Remissão nos seguros-saúde: um presente de grego

Remissão nos seguros-saúde: um presente de grego

Os autores discorrem sobre as desvantagens e a abusividade das cláusulas gerais de seguros-saúde, que concedem remissão, pelo período de cinco anos, aos dependentes, nos casos de falecimento do titular, após o que novo contrato deverá ser celebrado.

Pouca gente atenta para isso no momento da contratação, mas os contratos de seguros saúde costumam prever uma cláusula concedendo remissão, pelo período de cinco anos, ao dependente após o falecimento do titular do plano.

Por exemplo, se o titular é o marido e a esposa é dependente, quando aquele falece esta fica sem pagar o prêmio mensal do seguro de saúde, pelo prazo de cinco anos. Após esse prazo, a dependente terá que contratar novo plano, segundo as condições então vigentes.

Muito embora as seguradoras afirmem que isso é uma boa coisa, na prática, verifica-se que se trata de um presente de grego. Isso porque, na grande maioria das vezes, a morte do titular acontece quando o dependente é idoso, o que significa que, após a remissão, a contratação do novo plano levará em conta o maior risco a ser suportado pela seguradora, levando-se em conta a idade e as doenças preexistentes.

A soma da idade com doenças pré-existentes, porque é natural que idosos tenham doenças crônicas como diabetes e hipertensão, por exemplo, eleva o prêmio mensal do seguro-saúde para padrões insustentáveis e impossíveis de pagar.

Em um caso real, o prêmio da dependente, antes do período de remissão, era em torno de R$500,00. Passados os cinco anos de remissão, o novo prêmio mensal estipulado pela seguradora foi de R$5.000,00.

O presente de grego fica visível quando percebe-se que o prejuízo decorrente do período de remissão é recuperado pela seguradora já no primeiro ano de contratação do novo seguro, pelas condições vigentes.

Isso significa que, se contratar o novo seguro nas condições vigentes, o primeiro ano pago pelo segurado compensará o prejuízo da seguradora nos últimos cinco anos. Após esse período, todo o valor cobrado, além da mensalidade antiga corrigida monetariamente, corresponderá ao lucro da seguradora.

Os segurados idosos vêm tendo êxito na Justiça em ações obrigando a seguradora a manter os termos dos contratos antigos. Liminares e sentenças vêm sendo proferidas determinando às seguradoras a manutenção das condições de atendimento e o prêmio do seguro, corrigido anualmente.

Não é justo, a nosso ver, aguardar o decurso do período de cinco anos de remissão para promover a ação pleiteando a manutenção do contrato antigo, porque isso representaria enriquecimento sem causa do consumidor e ofensa à boa-fé objetiva, um dos pilares do direito do consumidor. Sem falar que o segurado correria o risco do juiz determinar a compensação desse período de isenção nos pagamentos futuros, o que, aliás, é o correto.

Ocorrendo o falecimento do titular do plano e sendo o dependente idoso, o melhor é promover a ação logo em seguida, a fim de que o juiz determine a continuidade do pagamento do prêmio mensal, mesmo durante o período de remissão, a fim de garantir que, após cinco anos, o contrato será mantido nas mesmas condições.

Vale dizer, o segurado idoso exercerá o direito contratual à remissão mas, de outro lado, não terá que se preocupar com o pagamento de valores absurdos após os cinco anos.

No caso de dependentes jovens, o problema não é tão sensível, tendo em vista que a elevação do prêmio mensal não costuma ser tão significativa. De qualquer forma, se optar pela remissão, o consumidor correrá o risco de deparar-se com um valor absurdo lá na frente.

Melhor, a nosso ver, seria que as seguradoras tirassem essa cláusula, no nosso entender abusiva, dos seus contratos de adesão. Isso certamente não acontece porque as seguradoras têm lucro com a expulsão de inúmeros segurados idosos que, desconhecedores dos seus direitos, acabam submetendo-se às novas regras e pagando prêmios mensais absurdos ou abrindo mão da qualidade de seus planos, contratando outros inferiores e mais baratos.

Já que não interessa para as seguradoras, cabe aos órgãos de defesa do consumidor resolver essa situação. Enquanto isso não acontece, cada um que se vire por si.

Sobre o(a) autor(a)
Arthur Rollo
Mestre e Doutorando em Direitos Difusos e Coletivos pela PUC/SP. Professor Titular de Direitos Difusos e Coletivos e Coordenador do Escritório Escola da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo. Advogado.
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