Impossibilidade de danos morais à pessoas jurídicas

Impossibilidade de danos morais à pessoas jurídicas

Artigo sobre a possibilidade de pessoas jurídicas serem passíveis de reparação moral.

P ode-se definir dano moral como lesão de um bem integrante da personalidade, tal como a honra, a liberdade, a integridade física e psicológica, causando a vítima transtornos e tormentas capazes de gerar abalos em sua esfera íntima e proporcionar situações vexaminosas perante a outrem.

De acordo com o entendimento jurisprudencial, corroborado por nossa atual Carta Magna, o instituto do dano moral estende-se a todos os bens personalíssimos. Inclusive, por tal razão, o Direito Lusitano o denomina de dano imaterial, dada à inviabilidade de uma precisa avaliação pecuniária. Por isso, o dano moral pode apenas ser compensado com a imposição de obrigação pecuniária ao causador do dano, de natureza muito mais satisfativa do que indenizatória.

Daí advêm a magistral definição de dano moral proposta por Savatier em seu "Traité de Responsabilité Civile", volume II:

"qualquer sofrimento que não é causado por uma perda pecuniária".

Seguindo os ensinamentos dos portentosos juristas Brinz, Keller, Pothier e Chironi, entendemos que toda lesão moral somente é passível de indenização quando da ocorrência de lesão patrimonial. A repercussão de uma lesão fatalmente desemboca na patrimonialidade da perda, atingindo assim o conceito de dano material indireto.

No que tange então a possibilidade de pessoa jurídica ser apta a suportar lesão de ordem moral, tanto a doutrina quando a jurisprudência já vem admitindo que realmente todo dano moral tem respaldo legal quando da inferência de extensão ao patrimônio do ofendido. Ademais, dada à natureza personalíssima do dano moral que se desenvolve através da afronta a dignidade, ao decoro e a honra, a pessoa jurídica mostra-se como um sujeito de direito livre de lesões desta natureza.

Nesta seara, pode-se destacar o entendimento unânime da 14a Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que definitivamente esclareceu a impossibilidade de lesão moral a pessoa jurídica:

"Direitos Autorais. Contrafação. Danos reparáveis. A contrafação de obra intelectual sujeita o falsificador a reparar os danosa que deu causa, inclusive os de natureza moral. Todavia, não se pode cogitar destes últimos, quando a vítima é pessoa jurídica, a qual, não se confundindo com os seus sócios, não é suscetível de sofrer danos morais ou constrangimentos. Recursos improvidos." (Relator Desembargador Marlan Marinho)

Quanto a brilhante teoria de Sérgio Cavalieri, de que pessoa jurídica é detentora de honra objetiva, data máxima vênia, permitimo-nos discordar pelo simples fato que este dano somente seria indenizável como repercussão de perda pecuniária. A reputação, a imagem e o bom nome de uma pessoa jurídica somente serão indenizáveis quando acarretarem alguma perda de credibilidade empresarial, ou seja, quando os consumidores deixarem de procurar pelos serviços oferecidos por esta. E isto nada mais é do que perda pecuniária, simbolizando dano material e não moral.

Saliente-se por oportuno o entendimento proferido pela 4a Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, ao manifestar-se contrária à adoção do Instituto do dano moral a pessoa jurídica:

"Indenização. Rito Ordinário. Dano moral de pessoa jurídica. Impossibilidade em se tratando de pessoa jurídica. A pessoa jurídica não pode ser titular de honra subjetiva, exclusiva do ser humano, mas só objetiva e, desta forma não há como ser sujeito passivo de dano de ordem moral, mas só material. Inaceitável a tese de dano moral objetivo de pessoa jurídica, já que se constitui em um tertius genus de dano (dano material, dano moral de pessoa física e dano objetivo de pessoa jurídica). Negado Provimento." (Relator Desembargador Sidney Hartung)

"Dano moral de pessoa jurídica. Impossibilidade em se tratando de pessoa jurídica. A pessoa jurídica não pode ser titular de honra subjetiva, exclusiva do ser humano, mas só objetiva e, desta forma não há como ser sujeito passivo de dano de ordem moral, mas só material. Inaceitável a tese de dano moral objetivo de pessoa jurídica, já que se constitui em "contradicto in adjeto". (Relator Desembargador Reinaldo P. Alberto Filho)

"Ação de dano moral ajuizada por sociedade de advogados em face de Banco. Concessão de indenização por dano moral a pessoa jurídica. Impossibilidade. Dano moral é dano psicológico pessoal. Pessoas Jurídicas não possuem sistema nervoso nem psique." (Relator Desembargador Luiz Eduardo Rabello)

É de curial importância demonstrar que não se pode estender às pessoas jurídicas certas reações exclusivamente inerentes aos seres humanos. A evolução jurídica não tem o condão de prestigiar condutas anormais, nem tampouco instituir ficções para privilegiar o enriquecimento sem causa. Não é lícito atribuir aos entes de direito características que não lhe são inerentes.

No caminho da melhor doutrina, a jurisprudência mais moderna vem se posicionando contra a atividade de conferir a pessoas jurídicas determinadas exclusivamente características humanas. Assim manifestou-se de maneira unânime a 5a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro:

"Ação de Indenização, pelo rompimento de contrato de prestação de serviços, sem cumprimento do prazo relativo ao aviso prévio, estabelecido contratualmente. Inexiste cerceamento de defesa quando o Juiz não defere provas desnecessárias ao deslinde da causa. A verba indenizatória deve se circunscrever aos limites do prejuízo, não se podendo concede-la além dos danos ocasionados. O que se busca, com o ressarcimento, é restabelecer o credor na posição que teria, se o devedor houvesse cumprido obrigação. A pessoa jurídica não pode ser sujeito passivo de dano moral. O elemento característico do dano moral é a dor em sentido amplo, abrangendo todos os sofrimentos físicos ou morais, só é possível de ser verificado nas pessoas físicas. O ataque injusto ao conceito de pessoa jurídica só é de ser reparado na medida em que ocasiona prejuízo de ordem material." (Relator Desembargador Miguel Pachá)

Novamente o Desembargador Miguel Pachá, agora em sede de Embargos Infringentes, nos ensina que a pessoa jurídica não é passível de dano moral:

"Embargos Infringentes. A pessoa jurídica não pode ser sujeito passivo de dano moral. O elemento característico do dano moral é a dor em sentido mais amplo, abrangendo todos os sofrimentos físicos ou morais, só possível de ser verificada nas pessoas físicas. O ataque injusto ao conceito da pessoa jurídica só é de ser reparada na medida em que ocasiona prejuízo de ordem patrimonial." (IV Grupo de Câmaras – Decisão Unânime)

Neste diapasão, pronunciou-se com veemência a 12a Câmara Cível, que por maioria espancou a notável tese da honra objetiva, defendida pelos juristas que entendem que a pessoa jurídica é passível de dano moral:

"Dano moral. Pessoa jurídica. Impossibilidade. A pessoa jurídica, por não ser titular de honra subjetiva, não pode ser sujeito passivo de dano de ordem moral." (Relator Desembargador Sérgio Lucio Cruz)

Por fim, devem ser colacionados os recentes julgados do vanguardista Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul a respeito da impossibilidade de pessoa jurídica ser passível de danos morais:

"Ação declaratória de nulidade de titulo cambial. Sustação de protesto. Indenização por dano moral. Pessoa jurídica. Impossibilidade. Cheque devolvido sem provisão de fundos. Pagamento, em tese, realizado para o representante da requerida, sem a exigência de recibo. Nao-comprovação de quitação da divida. Dano moral de pessoa jurídica inexistente. A pessoa jurídica não pode ser considerada como agente passivo de dano moral, uma vez que não e atingida em seu direito subjetivo, requisito da pessoa física. Apelação desprovida." (Apelação cível nº 598321172, 6a Câmara Cível, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Relator: Desembargador João Pedro Pires Freire, julgado em 27/10/99)

"Dano moral. Pessoa jurídica. Impossibilidade. Só a pessoa humana pode experimentar a dor psicológica, não cabendo dano moral para pessoa jurídica." (Apelação Cível nº 598448488, 12a Câmara Cível, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Relator: Desembargador Cézar Tasso Gomes, julgado em 26/08/99).

Sobre o(a) autor(a)
Hugo Filardi
Estudante de Direito
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