Possibilidade de o companheiro ser nomeado inventariante

Possibilidade de o companheiro ser nomeado inventariante

A Lei nº 12.195, de 14 de Janeiro de 2010 trouxe para o Código de Processo Civil alterações no artigo 990, mais precisamente nos incisos I e II, reconhecendo ao companheiro o direito de também ser nomeado inventariante.

1. INTRODUÇÃO

A Lei nº 12.195, de 14 de Janeiro de 2010 trouxe para o Código de Processo Civil alterações no artigo 990, mais precisamente nos incisos I e II, reconhecendo ao companheiro o direito de também ser nomeado inventariante.

O presente trabalho se propõe a apresentar um breve estudo sobre a Lei nº 12.195 de 2010, o artigo 990 do Código de Processo Civil e comentários jurisprudenciais relacionados ao tema.

2. COMENTÁRIOS À INOVAÇÃO TRAZIDA AO ARTIGO 990 DO CÓDIGO DE PRCESSO CIVIL

Essa lei foi publicada em 14 de Janeiro de 2010, em que altera o artigo 990, incisos I e II do Código de Processo Civil, dando ao companheiro de união estável sobrevivente o mesmo direito que possui o cônjuge supérstite, no tocante a nomeação do inventariante.

Trata-se de uma lei bastante atual, mas ao mesmo tempo ela se torna antiga, pois somente após doze anos de existência da Constituição Federal de 1988 houve a modificação, no Código de Processo Civil, de um instituto há muito tempo reconhecido na Carta Magna.

Artigo 909 do Código de Processo Civil:

Art. 990.  ............................................... 

I - o cônjuge ou companheiro sobrevivente, desde que estivesse convivendo com o outro ao tempo da morte deste; 

II - o herdeiro que se achar na posse e administração do espólio, se não houver cônjuge ou companheiro sobrevivente ou estes não puderem ser nomeados;

Esse dispositivo veio legitimar situações existentes há muito tempo no Direito Pátrio, visto que o Código Civil de 2002 e a Constituição Federal de 1988 reconhecem a união estável como entidade familiar, fazendo com que o companheiro tenha os mesmos direitos que o cônjuge.

O reconhecimento da união estável está disciplinado nos artigos 226, §3º da Constituição Federal de 1988 e 1723 do Código Civil:

Art.226, §3º - Para efeito de proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo à lei facilitar sua conversão em casamento.

Art. 1.723 – É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição da família.

Os artigos 1.790 e 1.797 do Código Civil de 2002 já previam a sucessão de bens adquiridos na união estável e o compromisso do inventariante na administração da herança.

Portanto, como esses dispositivos anteriormente abordados não fizeram qualquer distinção entre o cônjuge e o companheiro, não existe qualquer razão para que o Código de Processo Civil continuasse a fazer essa diferenciação.

É importante salientar que a introdução do artigo 990 do Código de Processo Civil não eliminou completamente a disparidade existente entre o companheiro e o cônjuge, visto que existem vários exemplos no Código Civil, como o artigo 1.845, que considera como herdeiros necessários os ascendentes, os descendentes e o cônjuge, não fazendo qualquer menção ao companheiro; na ordem de sucessão legítima, inserido no artigo 1.829, na qual não inclui o companheiro; o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência familiar é somente assegurado ao cônjuge, entre outros exemplos.

Entende-se que os institutos da união estável e do casamento são totalmente distintos, mas é importante observar que deverá ter tratamentos iguais, pois, em alguns casos envolvem bens, filhos, ou seja, há todo um envolvimento familiar que necessita de tratamento igualitário na legislação.

Essa alteração existente no Código de Processo Civil também não regulariza a situação existente nas relações homoafetivas, pois existe um atraso no ordenamento jurídico brasileiro em relação a esse instituto de relação familiar, não prevendo qualquer segurança aos companheiros pertencentes a esse instituto.

3. JURISPRUDÊNCIA COMENTADA

É de suma importância demonstrar algumas jurisprudências existentes nos tribunais relacionadas ao tema do artigo 990 do Código de Processo Civil, incisos I e II:

Processual civil. Civil. Decisão que nomeia inventariante. Interposição de agravo de instrumento antes da reclamação prevista no artigo 1.000, inciso II. Possibilidade. Nomeação de inventariante. CPC, art. 990, inc. II. Companheira. Lei 8.971/94. Reconhecimento da condição de herdeira. Impossibilidade, no caso.

I - Estabelecida, assim que iniciado o processo de inventário, disputa pela inventariança, a decisão que nomeia o inventariante desafia, desde logo, agravo de instrumento.

II - No regime do Código Civil anterior, a existência de descendentes retirava da companheira, mesmo que amparada na Lei 8.971/94, a condição de herdeira, para o efeito do inciso II do artigo 990, do CPC.

III - Recurso especial não conhecido.(STJ. REsp 141548 / RJ. Relator: Min. Antônio de Pádua Ribeiro. Órgão Julgador: T3 – Terceira Turma. Data do Julgamento: 19/05/2005. Data da Publicação: DJ 13/06/2005).

Trata-se de jurisprudência da terceira turma do Superior Tribunal de Justiça, em que relata a impossibilidade de nomeação da companheira como inventariante, retirando a sua condição de herdeira, mesmo que amparada pela Lei nº 8.971/94, no caso do inciso II do artigo 990 do Código de Processo Civil.

Esse julgado retira o direito da companheira de disputar pela inventariança devido não ter previsão legal no artigo 990 do Código de Processo Civil.

INVENTARIANTE. NOMEAÇÃO DE COMPANHEIRA, ESPOSA ECLESIASTICA.

NÃO CONTRARIA O ARTIGO 990 DO CODIGO DE PROCESSO CIVIL, QUE NÃO SE REVESTE DE CARATER ABSOLUTO, A DECISÃO QUE MANTEM COMO INVENTARIANTE A PESSOA QUE, CASADA PELO RELIGIOSO COM O EXTINTO, COM ELE VIVEU, EM UNIÃO FAMILIAR ESTAVEL, DURANTE LONGOS ANOS, TENDO O CASAL NUMEROSOS FILHOS. IMPROCEDENCIA DA IMPUGNAÇÃO MANIFESTADA POR ALGUNS DOS FILHOS DO LEITO ANTERIOR. INTERPRETAÇÃO A MAIS RAZOAVEL DA LEI FEDERAL.

RECURSO NÃO CONHECIDO.( STJ. REsp. 520/CE. Relator: Ministro Athos Carneiro. Órgão Julgador: T4-Quarta Turma. Data do Julgamento: 12/09/1989. Data da Publicação: DJ 04/12/1989).


Julgado referente à quarta turma do Superior Tribunal de Justiça do relator Ministro Athos Carneiro.

Essa jurisprudência trata da nomeação de companheira como inventariante, que não contraria o artigo 990 do Código de Processo Civil, o qual não se reveste de caráter absoluto.

No caso em questão, a companheira não seria considerada como “pessoa estranha”, contida no inciso VI do artigo 990, visto que a união estável entre homem e mulher é reconhecida como entidade familiar no Direito Pátrio.

4. CONCLUSÃO

Portanto, verifica-se que a relação entre o companheiro e o cônjuge é algo bastante delicado, visto que existe muita coisa a ser melhorada em relação à equiparação do companheiro e do cônjuge no ordenamento jurídico brasileiro, mas essas pequenas mudanças já acarretam um grande avanço significativo nessa relação.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. CPC (1973). Código de Processo Civil, Brasília, DF, Senado, 1973.

_______.CC (2002). Código Civil, Brasília, DF, Senado, 2002.

_______. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, Senado, 1988.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Processo Civil. Recurso Especial.. Recurso Especial. 141548 / RJ. Relator(a) Min. Antônio de Pádua Ribeiro. Órgão Julgador. T3 – Terceira Turma. Data do Julgamento. 19/05/2005.. Data da Publicação/Fonte Diário da Justiça 13.06.2005, p.267. Disponível em:<http://www.stj.gov.br//SCON/jurisprudência >. Acesso em: 07 mar. 2010.

_______. Superior Tribunal de Justiça. Processo Civil. Recurso Especial.. Recurso Especial. 520/CE. Relator(a) Min. Ministro Athos Carneiro. Órgão Julgador. T4 – Quarta Turma. Data do Julgamento. 12/09/1989. Data da Publicação/Fonte Diário da Justiça 04.12.1989, p.200. Disponível em:<http://www.stj.gov.br//SCON/jurisprudência >. Acesso em: 07 mar. 2010.

Sobre o(a) autor(a)
Rachel Figueiredo Viana Martins
Advogada e Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR).
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