Teoria do adimplemento substancial: seus fundamentos e os critérios para configuração da mora insignificante

Teoria do adimplemento substancial: seus fundamentos e os critérios para configuração da mora insignificante

Análise sobre os aspectos gerais das obrigações, aspecto contratual, com foco nos seus fundamentos, que destacam-se essenciais ao alcance da boa-fé objetiva e a função social do contrato.

INTRODUÇÃO

A vida em sociedade traz relações interpessoais e, consequentemente, direitos e deveres. Assim, através das obrigações o cidadão é submetido ao encargo de cumprir o prometido, principalmente os termos da relação contratual.

Porém, há casos em que o acordado não pode ser realizado, ocorrendo o inadimplemento. Existem várias formas deste, contudo não será qualquer um causador de resolução contratual, mas sim, de responsabilização.

A extinção contratual se dá em virtude da obrigação não poder mais ser satisfeita ou o credor não mais desejá-la. Entretanto, não é uma imposição, mas uma faculdade da parte se não desejar exigir o cumprimento, é medida excepcional e que deve ser usada em extrema necessidade.

Justamente por esse motivo surge a teoria do adimplemento substancial. O presente trabalho terá por finalidade demonstrar a aplicabilidade desta tese e dos critérios para definição.

Assim, o artigo será dividido em dois capítulos. No primeiro serão descritas as obrigações, o aspecto contratual e as consequências dessas, incluindo o adimplemento e inadimplemento.

No segundo capítulo será apresentado o adimplemento substancial, descrevendo que este mitiga a compulsoriedade do contrato quando há o abuso de direito e expondo os seus fundamentos: boa-fé e função social do contrato. Ainda, serão elencados critérios para aplicação do mesmo, sendo comprovados por julgados, já que se trata de inovação doutrinária e jurisprudencial.

Por fim, será comprovado que a tese exposta se torna excelente instrumento jurídico para evitar injustiças e desigualdade, pois o contrato não será extinto, já que há o cumprimento de parte substancial das obrigações estabelecidas entre as partes. Importantíssimo por impor limites ao credor para que não ocorram situações arbitrárias e um possível enriquecimento sem justificativa da parte afetada pelo descumprimento contratual.

A OBRIGAÇÃO

A obrigação é assunto muito importante, visto que rege a maioria das relações entre as pessoas, estando presente em todas as esferas da vida. São reguladas pelo Código Civil de 2002, dividem- se em obrigações de dar, fazer e não fazer.

Os contratos são a principal fonte das obrigações, são formas de cooperação entre as partes, pois cada uma possui direitos, deveres e ambas devem zelar pelo transcorrer do ajustado. Em decorrência desses, as partes assumem compromissos que devem ser cumpridos, caso contrário, existirão consequências.

Por isso, tão relevante quanto as obrigações, são o adimplemento e o inadimplemento.

Vige a autonomia da vontade, pela qual as partes têm a liberdade de contratar e estabelecer a forma de cumprimento das condições. Justamente decorrente dessa é que surge a obrigatoriedade em cumprir o ajustado.

Adimplemento é a execução espontânea e que põe fim ao liame entre os contratantes; pressupõe que a prestação quitada seja exatamente como a anteriormente ajustada, no objeto e forma determinados, gerando a liberação da obrigação.

Contrariamente, o inadimplemento se dá pelo não realização da obrigação ajustada e pode ser apresentado nos tipos absoluto ou relativo. O critério diferenciador é a utilidade da atribuição para o credor, conforme prevê o artigo 395, parágrafo único do Código Civil.

O absoluto se caracteriza pela insolvência da obrigação e não há como cumprí-la posteriormente pela impossibilidade ou não é mais conveniente ao credor que se realize.

Já o relativo mostra que a obrigação ainda é útil para o credor, o devedor pode cumprí-la em atraso, ou seja, pode executá-la tardiamente. É o caso das relações em que o cumprimento deve ser feito em dinheiro, pois mesmo não sendo quitado no momento ajustado, ainda poderá ser ulteriormente.

O inadimplemento relativo também é denominado Mora. Há o cumprimento imperfeito ou atraso, mas ainda pode ser satisfeita, conforme dispõe o artigo 394 do CC/2002.

A grande importância em diferenciar claramente os tipos de inadimplemento é a consequência de cada um. No inadimplemento absoluto caberá responsabilização patrimonial cumulada com a resolução contratual. Já na mora, será possível a purgação da mesma com acréscimo de juros, correção monetária, além da implicação financeira e, se não solucionada, também será possível a extinção contratual.

Porém como se revelam situações em que o devedor cumpriu a grande parte da obrigação e não pode realizar as demais? Trata-se da teoria muito relevante do ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL.

ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL

Conforme as relações econômicas e sociais foram se transformando, os ajustes sociais também foram influenciados. O modelo contratual do “pacta sunt servanda” que previa que o contrato devia ser absolutamente cumprido passou a ser relativizado pelo equilíbrio contratual.

Por esse princípio, os contratantes têm a chance de rediscutir o contrato caso haja alguma situação que cause desproporção entre as partes. Além disso, protegem-se as partes para que uma não tenha o enriquecimento ilícito através do prejuízo da outra.

Decorrente do equilíbrio contratual manifesta-se a teoria do adimplemento substancial. Apesar de sua importância, esta tese ainda não é positivada na legislação brasileira, contudo, tem amplo emprego na jurisprudência.

O Código Civil no seu artigo 389 prevê que se o contrato é descumprido, o credor tem a chance de pleitear a extinção contratual ou exigir que seja cumprido, acrescido de responsabilização patrimonial. Pela teoria apresentada, a parte prejudicada diante da falta de ínfimo pagamento não poderia exigir a resolução contratual, mas apenas a regularização, em juízo, dos pagamentos, acrescidos de perdas e danos.

Dessa forma, o pacto acordado e seus dispositivos permanecem vigentes, inclusive com as obrigações das partes, sendo discutido apenas a normalização dos pagamentos em ação autônoma.

Assim, concorda o autor Marcos José de Paula em seu artigo:

Pela teoria do adimplemento substancial, que encontra sua origem no Direito Inglês, sendo denominada de substancial performance, tem-se que, quando a obrigação foi cumprida na sua essência a ponto de satisfazer o credor, afasta-se a resolução contratual em face do aproveitamento pelo credor do cumprimento, mesmo que este seja parcial. Tornando regra a preservação do contrato e a exceção a resolução do mesmo. [1]

No Direito Inglês, a teoria do adimplemento substancial é conhecida como substancial performance. No Brasil, influenciada pelos ingleses, iniciou-se por volta de 1988.

É forma de alcançar a justiça contratual e preservar as relações, já que os pressupostos são: que tenha sido cumprida parte substancial das obrigações, inadimplemento de ínfima parte, forma de cumprimento que atenda ao interesse do credor, mas que seja da forma menos prejudicial ao devedor.

Por isso, tanto credor, quanto devedor, devem ter seus direitos atendidos. A parte inadimplente ainda terá a imposição a ser seguida e o outro terá seu crédito atendido.

A problemática é caracterizar o que é ínfimo inadimplemento, sendo a grande questão divergente e o que gera controvérsia a respeito da aplicação ou não da teoria.

FUNDAMENTOS PARA APLICAÇÃO DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL

Como já explanado anteriormente, o Código Civil de 2002 não dispõe expressamente sobre o adimplemento substancial, contudo, apresenta as bases fundamentais dessa tese.

Essa tese propõe que não haja a supressão do contrato se existir o cumprimento de grande parte da avença, sendo forma de justiça, equilíbrio econômico das partes e cooperação (esta última positivada no Novo Código de Processo Civil no artigo 6º). Portanto, não prejudicando aquele que por razões diversas não conseguiu cumprir com o acordado entre as partes.

Assim, cumprem-se a utilidade social do contrato e a boa-fé objetiva, fundamentos do adimplemento substancial.

Corroborando tal afirmação, a IV Jornada[2] de Direito Civil firmou o Enunciado 361: “Arts. 421, 422 e 475. O adimplemento substancial decorre dos princípios gerais contratuais, de modo a fazer preponderar a função social do contrato e o princípio da boa-fé objetiva, balizando a aplicação do art. 475.” 

Destarte, função social e boa-fé são elementos justificadores da teoria do adimplemento substancial.

FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO

Prevista no art. 421 do Código Civil, sendo um dos elementos essenciais da relação entre contratantes. De acordo com esta, prevalece o coletivo em detrimento dos interesses particulares, de modo que o hipossuficiente não seja prejudicado pela má-fé do outro.

Deve estar presente em todas as fases contratuais, nas tratativas e após o desempenho da obrigação. Inclusive prevalece sobre qualquer convenção contratual que contrariá-lo, como dispõe o artigo 2035 do Código Civil.

Funciona como limitador da atividade das pessoas, de modo que o contrato sirva como meio de equilíbrio entre as partes para alcançar o fim pretendido. Não é possível realizar um contrato em que somente uma parte se beneficie em detrimento da outra, pois, nesse caso, a dignidade da pessoa humana também estaria sendo desrespeitada. Nesse sentido:

Por fim[3], o estudo propugna por um contrato que realize a função social, na medida em que busque conciliar os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana (art. 1º inciso III) e o da livre iniciativa (art. 170 caput), servindo ao mesmo tempo como um instrumento de circulação de riquezas e um instrumento realizador do ideal de Justiça Social, basicamente tutelando a pessoa humana, que é o valor supremo da nossa Lei Maior.

Portanto, o adimplemento substancial fundamenta-se na função social a medida em que impõe as partes equilíbrio contratual e igualdade. É garantia de cumprimento e permite o fim esperado pelas partes.

BOA-FÉ OBJETIVA

As relações contratuais envolvem pessoas distintas e que tem o dever de serem leais e justas umas com as outras, sem prejudicarem a si mesmas e terceiros.“O novo Código ampliou e regulou melhor a boa-fé quando estabeleceu, expressamente, a sua incidência na conclusão (celebração ou formação) e execução (cumprimento) do contrato[4]”. 

Funciona como regulatório das relações obrigacionais, limitando a autonomia da vontade, visto que, impõe que os contratantes tenham postura de confiança e cumpram o estabelecido.

Contudo, nos casos em que isso não é possível, mas que a inadimplência foi mínima, o devedor deve ter como consequência uma forma menos gravosa, pois ainda possuía a intenção de adimplir.

O artigo 475 do Código Civil preceitua que se houver o inadimplemento do contrato, esse poderá ser resolvido ou ser exigido seu cumprimento. Porém, esse direito é limitado pela boa-fé objetiva quando há a abusividade, como na situação em que o descumprimento é de tão pequena parte que se torna insignificante.

Esse princípio impõe deveres de conduta entre as partes de modo que cumpram suas obrigações firmadas. O contratante que cumpriu substancialmente seu encargo não está agindo de má-fé, pois tem a intenção de integralizá-lo, não fazendo pela impossibilidade financeira naquele momento. Extinguir o contrato nessa situação seria afronta à boa-fé da parte que executou praticamente a totalidade do acordado.

Dessa maneira, a boa-fé objetiva funciona como limite à resolução contratual dado que firma um meio menos prejudicial ao devedor, tal como a cobrança dos valores pendentes cumulado com perdas e danos.  Assim, “com o princípio da boa-fé objetiva, o direito de resolução é limitado se verificada a abusividade, como exemplo em caso de adimplemento substancial em que o contrato já foi cumprido na maior e principal parte, restando comprovado que o inadimplemento foi ínfimo[5], de escassa importância.”

O Enunciado 371 da IV Jornada de Direito Civil também prevê exatamente que a mora de pequena quantia não autoriza a extinção contratual, por violar a boa-fé objetiva.

O princípio em questão confirma-se como base do cumprimento substancial, pois “censura o exercício[6] abusivo de direitos subjetivos e impõe um comportamento aceito”. A preservação do contrato inadimplido em pequena parcela garante segurança jurídica aos contratantes que aderem ao firmado de acordo com a boa- fé objetiva.  

CRITÉRIOS DEFINIDORES DO INADIMPLEMENTO INSIGNIFICANTE

Trata-se da questão chave, já que é assunto não pacificado na lei, mas que importantíssimo para firmar a aplicação da teoria do adimplemento substancial. A doutrina elenca alguns parâmetros para definir o quão seria o adimplemento ínfimo ou mínimo de acordo com os critérios quantitativo e qualitativo.

Conforme o aspecto quantitativo o inadimplemento deve ser tão pequeno a modo de não afetar a base contratual, isto é, os efeitos esperados pelo acordo entre as partes.

Alguns Tribunais de Justiça definem como aceitável para configuração da teoria se o devedor cumpriu mais de 80% (oitenta) do contrato, restando apenas pequena parte em débito.

Através da avaliação quantitativa é realizado o cálculo do percentual pago em comparação com o total combinado. Se o cumprimento do acordado foi em quantidade bem superior ao inadimplemento a ponto deste não interferir no resultado total, caberá a aplicação da tese do adimplemento substancial.

Justificativa é que o credor teve seu direito respeitado e a sua expectativa gerada pelo contrato foi atendida, pois obteve seu crédito e o aspecto não cumprido poderá ser exigido em ação autônoma de cobrança, isto é, receberá os valores de outra forma sem ser a mais gravosa ao devedor. Considera-se o valor devido comparado a quantidade de prestações já quitadas com o total.  Nesse contexto, o STJ enumerou no Recurso Especial nº 1.581.505-SC: [...] O julgamento avançou [7]para qualificar o que poderia configurar o decaimento mínimo para efeito de permitir a invocação da teoria do adimplemento substancial e afastar os efeitos da mora. Eis alguns exemplos:

a) Atraso na última parcela: REsp. 76.362/MT.

b) Inadimplemento de 2 parcelas: REsp. 912.697/GO. 

c) Inadimplemento de valores correspondentes a 20% do valor total do bem: REsp.469.577/SC. 

d) Inadimplemento de 10% do valor total do bem: AgRg no AgREsp 155.885/MS. 

e) Inadimplemento de 5 parcelas de um total de 36, correspondendo a 14% do total devido:  

O aspecto quantitativo revela-se  importante, mas não se trata da forma principal e unitária de solução da configuração da mora insignificante. 

Mais um parâmetro utilizado pela doutrina é o qualitativo ou subjetivo, pois julga o impacto do descumprimento de pequena parte do contrato para as partes. O exame desse critério se dá porque cada caso tem sua peculiaridade e o efeito do descumprimento de uma parcela pode ser pequena para um contrato, mas gigantesca para outro, a depender da situação em tela. 

Assim, há a análise da importância do inadimplemento no contexto e os outros elementos presentes nessa relação ajustada. 

O Superior Tribunal de Justiça entende que: "o julgamento [8]sobre a substancialidade do descumprimento contratual não se deve prender ao exclusivo exame do critério quantitativo. [...] Há, portanto, outros tantos elementos que também envolvem a contratação e devem ser considerados para efeito de se avaliar a extensão do adimplemento, um exame qualitativo que ademais não pode descurar dos interesses do credor"(STJ, RECURSO ESPECIAL:1.051.270/RS,2015).

Destarte, a melhor maneira de ser configurada a mora insignificante deve ser aquela em que os critérios quantitativo e qualitativo misturam-se, a medida em que é considerada a quantidade de inadimplemento, mas alia-se a isso, o impacto que esse causou no contrato e à outra parte. 

Deve ser verificado se o credor ainda terá meios de ter seu crédito satisfeito, de modo que o objeto do contrato não seja desfeito, mas que o devedor pague sua dívida, porém de forma menos gravosa. Não se trata de um perdão ao descumprimento contratual, mas se o credor obteve seu objetivo no contrato, restando em aberto parte tão pequena que não afeta o equilíbrio contratual e, além disso, o devedor tinha a intenção de cumprir o ajustado, mas não teve meios, não há que puni-lo demasiadamente.

O STJ firmou que a situação deve ser analisada conjuntamente com os critérios:           

a) a existência de expectativas legítimas geradas pelo comportamento das partes (exemplo disso está no recebimento reiterado de parcelas em atraso no contrato de seguro e a posterior mudança de atitude quando do último pagamento, o que quebraria essas expectativas legítimas e levaria a um comportamento contraditório); b) o pagamento faltante há de ser ínfimo em se considerando o total do negócio (correlação é que permite formular um juízo sobre o caráter substancial do adimplemento realizado); c) deve ser possível a conservação da eficácia do negócio sem prejuízo ao direito do credor de pleitear a quantia devida pelos meios ordinários.(REsp 76.362/MT)  

Portanto, os critérios servem de direção para identificar o quão substancial foi o adimplemento ou não. Deve ser verificado o aspecto de valores e o comportamento das partes, principalmente se a inadimplente descumpre reiteradamente o acordado (moras sucessivas) e purga posteriormente a mora, fato que justifica a não aplicação da teoria. 

Somente com a criação de um parâmetro para identificar o “substancial” e a “mora insignificante” será possível controlar a discricionariedade na aplicação, pois em alguns casos a teoria se choca com algum aspecto. 

Recentemente, em 2017, o STJ entendeu pela inaplicabilidade do Adimplemento Substancial nos contratos regidos pelo Decreto-Lei n. 911/69 com as alterações introduzidas pela Lei n. 13.043/2014. A justificativa é que se há lei, esta prevalece sobre construção doutrinária e jurisprudencial. Dessa forma, é possível a busca e apreensão do bem em alienação fiduciária. Argui que se aplicável, o impacto econômico seria grande e traria mais prejuízos aos consumidores, já que os riscos seriam maiores e os custos também. 

A garantia confere segurança ao Banco e, se ele não puder reaver o bem, ao invés de executar o contrato, terá que utilizar outros meios de cobrança para satisfação integral do débito. Com isso, seriam gerados custos à alienação fiduciária e os juros seriam maiores para compensá-los. 

Além disso, descreve que a busca e apreensão é meio de exigir o cumprimento do contrato, pois se o inadimplente purgar a mora, terá a posse do seu bem devolvida 

Retirar o bem da posse do devedor aumentaria ainda mais a inadimplência, pois em alguns casos, o veículo é utilizado para gerar renda. O devedor ao adimplir grande parte age de boa-fé e o credor poderia utilizar-se da execução para realização da obrigação. De acordo com esse entendimento do STJ, a função social do pactuado não estaria sendo cumprida, desrespeitando, inclusive o equilíbrio contratual. 

Nas demais hipóteses, como o caso da parte não quitar as últimas parcelas do seguro do veículo, ainda não há entendimento pacificado e nem lei que discipline, portanto, a jurisprudência coloca como plenamente cabível a aplicação da tese se preenchidos os requisitos. Dessa forma, o proprietário do veículo furtado ainda teria a proteção oferecida pela seguradora, conforme o STJ, Resp 76.362/MT 95. 

Também nos casos, por exemplo, em que há transação de compra e venda em prestações e foram pagas a maioria dessas (TJRS, Apelação Cível 70020393559, 19/12/2007). 

Posto isto, o adimplemento substancial serve de meio para coibir o abuso de direito e possibilitar o equilíbrio contratual. Além disso, impede a extinção do contrato, além de impor dever de cooperação entre credor e devedor.   

CONCLUSÃO

O estudo das obrigações nos traz reflexões sobre as relações entre as partes envolvidas e seus desdobramentos, e essas considerações ganham especial vulto quando nos debruçamos sobre a aplicabilidade da teoria do adimplemento substancial. 

Ao analisarmos as obrigações notamos que se tratam de relações essenciais na vida de todos os indivíduos e suas implicações ainda mais importantes dependendo da forma que essas impactam na vida de cada parte. 

O credor terá a possibilidade de pleitear a resolução contratual caso a parte não cumpra de forma absoluta o combinado. Contudo, no caso da mora poderá ser considerada a manutenção do negócio avençado, mas com as devidas responsabilidades à parte inadimplente. 

Quando o descumprimento é ínfimo, a ponto de não impactar na relação contratual, extinguir o contrato é a pior forma ao devedor. 

Justamente por isso, a jurisprudência adota como certa a serventia do adimplemento substancial, prevendo a permanência do contrato e seus efeitos, mas imputando ao devedor a responsabilidade de arcar com perdas e danos, além de quitar o débito restante. 

Destacamos que essa teoria encontra ampla base doutrinária e aplicação jurisprudencial, apesar de não prevista expressamente em lei. O alicerce justificador do emprego dessa são os princípios da boa-fé objetiva e função social do contrato, pois considera-se a intenção de cooperação entre as partes e o impacto que aquele ajuste causa no todo. 

Assim, destacamos que a tese exposta encontra grande aplicabilidade, sendo necessária para o equilíbrio contratual e evitando o enriquecimento ilícito. 

Os conceitos apresentados sustentam ser necessária a manutenção do acordo pactuado entre as partes, pois foi cumprido praticamente a totalidade do mesmo, não frustrando a expectativa do credor, já que seu direito foi satisfeito e o impacto da pequena parcela descumprida é diminuto se considerado a totalidade. Além disso, o devedor deve ser cobrado da forma menos prejudicial à ele, não ocorrendo o abuso de direito. 

No presente trabalho trouxemos as linhas gerais desta teoria com o objetivo de destacá-la como importante meio na busca do equilíbrio e justiça contratual. 

Na sequência, destacamos a importância da definição dos critérios definidores da mora insignificante, pois somente com a delimitação será possível aplicar o adimplemento substancial, inclusive sem a discricionariedade de cada agente jurídico na aplicação. 

Desta forma, foi possível constatar que através da análise dos parâmetros quantitativo e qualitativo firma-se que deve ser observado se a prestação ainda se faz proveitosa ao credor, além da comparação entre a parcela cumprida em relação ao total para que seja verificado se é ínfimo o inadimplemento. Também se faz necessária a observação do impacto gerado pelo inadimplemento de pequena parte do contrato para ambas as partes e se havia a intenção da parte em cumprir o acordo, ou seja, se agiu de boa-fé e respeitou a pessoa do outro. 

Os efeitos causados pelo inadimplemento devem ser mínimos a ponto de não justificar o cancelamento do contrato, por isso, que a análise dos aspectos objetivos e subjetivos é tão importante, caso contrário, serão causadas injustiças e desigualdade. 

Portanto, os estudos realizados demonstraram que a teoria do adimplemento substancial se revela como atual e necessário instrumento jurídico para proporcionar soluções mais justas e equânimes, prevalecendo a situação fática e com amparo jurídico. 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Código Civil. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/l10406.htm>. Acesso em: 25 maio.2018.  

ANDRIGHI, Fátima Nancy, coordenadora. Responsabilidade civil e inadimplemento no direito brasileiro. 1 ed. São Paulo: Atlas, 2014.  

CARDOSO, Luiz Philipe Tavares de Azevedo. Inadimplemento Antecipado do Contrato no Direito Civil Brasileiro. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2015.  

CAVALLI, Cássio. Mora e utilidade: os standarts da utilidade no modelo jurídico da mora do devedor. 1 ed. Rio de Janeiro: FGV, 2011.  

ENUNCIADOS, CJF. Enunciado 472. Disponível em: <http://www.cjf.jus.br/enunciados/enunciado/472>. Acesso em: 25 julho.2018. 

HORA NETO, João. O princípio da função social do contrato no código civil de 2002. Revista da Esmese, Aracaju, n. 3, p. 199-212,2002. Disponível em: <http://www.esmese.com.br/revistas.htm>. Acesso em: 09 jun. 2018.  

JUSBRASIL. STJ, RECURSO ESPECIAL:1.051.270/RS, Relator Ministro Antônio Carlos Ferreira. DJ: 2015.Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/diarios/126656621/stj-28-09-2016-pg-1457>. Acesso em 01/08/2018  

MARTINS, Lucas Gaspar de Oliveira. Mora, inadimplemento absoluto e adimplemento substancial das obrigações.1 ed. São Paulo: Saraiva, 2011.  

PAULA, Marcos José de. A teoria do adimplemento substancial da obrigação no Brasil. Disponível em: <www.uel.br/revistas/direitoprivado>. Acesso em: 15 maio. 2018.  

SOARES, Renata Domingues de Balbino Munhoz. A boa-fé objetiva e o inadimplemento do contrato: doutrina e jurisprudência. 1 ed. São Paulo: LTr, 2008. 

[1] PAULA, Marcos José de. A teoria do adimplemento substancial da obrigação no Brasil. Disponível em: <www.uel.br/revistas/direitoprivado>. Acesso em: 15 maio. 2018.   

[2] ENUNCIADOS, CJF. Enunciado 472. Disponível em: <http://www.cjf.jus.br/enunciados/enunciado/472>. Acesso em: 25 julho.2018.   

[3] HORA NETO, João. O princípio da função social do contrato no código civil de 2002. Revista da Esmese, Aracaju, n. 3, p. 199-212,2002. Disponível em: <http://www.esmese.com.br/revistas.htm>. Acesso em: 09 jun. 2018   

[4] SOARES, Renata Domingues de Balbino Munhoz. A boa-fé objetiva e o inadimplemento do contrato: doutrina e jurisprudência. 1 ed. São Paulo: LTr, 2008.

[5] PAULA, Marcos José de. A teoria do adimplemento substancial da obrigação no Brasil. Disponível em: <www.uel.br/revistas/direitoprivado>. Acesso em: 15 maio. 2018.  

[6] ANDRIGHI, Fátima Nancy, coordenadora. Responsabilidade civil e inadimplemento no direito brasileiro. 1 ed. São Paulo: Atlas, 2014.   

[7] (STJ, RECURSO ESPECIAL:1.051.270/RS, Relator Ministro Antônio Carlos Ferreira. DJ: 2015. Jusbrasil. 2015.Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/diarios/126656621/stj-28-09-2016-pg-1457>. Acesso em 01/08/2018)   

[8] (STJ, RECURSO ESPECIAL:1.051.270/RS, Relator Ministro Antônio Carlos Ferreira. DJ: 2015. Jusbrasil. 2015.Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/diarios/126656621/stj-28-09-2016-pg-1457>. Acesso em 01/08/2018)

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