Configuração do crime tentado exige início da ação prevista no verbo do tipo penal

Configuração do crime tentado exige início da ação prevista no verbo do tipo penal

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que, para se configurar a modalidade tentada de um crime, é necessário que o agente comece a praticar a ação descrita pelo verbo correspondente ao núcleo do tipo penal.

Com esse entendimento, os ministros negaram provimento ao recurso em que o Ministério Público do Tocantins buscava a condenação de dois homens por tentativa de roubo. Eles foram flagrados pela polícia com uma arma de fogo, após romperem o cadeado e destruírem a fechadura de uma residência com o objetivo de roubá-la.

Para o colegiado, no entanto, a ação dos dois configurou meros atos preparatórios – o que impede a condenação por tentativa de roubo circunstanciado, uma vez que não iniciaram a ação de "subtrair", núcleo verbal do artigo 157 do Código Penal.

Divergência sobre a configuração do crime tentado

O relator, ministro Ribeiro Dantas, destacou que, segundo o artigo 14, II, do Código Penal, o crime é considerado tentado quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente. "O texto legal é muito aberto, não trazendo maior clareza ou precisão a respeito de algo que concretamente possa indicar quando a execução de um crime é iniciada, talvez por não se tratar de uma missão humanamente simples, sendo ela objeto de debates também em outros países", ponderou.

Segundo o magistrado, a doutrina de Eugenio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangeli entende que o problema mais crítico da tentativa é determinar a diferença entre os atos executivos e os preparatórios. Os autores, afirmou, adotam o chamado critério objetivo-individual, para o qual a tentativa começa com a atividade do agente que, segundo o seu plano concretamente delitivo, se aproxima da realização.

Outra vertente, explicou Ribeiro Dantas, é uma variante do critério objetivo-individual que requer "comportamento manifestado em execução específica do tipo, segundo o plano do autor, numa conexão ou semelhança muito grande com a teoria objetivo-formal, que exige o início da realização do núcleo da norma penal incriminadora". De acordo com o relator, nessa perspectiva, seriam condutas meramente preparatórias dirigir-se ao local da subtração patrimonial (ainda que portando armas), montar mecanismo de arrombamento no local etc.

Não há jurisprudência dominante sobre o tema

Apesar de não haver jurisprudência dominante a respeito da questão, o ministro apontou precedente em que a Terceira Seção analisou o caso de duas pessoas que foram presas, armadas, em frente a uma agência dos Correios e confessaram a intenção de cometer um assalto, depois de terem observado o ponto por alguns dias para saber o horário dos malotes de uma instituição financeira. Por não reconhecer a tentativa de roubo à agência da empresa pública, a seção afastou a competência da Justiça Federal.

Naquele julgamento, destacou Ribeiro Dantas, o colegiado consignou que não se poderia imputar aos réus a prática de roubo circunstanciado tentado, pois em nenhum momento ocorreu o início da conduta tipificada no artigo 157 do Código Penal.

"A despeito da controvérsia doutrinária e da abertura legal, o que afasta a existência de uma única resposta certa para fixar o entendimento jurídico sobre a matéria, parece ser possível empregar o mesmo raciocínio do julgado acima transcrito, entendendo que esta corte tem a tendência de seguir a corrente objetivo-formal, exigindo o início da prática do verbo correspondente ao núcleo do tipo penal para a configuração da tentativa", concluiu.

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 974.254 - TO (2016/0227450-9)
RELATOR : MINISTRO RIBEIRO DANTAS
AGRAVANTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO TOCANTINS
AGRAVADO : VINICIUS CAMARGO RANGEL
AGRAVADO : WALLYSSON NUNES MARINHO
ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO TOCANTINS
EMENTA
PENAL. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. TENTATIVA. TEORIA
OBJETIVO-FORMAL. INÍCIO DA PRÁTICA DO NÚCLEO DO TIPO.
NECESSIDADE. QUEBRA DE CADEADO E FECHADURA DA CASA DA
VÍTIMA. ATOS MERAMENTE PREPARATÓRIOS. AGRAVO
CONHECIDO. RECURSO ESPECIAL ADMITIDO, PORÉM IMPROVIDO.
1. A despeito da vagueza do art. 14, II, do CP, e da controvérsia doutrinária sobre
a matéria, aplica-se o mesmo raciocínio já desenvolvido pela Terceira Seção deste
Tribunal (CC 56.209/MA), por meio do qual se deduz a adoção da teoria
objetivo-formal para a separação entre atos preparatórios e atos de execução,
exigindo-se para a configuração da tentativa que haja início da prática do núcleo
do tipo penal.
2. O rompimento de cadeado e a destruição de fechadura de portas da casa da
vítima, com o intuito de, mediante uso de arma de fogo, efetuar subtração
patrimonial da residência, configuram meros atos preparatórios que impedem a
condenação por tentativa de roubo circunstanciado.
3. Agravo conhecido, para admitir o recurso especial, mas negando-lhe
provimento.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar
provimento ao agravo regimental. Os Srs. Ministros Joel Ilan Paciornik, Jesuíno Rissato
(Desembargador Convocado do TJDFT) (voto-vista), João Otávio de Noronha e Reynaldo
Soares da Fonseca votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 21 de setembro de 2021 (data do julgamento)
MINISTRO RIBEIRO DANTAS
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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