Colusão só se caracteriza se objetivo for fraudar a lei
A Subseção 2 Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal
Superior do Trabalho (SDI-2) negou provimento a um recurso do
Ministério Público do Trabalho que pretendia caracterizar a existência
de colusão (conluio) entre a Industrial Boituva de Alimentos e o
advogado de uma ex-empregada da indústria na celebração de um acordo
homologado judicialmente. A Seção entendeu que o acordo abrangia a
quitação das verbas relativas ao extinto contrato de trabalho, sendo
portanto um ato válido.
O relator do recurso ordinário em ação rescisória, ministro
Emmanoel Pereira, fundamentou seu voto no fato de que uma sentença
homologatória de acordo judicial, mesmo pondo fim às controvérsias
entre as partes, é um acerto feito por iniciativa das próprias partes
mediante concessões recíprocas, o que impede a possibilidade de ser
rescindido com base no Código de Processo Civil (art. 485, inciso III).
A petição do acordo foi homologada pela 3ª Vara do Trabalho de Novo
Hamburgo (RS). Pelos termos acordados, a empresa pagaria à ex-empregada
o valor de R$ 2.250,00 em três parcelas. Na inicial da reclamação,
constavam o pedido de verbas rescisórias e de parcelas estritamente
salariais.
Mais tarde, a ex-empregada envolvida ajuizou nova reclamatória
trabalhista, com outros advogados. Ela afirmava não ter procurado o
advogado que firmou a primeira petição, tendo sido tudo "providenciado
dentro da empresa, inclusive o acordo". O Ministério Público do
Trabalho, então, entrou com a ação rescisória visando a rescindir a
sentença que homologou o acordo, sustentando ter havido um processo
forjado, no intuito de obter fins ilícitos, citando inclusive outros
processos simulados envolvendo a empresa. Para o Ministério Público,
estaria evidente a colusão entre as partes, com a participação do
advogado que representou a ex-empregada, resultando numa transação
viciada que não traduziria a real vontade da trabalhadora.
O Tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul (4ª Região),
entretanto, julgou a rescisória improcedente por considerar que não foi
caracterizada a existência de colusão e vício de consentimento
suficientes para invalidar a transação. Contra essa decisão, o
Ministério Público propôs o recurso ordinário em ação rescisória ao
TST.
A decisão da SDI-2 que negou provimento ao recurso do Ministério
Público levou em conta o fato de não haver, nos autos, indícios e
presunções suficientes para configurar a colusão, e ressaltou a
diferença entre processo simulado e processo fraudulento: "no processo
simulado, as partes não têm interesse real na produção dos efeitos
jurídicos do processo, enquanto que no processo fraudulento têm, e de
tais efeitos normais se querem aproveitar, usando de fraude para
conseguir esse resultado", diz o voto do relator. "Somente a colusão
para fraudar a lei é contemplada no CPC. A pretensa simulação do
processo não é motivo de invalidação do acordo, porque esta só é
cabível quando há vício de consentimento".
Ao analisar o processo, o ministro Emmanoel Pereira observou que o
valor global ajustado no acordo incluía a multa por atraso no pagamento
de verbas rescisórias, "não havendo qualquer vício que contaminasse o
ajuste". O relator ressaltou também que a reclamante (trabalhadora)
participou da audiência, invalidando a hipótese de erro sobre sua
finalidade, que era a de encerrar o processo com a quitação das verbas
rescisórias. Emmanoel Pereira lembrou que "a parte sabia da utilidade e
finalidade do ato jurídico que estava promovendo, não se tratando,
assim, de ocorrência de vício de consentimento mas de ajuste mediante
concessões recíprocas livremente manifestadas".