Tanatofobia, ortotanásia, Senado Federal e o Conselho Federal de Medicina
Desde os tempos mais antigos o ser humano pugna por entender a morte e, não obstante, ainda hoje ela é, ao menos em parte, um mistério. E, por não ser conhecida, como é natural, ela causa medo – daí o nome tanatofobia.Existem concepções opostas sobre ela expendidas por materialistas e...
Desde os tempos mais antigos o ser humano pugna por entender a morte e, não obstante, ainda hoje ela é, ao menos em parte, um mistério. E, por não ser conhecida, como é natural, ela causa medo – daí o nome tanatofobia.
Existem concepções opostas sobre ela expendidas por materialistas e espiritualistas. Em geral sustentam estes que ela é transformação, enquanto aqueles, que é o fim. Valho-me, para ilustração, da expressão do poeta brasileiro Augusto dos Anjos: “Morte, ponto final da última cena”.
Desse modo, vamos nos encontrar no século XXI a discutir sobre a viabilidade da ortotanásia e, por conseqüência, da longa discussão entre conceitos de vida e morte. Com efeito, ortotanásia é, na concepção atual médica, a morte natural, sem intervenção médica, sem o prolongamento por meio da tecnologia. Importante frisar que ortotanásia é diferente de eutanásia, que é a antecipação da morte natural, normalmente por piedade, através de procedimento médico.
Por serem estas (vida e morte) considerações filosóficas e científicas que me fogem à capacidade, caminho rápido para o Projeto de Lei do Senado nº 116 de 2000, que visa a legalizar a ortotanásia, modificando, para tanto, o Código Penal.
Conforme Notícia da Agência Senado os especialistas, nas audiência públicas, até agora, apoiam a legalização da ortotanásia “Representantes de médicos, juristas, estudiosos de bioética e da CNBB são unânimes na defesa da legitimidade de se evitar a prorrogação artificial da vida de pacientes terminais.” A matéria, na fase de debates públicos, tramita na Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal.
Oportuno lembrar que o Conselho Federal de Medicina já tem resolução (1.805/2006) sobre a matéria, que está suspensa por liminar, nos autos da Ação Civil Pública n. 2007.34.00.014809-3, da 14ª Vara Federal, movida pelo Ministério Público Federal.
Diz a resolução 1.805/2006: “Art. 1º É permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente em fase terminal, de enfermidade grave e incurável, respeitada a vontade da pessoa ou de seu representante legal. § 1º O médico tem a obrigação de esclarecer ao doente ou a seu representante legal as modalidades terapêuticas adequadas para cada situação. § 2º A decisão referida no caput deve ser fundamentada e registrada no prontuário. § 3º É assegurado ao doente ou a seu representante legal o direito de solicitar uma segunda opinião médica. Art. 2º O doente continuará a receber todos os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, assegurada a assistência integral, o conforto físico, psíquico, social e espiritual, inclusive assegurando-lhe o direito da alta hospitalar.”
E na exposição de motivos da mencionada resolução verifica-se que “Aprendemos muito sobre tecnologia de ponta e pouco sobre o significado ético da vida e da morte” … “torna-se importante que a sociedade tome conhecimento de que certas decisões terapêuticas poderão apenas prolongar o sofrimento do ser humano até o momento de sua morte, sendo imprescindível que médicos, enfermos e familiares, que possuem diferentes interpretações e percepções morais de uma mesma situação, venham a debater sobre a terminalidade humana e sobre o processo do morrer.”
Esse tema, muito complexo, deve ser discutido com cuidado e seriedade, ou seja, sem açodamento. Porquanto, algum dia, acharemos a resposta sobre a vida e a morte, se é que já não a temos. Valho-me, novamente, da poesia de Augusto dos Anjos, para finalizar: “Venho de outras eras, do cosmopolitismo das moneras...pólipo de recônditas reentrâncias, larva de caos telúrico, procedo da escuridão do cósmico segredo, da substância de todas as substâncias!”