistrado presidente do feito principal, na qual indeferiu os
pedidos formulados em prol do paciente e repisados no presente
writ, in verbis: "Indefiro o pedido de perícia grafotécnica
formulado pelo MPF (item I - fls. 4970), por não se tratar de
diligência cuja necessidade tenha surgido durante a instrução
criminal, tendo havido motivação suficiente sobre a sua influência
direta nas questões debatidas.
Indefiro, os pedidos de diligências formulados por
EDUARDO CONSENTINO DA CUNHA (requisição de
documentos etc - fls. 5189), uma vez que a própria defesa pode
providenciar a apresentação dos documentos requeridos, sem a
necessidade da intervenção judiciar (fl. 137-doe. n. 1514143).
Com efeito, não confiro relevância às alegações contidas na
presente impetração, sobretudo, porque não identifico no decisum
acima reproduzido, qualquer traço de ilegalidade ou teratolgia,
razão pela qual, não vejo motivos para não prestigiá-la em sua
totalidade."
Em exame perfunctório, não constato nas decisões supracitadas
ofensa ao entendimento consagrado na jurisprudência desta Corte Superior, no
sentido de que "o deferimento de diligências é ato que se inclui na esfera de
discricionariedade regrada do juiz natural do processo, com opção de indeferilas,
motivadamente, quando julgar que são protelatórias ou desnecessárias e
sem pertinência com a sua instrução'" (REsp 1.520.203/SP, Sexta Turma, Rel.
Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 1º/10/2015).
De modo mais aproximado ao presente caso, confira-se o seguinte
julgado:
"RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS.
PROCESSUAL PENAL. ART. 168-A, § 1º, INCISO I, DO CÓDIGO
PENAL. INDEFERIMENTO DOS PEDIDOS DA DEFESA, NA
FASE DO ART. 402 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL.
ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA. INEXISTÊNCIA.
DILIGÊNCIAS INDEFERIDAS DE FORMA MOTIVADA PELO
JUÍZO PROCESSANTE. RECURSO DESPROVIDO.
1. O Magistrado condutor da ação penal pode indeferir,
desde que em decisão devidamente fundamentada, as diligências
que entender protelatórias ou desnecessárias, dentro de um juízo
de conveniência, que é próprio do seu regular poder discricionário.
2. No caso, o Juiz do feito, nos exatos termos do art. 402 do
Código de Processo Penal, refutou fundamentadamente os
pedidos de diligências complementares, porque os considerou
protelatórios. Ressaltou o Magistrado que a documentação que se
pretendia juntar era irrelevante ao desfecho do processo e poderia
ser facilmente obtida pelo Advogado constituído do réu,
mostrando-se desnecessária a intervenção judicial para a
produção das provas.
3. Não se afigura demonstrado, assim, o alegado
constrangimento ilegal por cerceamento de defesa, sobretudo na
augusta via do habeas corpus, inadequada para a análise da
pertinência, ou não, das diligências requeridas e indeferidas no
curso da ação penal.
Precedentes.
4. Recurso desprovido." (RHC 33.155/SC, Rel. Ministra
LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 22/10/2013, DJe
5/11/2013 – grifei.)
Destaque-se que, não havendo notícia de que o TRF da 1ª Região
tenha procedido ao exame meritório, reserva-se primeiramente àquele órgão a
apreciação da matéria ventilada no habeas corpus originário, sendo defeso ao
Superior Tribunal de Justiça adiantar-se nesse exame, sobrepujando a
competência da Corte a quo, mormente se o writ está sendo regularmente
processado.
Nesse diapasão, os seguintes precedentes: AgRg no HC
305.277/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, QUINTA TURMA, DJe de
27/11/2014; AgRg no HC 238.461/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA
TURMA, DJe de 23/10/2012.
Ante o exposto, INDEFIRO o pedido de liminar.
Solicitem-se informações pormenorizadas ao TRF da 1ª Região.
Após, remetam-se os autos ao Ministério Público Federal para
emitir parecer.
Publique-se. Intimem-se.
Brasília (DF), 26 de janeiro de 2018.