Pena de Morte

Pena de Morte

A Pena de Morte em seus vários aspectos: uma visão do cotidiano social atual.

S e a pena de morte não existisse, Jesus não teria sido crucificado. O costume cruel de assassinar prisioneiros é, na opinião de Santo Agostinho, uma ofensa a Deus, pois anula a dignidade e a pessoa humana. Dostoievski que, condenado à morte, chegou a ser levado perante o pelotão de fuzilamento, diz, em O Idiota, que “matar a quem matou é um castigo incomparavelmente maior que o próprio crime. O assassinato em virtude de uma sentença é mais espantoso que o assassinato cometido por um criminoso”. Pois a sociedade torna-se ela própria, através do Estado, assassina, arvorando-se na onipotência de decidir sobre a vida alheia.

“A guilhotina vela o sono dos ricos contra a insônia dos pobres”, escreveu Balzac. De fato, o que está embutido na defesa da pena de morte não é o aprimoramento de nossa legislação penal. É a legitimação do extermínio. A lei de talião. Hélio Pellegrino tinha razão: a pena de morte tem como fundamento, não o desejo de reparação ou de justiça, mas a sede brutal de vingança.

Em nenhum país que adota a pena de morte capital houve redução da criminalidade. Ao contrário, ao saber que, por uma morte, seu destino está selado, o criminoso mata também testemunhas, pois sabe que, ao ser preso, não poderão mata-lo duas vezes, mas haverá mais chances de alívio na aplicação da lei por falta de provas... Assim, a pena de morte traz a barbárie mas, sobretudo, revela o quanto está vivo e latente o homicida no coração daqueles que a apóiam. São pessoas que, desesperançadas, desprovidas de fé na redenção divina, gostariam de vingar com as próprias mãos o crime que as atinge. Mas, em matéria de vingança, a elegância humana já criou um asséptico recurso: delega ao Estado a função de queimar no altar da pátria as vitimas expiatórias do pecado coletivo.

Os defensores da pena de morte esperam que, com a sua adoção, nos esqueçamos que ninguém é intrinsecamente mau e que a sociedade produz os criminosos. Nessa amnésia coletiva, vamos correr atrás de bandidos para lincha-los, quando deveríamos participar de manifestações para exigir que o salário mínimo brasileiro deixe de ser um dos menores do mundo. Dilacerados pela alienação, causa-nos horror a figura do estuprador, enquanto diante da TV nos divertimos com novelas e filmes que exibem violência e pornografia. Clamamos pela punição do pivete que rouba, enquanto ficamos indiferentes diante do empresário que sonega produtos e do político que desvia verbas.

Quem aprova a pena de morte é porque, provavelmente, já matou, em si, a esperança e a fé. Esta é a lei dos que são materialmente prepotentes e espiritualmente indigentes.

***
Este texto foi escrito por Frei Betto, no seu livro Cotidiano & Mistério, Ed. Olho Dágua, p. 44 e 45.


A seguir, esposaremos a nossa reflexão sobre este belíssimo pensamento de Frei Betto, a respeito da pena de morte, sob os mais variáveis enfoques.

O que vem a ser vida? Segundo o Aurélio, é o “estado de atividade incessante, comum aos seres organizados; tempo que decorre entre o nascimento e a morte; existência”. Acredito que uma pessoa que tem consciência plena de seu ser pode dizer que vive, que existe.

Sua existência é constantemente, para não dizer vivamente, imposta pela sua atuação no mundo, pela sua consciência de vida através de sua formação, cultura, gestos, palavras, induções, enfim tudo aquilo que ele, o homem, possa tanger e lutar.

E é no social que o homem encontra respostas e estímulos, dúvidas e conceitos, induções e perseguições de suas idéias. É no social, que o homem encontra a sua coletividade, seus vários “eus”. Em plena era contemporânea, o homem ainda não se deu conta da sua potencialidade; uma era tecnológica que responde em fração de segundos a seus estímulos e, em contra partida, a ética perde cada vez mais o seu espaço de “bem educado”, à essa frágil palavra: respeito.

Expus, logo no começo, o que vem a ser vida, sua denotação. E a morte? Sabemos da certeza de nascer, temos este direito constituído pelo Estado. Sabemos que vamos morrer, faz parte da natureza: nascimento e morte. Como será que um ser humano reage diante da morte? E a família? E o Estado? O que vem a ser pena de morte?

Posso dizer que existem inúmeras penas de morte nas quais são mascaradas por eufemismos: Fome, prisão perpétua, sede, depressão, homicídio, analfabetismo, alienação, infarto no miocárdio, fumo, alcoolismo, vicio em drogas ilícitas, solidão, bala perdida, guerras, acidente de trânsito, estresse, desemprego, discriminação, cadeira elétrica, morte em corredores de hospitais, crucificado, censura, impostos maus aplicados, falta de medicamentos, forca, mídia, são alguns poucos exemplos.

A sociedade, isto é, cada um de nós, destrói um produto da conquista evolutiva ao infligir sua pena de morte. Vejamos: quer queiramos ou não, aquele que discrimina outra pessoa tem o mesmo conceito de vida e de ser humano daquele que assassina; aquele que vive em paz sabendo que há analfabetos, mortos de fome, alienados, oprimidos vêem a vida da mesma maneira que o governo que aplica a cadeira elétrica como pena. Quem trata com drogas, cigarros, bebidas não dão mais valor à vida que os que fuzilam as pessoas. Quem humilha as pessoas, tem os mesmos valores daqueles que fazem uma guerra.

Vivemos ou não vivemos sob tensões de pena de morte? Somos ou não somos condenados, por nós mesmos e, por conseqüência, pelos outros, dos nossos erros, das nossas condutas. No mundo capitalista, onde tudo gira em torno do dinheiro, podemos julgar alguém que matou por dinheiro?

É claro que vivemos sob regras. O assassinato, como tantos outros comportamentos e atitudes violentas, não nos é acordado pela sociedade e conseqüentemente tem sua punições. A idéia que a lei exerce uma função eminentemente pedagógica no meio social constitui um dos princípios fundamentais na filosofia grega, de onde o conceito do justo e do bem estão intrínsecos na cultura e nas garantias do homem. Vivemos sob o argumento da legítima defesa social, no qual é extremamente frágil.

Nos Estados onde a pena capital existe, as estatísticas têm mostrado aumento dos índices de criminalidade, corroborando a idéia de que os crimes hediondos são praticados por pessoas em estado de total descontrole de suas faculdades mentais e em momento não refletido da sua vida. Portanto, o assassinato institucionalizado não consegue exercer a função de freio para o criminoso que comete ou cometerá um crime hediondo.

Quando matamos em legitima defesa, fazemo-lo involuntariamente. Quando matamos por uma decretação de uma sentença fazemo-lo voluntariamente. O primeiro é um ato natural imprevisto, provocado pelo instinto de conservação. O outro é um ato pensado e friamente executado. O primeiro é consecutivo a um ataque sofrido, a um crime cometido. O segundo é antecipado à conseqüência que se possa provir de deixar em vida um elemento reconhecidamente insociável.

Isto seria crime ou castigo?

Sabemos que o aumento da criminalidade organizada e profissional, os dramáticos casos de assassinatos que se sucedem sistematicamente gerando uma guerra civil, aumenta a ânsia paranóica de maior segurança: grades nas casas, cadeados, vigilância privada, cachorros, carros com filmes nos vidros, estado de sítio induzido...

Delegar ao Estado a função de matar proporciona, àquele que ordena, o distanciamento do resultado, impedindo-o de visualizar o seu comprometimento com relação à ordem dada e isenta de culpa àqueles que realizam a ação, entendendo-os como “cumpridores de ordens”.

Este grupo de “perigosos” tem a sua punição nas prisões super lotadas que o Governo “mãe” acolhem em seus depósitos humanos, até que a sociedade decida o que fazer (ou não) com eles. Não é de espantar que diante dessa pressão do medo, do aumento de condenados “Irrecuperáveis” (como se os outros detentos da prisão pudessem ser graças à reeducação que eles recebem) que a pena de morte receba um favor tão grato entre as soluções para o problema de crime a médio longo prazo. Já que as prisões são depósitos a custo da sociedade, para que aumenta as despesas com mais irrecuperáveis? É uma dedução natural dentro da lógica destrutiva das condições atuais do sistema penitenciário.

De nada vem adiantando as milhares de mortes que foram realizadas por policiais em plena ação, ou que a morte dos condenados de justiça tenha sido tão banalizados como os assassinos e as mortes nos presídios.

Defender a pena de morte como forma de manter a ordem social e coibir a violência é atestar a total incompetência do Estado em instituir uma sociedade justa, eqüitativa, preocupada em reforçar os valores morais e éticos e elevar os padrões intelectuais; é retroceder à época da barbárie, da Lei de Talião; é contribuir para a propagação do mal e não para a sua extinção.

Parafraseando Mahatma Gandhi: “um olho por um olho acabará por deixar toda a humanidade cega”.

Portanto, como entender que exista uma morte legal e outra ilegal? O que transforma a morte aplicada pelo Estado em morte legal? Se eu rapto alguém e confino essa pessoa em um quarto contra a sua vontade, isso é um seqüestro. E se eu a matar, cometi um assassinato. Mas se eu sou um agente do Estado, um policial, e visto o uniforme então, declaro prisão ao primeiro fato que, seguido de morte, a execução será a de pena de morte.

Afinal qual é a utilidade da pena de morte? É quando a justiça manda matar?

Infelizmente, nenhuma voz se levantou na ocasião para denunciar esta hipocrisia. As pessoas se comoviam com a maneira considerada primitiva de se fazer uma execução capital, mas não com o fato da legalidade da pena de morte. De acordo com a opinião geral, o que está errado é, tão somente, a crueldade das penas: Cruel and unusual punishments, como se diz na 8ª emenda da Constituição Americana, “penas ou tratamento cruéis, desumanos ou degradantes” , como dispõe o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Política, adotado pelas Nações Unidas em 1966, ou simplesmente “penas cruéis” como declara a nossa constituição (Art. 5°, XLVII).

Contudo, estamos na era da modernidade: não precisamos mais de guilhotina, forca ou outros artifícios arcaicos. Pelo menos, estamos, nós sociedade, salva da inquisição: podemos exercer livremente as nossas filosofias sem nos serem impostas as mesmas, não correndo o risco de sermos condenados, sob pena de morte, a virar cinzas em praça pública. Já foi um avanço!

Pois bem. Cadeira elétrica, fuzilamento, forca, prisão perpétua e apedrejamento são penas que eliminam alguém que pensa da mesma maneira que você quando se omite diante das injustiças, por exemplo.

A fome como pena de morte é mais um exemplo de governo que não tem a vida como prioridade. Quem morre é responsável pela sua pena?

Se alguém morreu em um hospital público porque não tinha medicamentos, de quem será a responsabilidade? Do hospital? E que elegeu o responsável?

No final da estrada o que muda nas penas de morte é a maneira como nos é feito a enxergá-las e percebe-las: indiferentes ou emocionadas. Nas formas sutis que nos são impostas ou nos impomos. No tempo que decorre até consuma-las.


Cada um tem a Pena de Morte que merece

Vamos expor aqui um enfoque contrário daqueles que expomos acima. Um direcionamento de idéias nas quais são resultantes de uma sociedade que, além de saber o que é justo sabe, também, o que a injustiça e o descaso, pode gerar em nossas emoções, mexendo com opiniões e diretrizes.

“Se a pena de morte não existisse, Jesus não teria sido crucificado. Jesus, com toda Sua bondade e humildade e sem nunca ter cometido qualquer crime, por mais ameno que fosse, foi submetido a este julgamento cruel que culminou com Sua execução. Penalidade esta que, para ser deferida, causou grande dificuldade aos ”juizes" e/ou julgadores da época que não identificaram argumentos suficientes e factíveis que justificassem a atitude e os levassem a ratificar o julgamento proposto. Por que não poderia tal pena ser instituída para punição dos diabólicos indivíduos praticantes de crimes hediondos?

A cada dia nos deparamos com crimes cada vez mais bárbaros. Não podemos concordar que os chamados "ladrões de galinhas" sejam julgados e punidos da mesma forma que os perigosos indivíduos que andam a solta cometendo atrocidades e privando os cidadãos de bens do convívio saudável com a sociedade, pois da forma em que a violência está evoluindo, o pânico se instala com maior intensidade no seio das famílias. Vivemos um verdadeiro caos, nos tornamos prisioneiros sem havermos cometido crimes. Além de vivermos permanentemente à mercê das ações abomináveis dos malfeitores, pagamos um elevado custo para mantê-los em presídios, com mordomias que a maioria dos cidadãos brasileiros não têm condições de desfrutar de um centésimo que seja do que lhes é concedido.

Há quantas centenas de anos se vem tentando combater a violência, se gastando fábulas aparelhando o Estado para cumprir uma de suas mais prementes obrigações, a segurança da população, e vemos brotar a cada dia, mais violência? Não se consegue visualizar o recuo sequer de um passo em relação à violência.

Seria a impunidade, a causa? Eu acredito que sim. Portanto, apenas defendendo um ponto de vista, concordo que os crimes bárbaros, hediondos, sejam julgados e seus praticantes punidos com a vida própria, não entendendo assim, ser esta punição uma vingança e sim a exclusão da sociedade de indivíduos endemoniados que não têm condições de conviver com ela.

Sou católica, tenho meus questionamentos e conflitos internos, mas não encontrei até o momento alguém ou argumentos que me convencessem do contrário, portanto continuarei defendendo a "pena de morte" com minhas parcas justificativas, que aliás são suficientes para a minha convicção, pelo menos até o momento “.

Como podemos perceber, este não é um assunto de fácil resolução, pois há várias “penas de morte”, em nossa sociedade do podemos supor. Porém, o mais grave nisso tudo, é a falta de respeito e amor onde parte da premissa toda a negatividade dos povos.

Sobre o(a) autor(a)
Claudia Ferraz
Estudante de Direito
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