Crédito oriundo de fato ilícito anterior à recuperação deve ser habilitado no plano, mas correção se limita à data do pedido

Crédito oriundo de fato ilícito anterior à recuperação deve ser habilitado no plano, mas correção se limita à data do pedido

Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o crédito decorrente de fato ilícito praticado antes do pedido de recuperação judicial deve ser habilitado no plano correspondente, razão pela qual a incidência de correção monetária está limitada à data do deferimento do pedido de recuperação (artigo 9º, II, da Lei 11.101/2005).

Com base nesse entendimento, o colegiado deu provimento a recurso especial da Oi S.A. contra acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) que havia decidido que a atualização monetária do crédito deveria ocorrer até o efetivo pagamento.

A controvérsia teve origem em pedido de complementação de ações ajuizado por uma credora contra a Oi, com conversão em perdas e danos, em fase de liquidação de sentença, na qual se discutia a data de referência para os valores das ações e o termo final da incidência de correção monetária.

No recurso especial apresentado ao STJ, a Oi alegou que, em virtude da necessidade de tratamento igualitário entre todos os credores – e, adicionalmente, da novação inerente ao deferimento do pedido de recuperação –, a atualização monetária dos créditos contra a empresa recuperanda deve ser limitada até a data do pronunciamento judicial que autoriza a recuperação.

Data da constituição do crédito e sua submissão ao plano

Segundo a relatora, ministra Nancy Andrighi, a jurisprudência do STJ adota a orientação de que, para fins de submissão ao plano de recuperação, a data de constituição do crédito, na responsabilidade civil, é a data da configuração do evento danoso, mesmo que sua liquidação ocorra após o deferimento do pedido recuperacional.

A relatora esclareceu que, por esse motivo, o crédito proveniente de responsabilidade civil por fato anterior ao deferimento da recuperação judicial deve ser habilitado e incluído no plano de soerguimento da empresa, ficando, assim, afastada a previsão do art. 49 da Lei 11.101/05, que exclui do plano de recuperação os créditos inexistentes na data do deferimento do pedido.A exceção a essa previsão, observou a magistrada, só acontece pela opção expressa do credor de não perseguir seu crédito por meio da recuperação, optando por tentar recebê-lo após encerrado o processo de soerguimento (REsp 1.873.572).

Tratamento igualitário dos credores

Para Nancy Andrighi, tendo em vista que até mesmo os créditos constituídos anteriormente, mas ilíquidos no momento do pedido de recuperação, devem ser habilitados no plano, aceitar a incidência de juros de mora e correção monetária em data posterior ao pedido da recuperação implicaria negar vigência ao artigo 9º, inciso II, da Lei de Recuperação e Falências, por inviabilizar o tratamento igualitário dos credores.

"Respeitada a respectiva classificação, eventual crédito oriundo de sentença condenatória por reparação de danos nascidos de fatos praticados antes do pedido de recuperação deve seguir o mesmo tratamento do crédito já liquidado nesse momento, quanto à data-limite de sua atualização", afirmou.

De acordo com a ministra, todos os créditos que se submetem ao plano devem ser tratados de maneira igualitária, objetivando a formação harmoniosa do quadro geral de credores e viabilizando o soerguimento da empresa.

Na hipótese julgada, observou a relatora, o TJDFT não limitou a incidência de correção monetária por entender que o crédito, ainda que decorrente de ato ilícito praticado antes do pedido de recuperação, não havia sido habilitado no plano.,.

Ao dar provimento ao recurso especial, Nancy Andrighi destacou que, como não houve pedido expresso do credor de exclusão do seu crédito do processo recuperacional e os créditos em discussão se referem a ilícitos praticados antes do pedido de recuperação, eles devem se submeter ao plano e se sujeitar à data-limite de incidência da correção monetária, para garantir a indispensável igualdade entre os credores.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.892.026 - DF (2020/0218161-9)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : OI S.A. - EM RECUPERACAO JUDICIAL
ADVOGADOS : FERNANDA CARVALHO DE MIERES - RJ145184
BRUNO DI MARINO - RJ093384
ANA LUISA FERNANDES PEREIRA DE OLIVEIRA - DF026088
LARISSA GABRIELE DA ROCHA PATRICIO - DF043430A
RECORRIDO : MARILDA DE LOURDES SANTOS
ADVOGADO : LINO DE CARVALHO CAVALCANTE - DF018841
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. EMPRESARIAL E RECUPERACIONAL. TELEFONIA.
COMPLEMENTAÇÃO DE AÇÕES. CONVERSÃO. PERDAS E DANOS. PEDIDO DE
RECUPERAÇÃO. DEFERIMENTO. DATA. EVENTO DANOSO. PREEXISTÊNCIA.
CRÉDITO. ILIQUIDEZ. PLANO DE SOERGUIMENTO. SUBMISSÃO. CORREÇÃO
MONETÁRIA. LIMITE FINAL. ART. 9º, II, DA LEI 11.101/05.
1. Cuida-se de ação de complementação de ações por meio da conversão
em perdas e danos, em fase de liquidação de sentença, na qual se discutem
a data de referência para a apuração dos valores das ações e o termo final
da incidência de correção monetária.
2. Recurso especial interposto em: 22/05/2020; conclusos ao gabinete em:
17/09/2020. Aplicação do CPC/15.
3. O propósito recursal consiste em determinar se o crédito decorrente de
fato ilícito praticado antes do pedido de recuperação deve ser habilitado no
correspondente plano e se, por conseguinte, a incidência de correção
monetária deve ser limitada até a data do deferimento do pedido de
recuperação judicial (exegese do art. 9º, II, da Lei 11.101/05).
4. O crédito proveniente de responsabilidade civil por fato preexistente ao
momento do deferimento da recuperação judicial deve ser habilitado e
incluído no plano de recuperação da empresa. Precedentes.
5. Essa previsão é excetuada pela opção expressa do credor de não
perseguir seu crédito por meio da recuperação, optando por buscar a
satisfação da dívida após encerrado o processo de soerguimento.
Precedente da Terceira Turma (REsp 1873572/RS).
6. Portanto, para fins de submissão ao plano de recuperação, a data de
constituição do crédito, na responsabilidade civil, é a data da configuração
do evento danoso, mesmo que sua liquidação ocorra após o deferimento do
pedido de soerguimento.
7. Como mesmo os créditos constituídos anteriormente, mas ilíquidos no
momento do pedido de recuperação judicial, devem ser habilitados no plano
de soerguimento, aceitar a incidência de juros de mora e correção
monetária em data posterior ao pedido da recuperação judicial implicaria
negativa de vigência ao art. 9º, II, da LRF, por inviabilizar o tratamento
igualitário dos credores. Precedentes.
8. Na hipótese concreta, o Tribunal de origem deixou de limitar a data de
incidência de correção monetária por entender que o crédito, ainda que
decorrente de ato ilícito praticado antes do pedido de recuperação, não
havia sido habilitado no plano de soerguimento, sem que houvesse, contudo,
pedido expresso do credor de exclusão do seu crédito do processo
recuperatório.
9. Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial
nos termos do voto do(a) Sr(a) Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Paulo de Tarso
Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram
com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 06 de abril de 2021(Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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