Trabalho em navio estrangeiro: contratação de camareira seguirá norma internacional

Trabalho em navio estrangeiro: contratação de camareira seguirá norma internacional

A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho decidiu pela aplicação da Convenção 186 da Internacional da Organização Internacional do Trabalho (OIT), referente ao trabalho marítimo, ao contrato de uma camareira da Royal Caribbean Cruzeiros (Brasil) Ltda., com sede em São Paulo (SP). Ela foi contratada no Brasil para prestar serviços em navio de cruzeiro com bandeira das Bahamas, em águas internacionais, e, segundo o colegiado, a norma internacional é mais benéfica, no conjunto, do que qualquer outro diploma legal.

CLT

A camareira relatou, na reclamação trabalhista, que fora contratada em São Paulo em abril de 2007 e embarcara pela primeira vez no mês seguinte, em Nova Jersey, nos Estados Unidos. Durante nove anos, ela atuou em navios da Royal Caribbean em rotas nacionais e internacionais até ser demitida, em fevereiro de 2016, quando estava grávida.

Ela pedia o reconhecimento do vínculo de emprego mediante a aplicação da legislação brasileira, com o argumento de que, apesar de a embarcação pertencer às Bahamas, a vaga fora proposta no Brasil, onde também participara do processo seletivo. Na sua avaliação, a aplicação da legislação nacional seria mais benéfica.

Antinomias

Por sua vez, a Royal Caribbean alegou antinomias entre a regra geral em direito internacional quanto à aplicação da Lei do Pavilhão (segundo a qual as relações de trabalho da tripulação são regidas pelas leis do local da matrícula da embarcação), consagrada em duas convenções internacionais ratificadas pelo Brasil, e a norma celetista, que não tem disposições específicas sobre o trabalho marítimo. 

Mais benéfica

Em maio de 2018, o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP) reconheceu o vínculo e determinou a aplicação da legislação brasileira. O fundamento foi o artigo 3º da Lei 7.064/1982, que dispõe sobre a situação de pessoas contratadas ou transferidas para prestar serviços no exterior e determina a incidência da lei que lhes seja mais benéfica. Segundo o TRT, todo o processo de contratação (oferta de emprego, exigência de exames médicos e emissão de passaporte e vistos de trabalho) havia se desenrolado no Brasil. 

Princípio da igualdade

No TST, o voto do relator do recurso de revista da Royal Caribbean, ministro Agra Belmonte, foi para reconhecer a incidência dos tratados internacionais, devidamente ratificados pelo Brasil, que reconhecem a aplicação da “Legislação do Pavilhão”. No caso, a embarcação tem bandeira das Bahamas, que ratificou a Convenção 186 da OIT. Para o ministro, essa norma deve ser aplicada em detrimento da legislação nacional, “a fim de enaltecer, inclusive, o princípio da igualdade”, uma vez que o regramento nela previsto é específico para os marítimos, “uniformizando, dessa forma, a aplicação dos direitos da categoria”.

Situação jurídica

O relator observou que a jurisprudência majoritária do TST era pela aplicação da legislação nacional, ainda que se tratasse de prestação de serviços em navios que naveguem em águas brasileiras e estrangeiras, com preponderância em águas internacionais. Todavia, a seu ver, os argumentos que justificam a aplicação da legislação estrangeira são convincentes e representam a melhor solução jurídica aplicável ao caso. 

Trabalho decente

Ainda ao defender a aplicação da Convenção 186, o ministro ressaltou que ela consolida e atualiza 68 convenções e recomendações para o setor marítimo adotadas ao longo dos 90 anos de existência da OIT. “A Convenção estabelece direitos e condições decentes de trabalho em diversas áreas e busca ser aplicável internacionalmente, a fim de uniformizar as relações de trabalho neste setor”, concluiu.

A decisão foi por maioria, vencida a ministra Delaíde Miranda Arantes. O processo, agora, retornará à origem para que os pedidos sejam examinados sob o enfoque da convenção internacional.

Processo: ARR-1001602-25.2016.5.02.0080 

I - AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO
DE REVISTA DAS RECLAMADAS EM FACE DE
DECISÃO PUBLICADA APÓS A VIGÊNCIA DAS
LEIS Nº 13.015/2014 E 13.467/2017.
TRABALHO EM CRUZEIROS MARÍTIMOS QUE
NAVEGAM EM ÁGUAS SUPRANACIONAIS.
LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. CONFLITO ENTRE A
LEGISLAÇÃO NACIONAL E OS TRATADOS
INTERNACIONAIS. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
ANTERIOR À RATIFICAÇÃO DA CONVENÇÃO
186 DA OIT (MARÍTIMOS). TRANSCENDÊNCIA
JURÍDICA. A controvérsia enseja o
reconhecimento da transcendência jurídica do
recurso, nos termos do art. 896-A, §1º, IV, da
CLT. Diante de possível violação do artigo 178
da Constituição Federal, dá-se provimento ao
agravo de instrumento para melhor exame do
recurso de revista. Agravo de instrumento
conhecido e provido.
II – RECURSO DE REVISTA DAS RECLAMADAS.
TRABALHO EM CRUZEIROS MARÍTIMOS QUE
NAVEGAM EM ÁGUAS SUPRANACIONAIS.
LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. CONFLITO ENTRE A
LEGISLAÇÃO NACIONAL E OS TRATADOS
INTERNACIONAIS. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
ANTERIOR À RATIFICAÇÃO DA CONVENÇÃO
186 DA OIT (MARÍTIMOS)

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (TST - Tribunal Superior do Trabalho) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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