O que fazer com o precatório inadimplido?

O que fazer com o precatório inadimplido?

Sugestões de compensação para quem tem em mãos precatório contra a União, os estados ou municípios. Orientação de como proceder em caso de ter crédito a receber por via de execução contra a Fazenda Pública (precatório) e ao mesmo tempo ser executado.

Do latim doctrina, de decere (ensinar, instituir, mostrar), o significado de doutrina, na terminologia jurídica, é tido, em sentido lato, como o conjunto de princípios expostos nos livros de Direito, em que se firmam teorias ou se fazem interpretações sobre a ciência jurídica.

Mas, em acepção mais estreita, quer significar a opinião particular admitida, por um ou vários jurisconsultos, a respeito de um ponto de direito controvertido.

E, neste sentido, aplica-se mesmo o vocábulo para exprimir o princípio que se possa firmar em uma sentença ou num acórdão, desde que, por ele, se estabeleça um esclarecimento a respeito da aplicação do direito, for por força da doutrina, que ali se encerra. (SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 15. Ed. Rio de Janeiro, Forense, 1999, p.291).

Precatório é uma requisição de pagamento expedida pelo Presidente do Tribunal, após o trânsito em julgado, em face do qual correu o processo frente a ente público, dentre eles o Município, o Estado e a União.

Ocorrendo a requisição antes de julho de cada ano, o pagamento poderá ser exigido no exercício financeiro seguinte. E se o pagamento não acontecer? Sobrevindo a intervenção cabível por mando constitucional, há considerações acerca da utilidade do crédito do precatório.

Argüido por credores sobre o que fazer com o precatório impago, sempre apresentei resposta que me parecia mais polida, mais correta, dever-se-ia procurar o seu advogado constituído, isto é, o guardião dos seus interesses. Todavia, motivado pela trilogia socrática, percebi que seria útil comentar publicamente sobre as possibilidades jurídicas que tem o precatório.

Em primeiro lugar é necessário observar se o precatório não está prescrito, pois há casos que levam à extinção da execução sem que tenha o processo cumprido seus trâmites normais, por exemplo, a prescrição intercorrente.

A lide não pode ser perpétua, e se restar paralisada a ação no processo de execução por culpa do autor, por mais de dois anos, opera-se a prescrição intercorrente, pois mesmo cabendo ao juiz velar pelo processo, a parte não perde por isso a iniciativa que lhe cabe. Não se pode passar por cima da prescrição liberatória, e mesmo assim, não se tem notícia de procuradores dos entes públicos requerendo a sua declaração.

O advogado é o artífice da defesa e dos direitos fundamentais dos cidadãos, sendo a Advocacia essencial à administração da Justiça, como esculpido no Art. 133, da Constituição Federal.

Ao advogado cabe pleitear direitos de seu representado em juízo, garantir o contraditório, a ampla defesa e o devido processo legal, buscando para seu cliente, independente do tipo de processo, um julgamento justo.

Contudo, em 17 de fevereiro de 2006, foi publicada no Diário Oficial da União a Lei 11.280, com vacatio legis de 90 dias, que alterou diversos artigos do CPC e, dentre suas modificações, estabeleceu que "o juiz pronunciará, de ofício, a prescrição" (nova redação atribuída ao § 5º do art. 219, que ora grifei).

A possibilidade de o magistrado conhecer a prescrição de ofício, ou seja, sem a necessidade de provocação da parte a quem interessa o instituto, num primeiro momento se afigura como a solução de processos que se avolumam nas escrivaninhas do Poder Judiciário, questões há muito sufragadas pela prescrição, as quais o magistrado poderá decidir rapidamente, desafogar o trabalho e despender maior atenção para as demais demandas.

A inovação nestes moldes operada determina, pois, ao magistrado, que, por sua iniciativa exclusiva, em detectando a ocorrência de hipótese de incidência de lapso prescricional, desde logo a proclame, decidindo assim o processo com exame do mérito (CPC, art. 269, inciso IV), ou seja, proferindo sentença apta à formação de coisa julgada formal e material.

A nova redação facultou ao juiz o poder-dever de decretar a prescrição, o que poderá ser feito em qualquer momento. A modificação implica estender aos direitos patrimoniais demandados pelo autor o poder jurisdicional de reconhecimento direto do efeito prescricional sobre o exercício do direito de ação.

O credor tem ao seu dispor a jurisdição do Estado para fazer valer os seus direitos contra o devedor inadimplente. O interesse de agir ou interesse processual nasce ao credor no primeiro dia após o vencimento. Com isso, é dever do credor tomar as devidas providências para receber o que é seu, e nesse contexto, a lei concede ao credor um prazo para que atue segundo seu grau de interesse. O Estado o apoiará nesse mister.

Some-se a tudo o quanto já exposto que, o artigo 884, § 1º da CLT nos convence de que há possibilidade de ser alegada a prescrição intercorrente no processo do trabalho. E está nitidamente esculpida como nos ensina Manoel Antonio Teixeira Filho.

Admite-se a prescrição intercorrente sempre que a prática do ato esteja, exclusivamente, a cargo do credor, pois o juiz não pode, por
motivação lógica e jurídica, substituí-lo.

Portanto, conveniente aos credores é diligenciar em provocar o pedido de intervenção de logo, se decorrido o prazo de pagamento do ofício requisitório.

Assim, após o requerimento da intervenção, apto está o credor em requerer judicialmente a compensação do crédito a seu favor em face de débitos que se lhe apresentem pelo império da execução.

Questiona-se se de posse de um precatório frente ao Município, não se poderia deixar de pagar IPTU, ou taxa de lixo, ou taxa de iluminação pública?

Ou ainda, se de posse de precatório em face do Estado, deixar de se pagar o IPVA ou ICMS, ou com precatório em face da União, compensar os valores recolhidos a título de CPMF, INSS ou IRPF?

E havendo dívida em face de bancos oficiais não poderia o precatório em face da União servir de compensação?

É obvio que o estado tem o direito de executar o contribuinte devedor, criando vários constrangimentos, v.g., levar os bens do devedor à praça ou leilão, e esse mesmo direito tem o contribuinte, quiçá remir a execução com direito de crédito existente em precatório.

O Superior Tribunal de Justiça, em decisão de maio de 1990, que teve como relator o ministro Carlos Velloso, entendeu, à época, ser possível um devedor, em execução fiscal promovida pelo Estado de São Paulo, oferecer à penhora direito de crédito existente em precatório.

Citando, na sua tese, trecho da decisão da 6ª Câmara do 1º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, o ministro transcreveu o seguinte trecho: "O crédito oferecido e aceito à penhora representa, no caso, a melhor garantia que a impetrante poderia encontrar, na execução movida contra o apontado contribuinte, pois se trata de dinheiro em seu poder, o qual, uma vez depositado, ficará indisponível, enquanto a penhora remanescer". (grifei)

Não me parece impróprio ingressar com uma ação de consignação para pagar qualquer tributo fiscal, seja Municipal, Estadual ou em face da União com o direito de crédito existente em precatório.

Assim, por via oblíqua, poder-se-ia alcançar a extinção recíproca de créditos.

O artigo 170 do Código Tributário Nacional dispõe sobre o modo de compensar o crédito tributário, a saber: a) que haja lei autorizando; b) que haja crédito liquido e certo, vencido ou vincendo, do sujeito passivo contra a Fazenda Pública.

No Estado da Bahia há um incontável número de Municípios que pelejam para que seus contribuintes municipais paguem o IPTU.

Havendo contribuinte com precatório a receber do município basta publicar uma lei autorizando a compensação. Bom para o município, bom para o contribuinte.

Nestes mesmos termos poderá, querendo, agir o Estado, publicando leis que possibilitem a compensação do INSS, IPVA, quiçá multas de trânsito, água, esgoto e luz elétrica com os créditos de precatórios.

Todos ganham, e embora possa causar estranhamento aos incautos, a
compensação é perfeitamente possível, e está regulada no artigo 368 do novo Código Civil (anteriores artigos 1.010 a 1.017).

Encerrando a defesa desta pequena tese, vale lembrar que o próprio Superior Tribunal de Justiça , em novembro de 1997, por julgamento unânime, de sua Primeira Turma, nos autos de um processo de execução fiscal, determinou que a Fazenda Pública Estadual de São Paulo aceitasse Títulos da Dívida Agrária -TDA´s- pelo seu valor de face, como garantia do pagamento do débito do contribuinte executado.

Quero salientar, ultimando este raciocínio, que ocorrendo execução do ente público contra contribuinte que possui crédito a receber, basta aguardar a oportunidade processual própria e oferecer em garantia o precatório.


Bibliografia.

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Sobre o(a) autor(a)
José Valman Peixoto de Carvalho Júnior
Bacharel em Direito pela Universidade Federal da Bahia, Pós-Graduado em Direito Civil em Minas Gerais, Ex-assistente de Juiz do TRT da 5ª Região, Diretor de Secretaria da Vara do Trabalho de Bom Jesus da Lapa - TRT da 5ª Região...
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