Jornalista impedido de viajar com a filha não consegue indenização por danos morais
A indenização por danos morais só se justifica quando ocorrer situação
humilhante ou o cidadão for submetido a constrangimento desnecessário e
desarrazoado. Tendo agido a funcionária da empresa aérea dentro dos
limites de sua função, no estrito cumprimento de seu dever, cobrando o
cumprimento de uma exigência que decorre da lei, descabe, no caso,
qualquer indenização por danos morais. Com esse entendimento, a
Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, com base em voto da
presidente da Turma, ministra Nancy Andrighi, acolheu recurso da Vasp e
julgou improcedente o pedido de indenização por danos morais do
jornalista Carlos Raymundo Lagoeiro, do Rio de Janeiro.
Segundo o processo, o jornalista, que também é ator, reside em
Amsterdã, na Holanda, onde trabalha para a Rádio Nederland, emissora
internacional daquele país. Juntamente com a mulher e dois filhos
menores, veio passar as festas de fim de ano de 1999 no Rio de Janeiro.
Ao tentar voltar para a Holanda, em 13 de janeiro de 2000, com sua
filha Tainá Moreno, de 12 anos, em vôo da Vasp, a menina foi impedida
de embarcar. A supervisora do turno diurno da empresa aérea não aceitou
que a menor embarcasse desacompanhada da mãe, mesmo com a mãe presente
e autorizando o embarque perante a Polícia Federal. A funcionária
exigiu que a autorização assinada pela mãe estivesse com a firma
devidamente reconhecida. Em face disso, o embarque dos dois, pai e
filha, foi adiado para uma semana depois, no dia 20, oportunidade em
que embarcaram sem qualquer problema no mesmo vôo que não haviam podido
tomar uma semana antes, apresentando o mesmo documento anteriormente
recusado.
Como resultado desse ato, o jornalista teve vários contratempos em sua
vida profissional, inclusive o atraso de uma peça de teatro que estava
montando em Amsterdã, e a pequena Tainá Moreno ficou sem tempo para
estudar para um importante exame, uma espécie de vestibular antecipado
que define, com base na quantidade de pontos conseguidos pelo estudante
nas provas, em qual escola vai ser matriculado. Em razão dos
transtornos sofridos, o jornalista entrou com processo contra a empresa
aérea, pedindo 400 salários mínimos a título de indenização por danos
morais, além das custas do processo e do pagamento dos honorários de
seu advogado.
A sentença julgou improcedente o pedido de indenização, mas a Terceira
Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro acolheu
o recurso de Carlos Lagoeiro, condenando a Vasp a pagar-lhe 100
salários mínimos pelos danos morais. Por unanimidade, o TJ/RJ entendeu
ter ocorrido realmente o dano moral alegado pelo passageiro,
considerando abusiva a recusa da autorização legal concedida pela mãe
perante a Polícia Federal, que tem fé pública. Para o TJ/RJ, tanto
assim foi que, uma semana depois, com a mesma documentação recusada na
primeira vez, o jornalista e sua filha puderam embarcar tranqüilamente,
sem que nada lhes fosse exigido a mais.
Ao examinar o recurso da Vasp contra essa decisão, a relatora do
processo no STJ, ministra Nancy Andrighi, argumentou que, no seu
entender, não houve, no caso, qualquer conduta ilícita praticada pela
empresa aérea. Para a ministra, aquela agiu no estrito cumprimento da
lei, ao exigir a apresentação da autorização materna para o embarque da
menor, com firma reconhecida. A ministra assegurou que tanto o Estatuto
da Criança e do Adolescente quanto a Portaria do DAC exigem a
apresentação de autorização expressa do pai que não acompanhar o menor,
com firma reconhecida, não tendo a assinatura de declaração diante de
agente da Polícia Federal o condão de substituir a forma expressamente
exigida pela lei para a prática do ato.
Assim, entendendo que a validade de um ato jurídico requer o
cumprimento da formalidade exigida em lei para a sua prática, devendo o
ato ser considerado inválido quando deixar de se revestir das
formalidades legalmente exigidas, a ministra Nancy Andrighi deu
provimento ao recurso da Vasp, para julgar improcedente o pedido de
indenização por danos morais do jornalista Carlos Lagoeiro.