Infidelidade partidária - O caso Heloísa Helena
Comentários sobre infidelidade partidária, tomando o caso de expulsão da Senadora Heloísa Helena como referência.
Os partidos políticos do Brasil, em que pese a atual complexidade
de suas estruturas jurídicas e administrativas, têmpouco
poder sobre seus filiados. A nossa História registra essa
tibieza dos partidos políticos, infelizmente.
No Império, dois partidos (liberal e conservador) se sobressaiam,
entretanto, ambos, viviam à sombra do Imperador, que tinha
enormes poderes de intervenção. O poder político
durante o Império era representado pelo Imperador e pelo
Conselho do Estado (o “cérebro da monarquia”).
Criado em 1823 e extinto pela reforma de 1834, o Novo Conselho, como
era chamado, foi reinstaurado em 1841 e permaneceu até o
final do Império. Os ministros eram nomeados pelo Imperador, o
qual tinha total liberdade de escolha, embora em 1847 tenha sido
criada a figura do Presidente do Conselho, indicado por D. Pedro II,
o qual, por sua vez, nomeava os demais ministros, porém com a
possibilidade de veto do imperador. Essa situação,
dizem os historiadores, demonstrava a fragilidade do próprio
Conselho e dos partidos políticos da época, tanto assim
que a vida dos gabinetes era muito curta, tendo se contabilizado um
grande número de gabinetes.
Com o advento da República, os partidos não foram
fortalecidos e continuaram como estrutura frágeis, sem grande
valor social.
O PTB, a UDN e o PSD, entretanto, conseguiram a proeza de possuírem
uma identidade política (e cultural) própria, ao ponto,
salvo engano, de CARLOS DRUMOND DE ANDRADE, referindo-se à
política mineira, onde havia uma luta renhida entre o PSD e
UND, ter dito que, na década de 50, se reconhecia um
pessedista até pelo seu caminhado e modo de trajar.
Esses partidos consolidaram um sentimento de fidelidade por parte de seus políticos
e eleitores e, dificilmente se mudava de lado, embora do ponto de
vista jurídico e disciplinar não houvesse grandes
conseqüências para os adesistas.
O PCB, um dos nossos partidos mais antigos, sempre primou por uma
rígida estrutura partidária, fazendo valer as decisões
disciplinares, também, mas, ao contrário dos outros
citados acima, não chegou, efetivamente, ao poder.
Com o golpe militar de 1964, os partidos perdem, de uma vez, a
importância, com a criação do bi-partidarismo e a
submissão da vida política à doutrina de
segurança nacional, que era o pensamento do exército.
Redemocratizado o País, vários partidos surgiram, porém somente
o PT conseguiu fazer valer, até o momento, as idéias do
partido, disciplinando seus filiados, especialmente os detentores de
mandato político.
O ESTATUTO DO PT determina que compete à COMISSÃO DE ÉTICA E DISCIPLINA apurar infrações à ética e à disciplina, à fidelidade e deveres
partidários, devendo emitir parecer para decisão do
Diretório correspondente, no caso de HELOÍSA HELENA,
para o Diretório Nacional e cuida o próprio Estatuto
em esclarecer que essa comissão não tem função
policial ou judiciária, mantendo o sigilo de seus trabalhos e
assegurando ampla defesa aos investigados. No art. 209, do Estatuto
está consignado que o “O desrespeito à
orientação política ou a qualquer deliberação
regularmente tomada pelas instâncias competentes do Partido,
inclusive pela Bancada a que pertencer o ocupante de cargo
legislativo” constitui infração ética
e disciplinar, cuja penalidade pode ser a expulsão do
filiado, com o conseqüente cancelamento de sua filiação.
Certamente essa rígida estrutura partidária, aliada ao inegável
compromisso com a ética na administração pública
foram fatores importantíssimos na caminhada do PT ao governo
federal.
Do outro lado, a estrutura partidária fortaleceu-se com o chamado
“dízimo” eleitoral (contribuição dos
filiados), principalmente após a conquista de vitórias
eleitorais de porte, como os governos do Distrito Federal, do Rio
Grande do Sul, a Prefeitura de São Paulo e outras mais, vez
que aumentou, e muito, a arrecadação de fundos,
permitindo uma otimização de sua administração,
qualificação de membros e publicidade, tudo isso sob um
forte comando central.
A revista ÉPOCA, desta semana, traz em sua reportagem de capa, a seguinte manchete:
“O PT FICA RICO E MONTA UMA SUPERMÁQUINA” e que este ano, a sigla administrará cerca de R$ 83.000.000,00 (oitenta e três milhões de reais).
O caminho até esse sucesso político e administrativo
deu-se, como se sabe, através da luta incessante de suas
lideranças e calcada na figura da fidelidade partidária.
Os eleitos pelo PT, Brasil afora, sempre submeteram-se às
decisões partidárias, diga-se de passagem, todas
tiradas em inúmeras e regulares assembléias, até
a decisão final.
A rigidez à fidelidade partidária já fez o PT
expulsar outros filiados importantes e detentores de madatos.
Na época da eleição indireta de TANCREDO NEVES
contra PAULO MALUF (1985), o partido deliberou que não deveria
participar da votação e expulsou os deputados federais
AYRTON SOARES e BETE MENDES (a atriz), que eram do PT/SP e resolveram
votarem em Tancredo. O partido entedia o COLÉGIO ELEITORAL
como uma coisa espúria e que não deveria ser legitimado
com o voto de seus parlamentares, pois o objetivo era a convocação
de eleições diretas.
Na eleição indireta que escolheu TANCREDO NEVES para a
Presidência da República, tendo JOSÉ SARNEY,
recém saído do PSD (antecessor do PFL e sucessor da
ARENA), como candidato a vice, se discutiu bastante sobre a
legitimidade do modo de escolha. O então Deputado Federal
JARBAS VASCONCELOS, hoje Governador do Estado de Pernambuco,
integrava, como ainda hoje, o PMDB (apesar de ter saído do
partido para disputar e ganhar a primeira eleição de
Prefeito do Recife pelo PSB) foi um dos parlamentares que se
abstiveram de votar.
É de se recordar, também, que a Deputada LUÍZA ERUNDINA,
hoje no PSB e que foi eleita Prefeita de São Paulo pelo PT,
também teve aberto processo disciplinar contra si.
Agora, com LULA no comando do País e tendo o partido decidido que as
reformas apresentadas ao Congresso eram de fundamental importância,
decidiu-se que todos os parlamentares teriam que votar a favor das
propostas do governo.
Os demais partidos, tanto os aliados do governo, quanto os de oposição,
não se deram ao trabalho de adotar uma resolução
a respeito do assunto, pois nesses a fidelidade partidária têm
pouco valor, tanto assim, que o governo conseguiu votos de
parlamentares da oposição e perdeu votos em sua própria
base, porém dentro do PT, os que votaram contra foram punidos
de acordo com as regras da fidelidade partidária.
O episódio de votação das reformas culminou com a
expulsão do PT, por infidelidade, da SENADORA HELOÍSA
HELENA, do Estado de Alagoas, além de 03 Deputados Federais.
Mulher voluntariosa, comprometida com as causas populares, HELOÍSA
HELENA insurgiu-se contra a direção partidárias
e, várias vezes, bateu boca com seus representantes. Várias
vezes chorou perante à televisão, porém sabia
que seu destino estava traçado, pois havia descumprido com as
determinações de seu partido.
O PT, ao contrário dos outros partidos, tem exercido rigoroso processo de controle
disciplinar de seus filiados, principalmente dos detentores de
mandato, daí as razões para a expulsão da
SENADORA HELOÍSA HELENA.
Do ponto de vista político e jurídico, a sua expulsão
não merece nenhuma reprimenda. Primeiramente, porque um
partido político deve ter comando e unidade, senão
perde o sentido (taí o PMDB, por exemplo, totalmente
fracionado e sem condição de estabelecer qualquer
diretriz que obrigue a todos os seus membros, mesmo para coisas
simples). E, segundo, porque juridicamente, a direção
do PT seguiu o processo disciplinar previsto em seu Estatuto e, como
se sabe, os partidos têm liberdade para deliberar nesta
matéria, não tendo como haver interferência
externa.
O Poder Judiciário, por exemplo, somente poderia ser chamado a
intervir na questão, para apreciar a legalidade dos atos da
direção, sem qualquer avaliação
meritória.
Portanto, a expulsão da senadora, serviu para fortalecer o partido e
deveria servir de exemplo às demais agremiações
partidárias, acaso houvesse legítimo interesse de seus
dirigentes de torná-las estruturas políticas fortes.