Aspectos da adoção internacional no sistema jurídico brasileiro

Aspectos da adoção internacional no sistema jurídico brasileiro

Uma breve análise acerca dos aspectos mais importantes da adoção no Brasil, com enfoque na adoção internacional.

1 – Adoção: Conceituação e Natureza Jurídica

Há uma extensa problemática em conceituar o instituto da adoção, o que é observado na diversidade de definições encontradas na doutrina. Carlos Roberto Gonçalves a conceitua como um ato jurídico solene, pelo qual alguém recebe em sua família, na qualidade de filho, pessoa a ela estranha. É regulamentada, especialmente, pelo ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), a partir de seu artigo 39.

Apesar de completamente legal, a previsão da adoção é de caráter excepcional, pois sempre irá se prezar pela convivência da criança ou do adolescente com sua família natural, ou seja, seus pais e irmãos biológicos, além da família por extensão, que podem ser os avós, primos, tios, etc. Sendo assim, a adoção ocorrerá apenas quando restarem esgotadas todas as tentativas de manutenção da criança com sua família natural. Deve se atentar, com isso, ao princípio do melhor interesse da criança. Se houver mais benefício em manter a criança numa família substituta adotiva, assim será feito, mas tudo deverá ser analisado a partir de cada caso concreto.

Com o advento da Constituição Federal de 1988, não mais se admite a adoção feita por procuração, ou seja, apenas como um contrato entre as partes. É necessário todo um processo judicial que regule a situação jurídica entre adotante e adotado, fazendo jus ao princípio da legalidade, e sempre visando o maior benefício do menor. Isto, pois, segundo Gonçalves, a adoção deixa de ser uma matéria que só importa às partes, tornando-se de interesse público.

Sendo assim, a adoção, como o casamento, possui natureza híbrida: em sua formação, depende de um ato de vontade das partes, que são submetidas aos requisitos peculiares para a efetivação do instituto; e, em seguida, o status que gera em toda a sociedade, de natureza institucional, com a sentença solene proferida pelo juiz, e todos os seus efeitos.

Com a adoção, o adotado recebe a condição de filho, em relação à família substituta, com os mesmos direitos e deveres, inclusive os de cunho sucessório. Com isto, deve se prezar pelo princípio da igualdade jurídica entre os filhos, pois não poderá haver qualquer diferenciação entre aqueles consanguíneos, com os adotivos, ou qualquer outro caráter que os discrimine, de alguma forma. O adotado terá todos os laços com sua família consanguínea rompidos, exceto, obviamente, aqueles concernentes aos impedimentos matrimoniais.

2 – Quem pode adotar ou ser adotado

Primeiramente, vale ressalvar que a adoção no Brasil pode ser realizada de duas maneiras: individual, ou conjunta.

Quando a adoção é realizada apenas por uma pessoa, segundo o que está previsto no artigo 42 do ECA, será necessário que esta tenha mais de 18 anos, e, neste caso, não importará o estado civil, o sexo e a nacionalidade do adotante. Apenas está implícito que deverá ter condições essenciais (morais e materiais) para assumir a responsabilidade de se tornar pai de uma criança carente, com todos os encargos que isto acarreta. Quando analisada a situação do adotante, e encontrada alguma irregularidade, fica vedada pela legislação até mesmo sua inscrição no cadastro nacional de pessoas interessadas à adoção.

A única ressalva feita pelo ECA quanto a esta modalidade de adoção está no § 1º do mesmo artigo, em que fica expresso que os ascendentes e irmãos do adotando não podem realizar a adoção. Por fim, o adotante deverá ser, no mínimo, dezesseis anos mais velho que o adotando, e isto valerá para todas as modalidades de adoção, inclusive a conjunta.

O § 2º do ECA, por sua vez, trata da referida adoção conjunta. Regula que, para ela ser realizada, os adotantes precisam estar casados civilmente, independentemente do regime de bens, ou manter, ao menos uma relação de união estável, que comprove a estabilidade da família.

Não é impedido que os casais divorciados, judicialmente separados ou ex companheiros adotem conjuntamente, desde que comprovado que o estágio de convivência com a criança tenha ocorrido no período de convivência entre os adotantes, que haja traços de afinidade e afetividade com aquele que não é detentor da guarda, e que, no momento da adoção, seja acordado sobre guarda e regime de visitas. Poderá, inclusive, ser concedida a guarda compartilhada, se verificado que benéfico ao adotando.

Um último requisito para todas as adoções é o consentimento dos pais biológicos ou representantes legais do adotando. Se ele for maior de 12 anos, também dependerá, para ser realizada a adoção, o consentimento do menor.

A adoção, para ser válida, deverá ser precedida por estágio de convivência de, no mínimo, 90 (noventa) dias, de acordo com a idade da criança ou com as peculiaridades de cada caso concreto. Este estágio será dispensado, caso já houver período de tutela ou curatela do adotando com a família substitutiva, que permita avaliar a conveniência da instituição do vínculo, o que não ocorre quando existe apenas a guarda de fato da criança ou adolescente.

Em relação àqueles que podem ser adotados, há a possibilidade quanto a crianças, adolescentes ou maiores, sendo este instituto realizado mediante processo judicial, em todos os casos. Para a adoção de maiores de 18 anos, utiliza-se tudo o que couber, quanto à adoção de menores, com assistência efetiva do poder público e sentença constitutiva.

Um ponto importante em relação aos adotandos é a adoção conjunta, que ocorre sempre que grupos de irmãos precisam ser adotados. É necessário que eles sejam adotados juntos, buscando evitar o rompimento de vínculo fraternal. Esta previsão tem apenas exceção quando estiver comprovada a existência de risco de abuso ou qualquer outra situação justificável.  

3 – Da adoção internacional

Para a adoção internacional, não é utilizado o previsto pelo Código Civil, que regulamenta a adoção ordinária, realizada entre brasileiros. Segundo o artigo 51 do ECA, essa modalidade de adoção ocorre quando o pretendente possui residência em país que faça parte da Convenção de Haia, de 29 de maio de 1993, relativa à Proteção das Crianças e à Cooperação em Matéria de Adoção Internacional (Decreto 3.087/99), e tenha a intenção de adotar uma criança de outro país que tenha assinado a esta convenção.

Tem como característica uma maior regulamentação, pois, alvo de muitas polêmicas, foi questionado se não abriria precedentes para o sequestro e tráfico internacional de crianças e adolescentes, corrupção, além de tornar difícil, quase impossível, o acompanhamento obrigatório destas crianças, no exterior, pelos órgãos que acompanham os adotados após a sentença que concedeu a adoção. Muitos também argumentam que ocasionaria uma violação ao direito de identidade da criança.

3.1 – Requisitos da adoção internacional

Os requisitos essenciais para que ocorra a adoção internacional no Brasil estão previstos no artigo 51 da Lei 8.069/1990 (ECA). O § 1º enumera o que deve estar comprovado para que isto possa se realizar:

O inciso I baseia-se no princípio do melhor interesse da criança, ou seja, busca a melhor adequação para o caso concreto, o que trará maiores benefícios para o adotando. Maria Helena Diniz ressalva que seria errôneo mensurar o amor de um pai, classificando-o como nacional ou estrangeiro. Ainda assim, é de extrema relevância que se analise todos os pormenores da adoção, como é feito na adoção entre brasileiros, mas claro que com muito mais rigor. É possível também que brasileiros residentes no exterior adotem crianças no Brasil, e estes terão preferência em detrimento a estrangeiros.

 Para que uma criança ou adolescente possa ser amparada por uma família estrangeira, deverá ser feito, estritamente, a e adoção. Ainda assim, será medida de extrema excepcionalidade, prevista apenas quando estiverem esgotadas todas as possibilidades de inserir este menor em família adotiva brasileira, o que está previsto no inciso II do mesmo parágrafo.

O inciso III solicita que, em caso de adoção de adolescente, este seja consultado, por meios adequados ao seu estágio de desenvolvimento, para se analisar se encontra mesmo apto para a medida adotiva, mediante um parecer realizado por equipe interdisciplinar.   

Deverá haver uma intervenção de Autoridades Centrais Estaduais e Federais quando se tratar de matéria de adoção internacional.

Também há uma série de outros requisitos regulamentados no ECA, a este respeito. O artigo 52 prevê as adaptações quanto à aplicação dos artigos 165 a 170 desta lei, redação inclusa pela lei 12.010/2009.

Como anteriormente citado, a adoção internacional é regulada diferentemente da brasileira, contendo um rol de requisitos muito mais amplo. Além dos que já foram citados, há também os previstos no artigo 52 do ECA, em seus diversos incisos e parágrafos.

No caso de interesse da pessoa ou casal estrangeiro em adotar uma criança brasileira, deverá ser formulado um pedido de habilitação à adoção à Autoridade Central, em matéria de adoção no país da acolhida, ou seja, aquele em que se encontra sua residência habitual. Depois disso, caso se entenda que os pretendentes a adotantes estão aptos e habilitados a adotar, será emitido um relatório acerca das qualidades e características dos adotantes, assim como sua aptidão para realizarem uma adoção internacional. Uma cópia deste relatório deverá ser enviada à Autoridade Central Brasileira, instruído com toda a documentação necessária, inclusive estudo psicossocial.

Todo e qualquer documento em língua estrangeira deverá também ser traduzido por tradutor público juramentado. Após todos os trâmites legais necessários, será expedido um laudo que autoriza a adoção internacional, com validade de um ano. Já de posse deste laudo, o interessado está autorizado a formalizar o pedido de adoção internacional perante a Vara de Infância e Juventude de onde a criança se encontre.

Carlos Roberto Gonçalves entende que o laudo emitido pela Comissão poderá ser dispensado, em casos excepcionais, quando analisado o princípio do melhor interesse da criança. Por exemplo, quando há indícios de afetividade tamanha do menor para com o casal estrangeiro, de tal modo que a não concessão da adoção seria sofrimento para os pais e para o menor, podendo gerar problemas com consequências potencialmente irreparáveis, com, até mesmo, risco de danos psicológicos, entre outras situações de fato.

Nestes casos, embora não haja qualquer regularidade formal na adoção, ela poderá ser expedida, pois a finalidade de tantas regras e proteções em relação à adoção internacional é justamente proteger o menor de qualquer risco que ele poderia correr, sem a proteção da alçada jurídica brasileira. Nas situações em que isto não acontece, e em que são visíveis os laços de carinho e afetividade entre os adotantes e adotandos, as formalidades podem ser deixadas de lado, com o intuito de preservar os interesses da criança.

4 – Referências Bibliográficas

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, Volume 6: Direito de Família. 9. Ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente, Câmera dos Deputados, Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/leis/L8069.htm>. Acesso em: 05 de março de 2018.

Sobre o(a) autor(a)
Verônica de Souza Ferreira
Graduação e Licenciatura Plena em Letras - 2013 (Barão de Mauá - Ribeirão Preto) Graduação em Direito - 2014 a 2018 (UNAERP - Universidade de Ribeirão Preto - Campus Ribeirão)
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