Constituição do devedor assistido pela DP em fiel depositário exige intimação pessoal

Constituição do devedor assistido pela DP em fiel depositário exige intimação pessoal

É imprescindível a intimação pessoal do devedor assistido pela Defensoria Pública (DP) para a sua constituição como depositário fiel do imóvel penhorado por termo nos autos. O entendimento foi firmado, por maioria, pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao discutir a validade de intimação dirigida à DP com o objetivo de constituir o devedor assistido como depositário do bem.

O recurso especial analisado pela turma foi interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que entendeu não ser necessária a intimação pessoal do devedor quando houver procurador no processo, mesmo que seja defensor dativo.

O recorrente alegou violação do artigo 659, parágrafo 5º, do Código de Processo Civil de 1973 e do artigo 16 da Lei Federal 1.060/1950 (Lei de Assistência Judiciária), reiterando a necessidade da intimação pessoal, pois é assistido pela DP, cujos membros não se enquadram no conceito de "advogado" para os fins previstos no CPC/1973.

Distinção entre advogado constituído pela parte e defensor público

No voto que prevaleceu no colegiado, a ministra Isabel Gallotti afirmou que é preciso levar em conta a distinção entre o defensor constituído pela parte e o defensor público, que atua por obrigação legal, sem escolha e sem uma relação prévia de confiança. Nesse contexto – acrescentou a magistrada –, o defensor público atua em juízo apenas com os poderes relacionados à procuração geral para o foro, pois o exercício de poderes especiais exige mandato com cláusula expressa.

Com base na doutrina, a magistrada afirmou que a natureza do ato a ser praticado – atos processuais, que exigem capacidade postulatória, ou atos materiais, que envolvem o cumprimento de obrigações – define o destinatário da intimação, se a própria parte ou o seu procurador.

Diante das responsabilidades civis e penais do depositário – papel atribuído preferencialmente ao devedor no CPC/1973 –, Gallotti ressaltou que a constituição desse encargo não pode ser considerada um ato puramente processual. As turmas de direito privado do STJ, inclusive, entendem que é indispensável a assunção pessoal do encargo por parte do depositário, ou ao menos a assinatura do termo por procurador com poderes especiais – situação que não é a do defensor público.

Papel de depositário fiel pode ser recusado

No caso da constituição de depositário de bem penhorado, Gallotti observou ainda que o encargo pode ser recusado, como estabelecido na Súmula 319/STJ, e essa possibilidade somente será respeitada se a parte tiver a opção de fazê-lo antes e de modo pessoal, não bastando a hipótese de requerer posteriormente ao juízo a sua exoneração.

"Isso porque as situações caracterizadoras de responsabilidade civil e criminal do depositário já podem estar, inclusive, concretizadas em razão da ausência de ciência pessoal do devedor, que já pode ter alienado ou instituído gravame sobre o bem penhorado", explicou a ministra.

Embora o CPC/1973 não previsse de forma expressa a necessidade de intimação pessoal da parte assistida pela DP – apontou Gallotti –, o CPC/2015 foi explícito em diversos artigos a respeito dessa obrigatoriedade. "Evidencia-se, portanto, que há clara diferença na relação representante-representado quando o advogado é designado, e não constituído voluntária e pessoalmente pela parte", afirmou.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.331.719 - SP (2012/0134720-5)
RELATOR : MINISTRO ANTONIO CARLOS FERREIRA
R.P/ACÓRDÃO : MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI
RECORRENTE : LUIZ ANTÔNIO DO AMARAL
ADVOGADO : RAFAEL VALLE VERNASCHI - DEFENSOR PÚBLICO E
OUTROS - SP226639
RECORRIDO : CONDOMÍNIO EDIFÍCIO SAIN MARTIN
ADVOGADO : ROBERTO MASSAO YAMAMOTO E OUTRO(S) - SP125394
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. PENHORA. CONSTITUIÇÃO DO
DEVEDOR COMO DEPOSITÁRIO FIEL. ART. 659, § 5°, DO CPC/73. DEVEDOR
ASSISTIDO PELA DEFENSORIA PÚBLICA. INTIMAÇÃO PESSOAL DO ASSISTIDO.
NECESSIDADE. PECULIARIDADE EM RELAÇÃO AO DEFENSOR CONSTITUÍDO.
REPRESENTAÇÃO LEGAL. PODERES DE PROCURAÇÃO GERAL PARA O FORO.
DISTINÇÃO DE ATOS PURAMENTE PROCESSUAIS DOS ATOS MATERIAIS.
POSSIBILIDADE DE RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL E PENAL. SÚMULA N° 319/STJ.
CONCRETIZAÇÃO SUBSTANCIAL DA DEFESA EFETIVA.
1. A diferença entre a intimação pessoal da parte e aquela realizada na figura do
Defensor possui relevância quando analisada à luz da natureza jurídica do conteúdo do
ato objeto da intimação, em virtude da existência de atos meramente processuais e
atos materiais, que demandam atuação da parte representada, como a aceitação e
constituição do devedor como depositário fiel do bem penhorado.
2. Importa igualmente destacar a distinção entre o defensor constituído pela parte e o
Defensor Público ou defensor dativo, mormente ao se considerar que essa
representação em juízo, justamente por ser constituída legalmente, dispensa a
apresentação de mandato, possuindo o defensor apenas os poderes relacionados à
procuração geral para o foro, visto que o exercício de poderes especiais demanda
mandato com cláusula expressa, conforme o disposto nos artigos 38, caput, do CPC/73
e 16, parágrafo único, “a”, da Lei n° 1.060/50.
3. É necessária, portanto, a intimação pessoal do devedor assistido pela Defensoria
Pública para que seja constituído como depositário fiel do bem imóvel penhorado por
termo nos autos, como pressuposto lógico do comando contido na Súmula n° 319/STJ,
seja em virtude de o ato possuir conteúdo de direito material e demandar
comportamento positivo da parte, b) seja em razão de o Defensor, na condição de
defensor nomeado e não constituído pela parte, exercer múnus público que impede o
seu enquadramento no conceito de “advogado” para os fins previstos no artigo 659, §
5°, do CPC/73, possuindo apenas, via de regra, poderes gerais para o foro.
4. Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Prosseguindo no julgamento, após o voto do Ministro Luis Felipe Salomão
acompanhando a divergência, a Quarta Turma, por maioria, deu provimento ao recurso
especial, nos termos do voto divergente da Ministra Maria Isabel Gallotti, que lavrará o
acórdão. Vencido o relator. Votou vencido o Sr. Ministro Antonio Carlos Ferreira.
Votaram com a Sra. Ministra Maria Isabel Gallotti os Srs. Ministros Luis
Felipe Salomão e Raul Araújo.
Não participou do julgamento o Sr. Ministro Marco Buzzi.
Brasília/DF, 03 de agosto de 2021(Data do Julgamento)
MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI
Relatora

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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