Multa de 10% no cumprimento de sentença exige intempestividade ou efetiva resistência do devedor

Multa de 10% no cumprimento de sentença exige intempestividade ou efetiva resistência do devedor

A multa de 10% prevista no parágrafo 1º do artigo 523 do Código de Processo Civil está condicionada à intempestividade do pagamento ou à resistência manifestada na fase de cumprimento de sentença. Assim, a simples afirmação do executado de que cogita se insurgir contra o cumprimento de sentença não justifica a penalidade.

Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso de uma empresa e manteve decisão que, ante o pagamento integral e tempestivo do débito, afastou a aplicação da multa.

A controvérsia surgiu porque a parte executada, ao depositar o valor, informou explicitamente que o depósito não constituía pagamento, mas sim garantia do juízo, e que teria o poder de assegurar efeito suspensivo à impugnação que seria apresentada posteriormente. Essa impugnação, porém, acabou não ocorrendo.

O juízo declarou a execução extinta e rejeitou o pedido da empresa para aplicar a multa de 10% prevista no parágrafo 1º do artigo 523 do CPC. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve a decisão.

No recurso especial, a empresa sustentou que a multa seria devida, pois – segundo seu entendimento – o executado não depositou o valor para liquidar efetivamente a dívida, mas apenas com o propósito de obter efeito suspensivo para a impugnação.

Precedentes

A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso no STJ, mencionou precedente da Quarta Turma (REsp 1.175.763) segundo o qual não caracteriza pagamento voluntário o depósito judicial feito pelo devedor apenas para permitir a oposição de impugnação – situação em que é aplicável a multa de 10%, pois o dinheiro não ficou disponível para o credor.

A relatora assinalou que, naquele caso, a parte executada – depois de anunciar que o depósito se prestava à garantia do juízo – efetivamente ofereceu a impugnação.

Em outro precedente citado pela ministra (REsp 1.803.985), a Terceira Turma estabeleceu que a multa só será excluída se o executado depositar a quantia devida "sem condicionar seu levantamento a qualquer discussão".

Caráter coercitivo

"Considerando o caráter coercitivo da multa, a desestimular comportamentos exclusivamente baseados na protelação da satisfação do débito perseguido, não há de se admitir sua aplicação para o devedor que efetivamente faz o depósito integral da quantia dentro do prazo legal e não apresenta impugnação", comentou Nancy Andrighi.

"Não basta a mera alegação de que o executado pondera se insurgir contra o cumprimento de sentença para automaticamente incidir a multa. É preciso haver efetiva resistência do devedor por meio do protocolo da peça de impugnação para, então, estar autorizada a incidência da multa do parágrafo 1º do artigo 523", afirmou.

A relatora apontou que, no caso analisado, embora a parte executada tenha classificado o depósito como garantia do juízo e alertado sobre a impugnação e o pretendido efeito suspensivo, é incontroverso que ela quitou o débito no prazo legal.

"A recorrida não ofereceu resistência, realizando o pagamento voluntário e integral da quantia perseguida pela recorrente em cumprimento de sentença (R$ 1.113.893,97)", declarou a ministra, observando que, inclusive, o valor depositado foi levantado pela exequente – o que, para ela, é "razão suficiente para afastar a incidência da multa".

RECURSO ESPECIAL Nº 1.834.337 - SP (2019/0066322-0)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : NEUSA CARLOS PEREIRA
ADVOGADO : DECIO AUGUSTO TAGLIARINI ROLIM - SP330108
RECORRIDO : S/A O ESTADO DE SÃO PAULO
ADVOGADOS : JULIANA APARECIDA JACETTE E OUTRO(S) - SP164556
ANDRÉIA CHRISTINA RISSON OLIVEIRA - SP257302
INTERES. : JOSELI BATISTA
INTERES. : ANDREIA PEREIRA DIAS DOS SANTOS
INTERES. : GILMARA LARA CAMPOS SILVA
ADVOGADO : FLÁVIO RICARDO MELO E SANTOS - SP108905
INTERES. : N. CARLOS PEREIRA COBRANCAS
ADVOGADO : DECIO AUGUSTO TAGLIARINI ROLIM - SP330108
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL EM FASE DE
CUMPRIMENTO DEFINITIVO DE SENTENÇA QUE RECONHECE A
EXIGIBILIDADE DE OBRIGAÇÃO DE PAGAR QUANTIA CERTA. PAGAMENTO
VOLUNTÁRIO. INCIDÊNCIA DE MULTA. CRITÉRIOS. INTEMPESTIVIDADE.
RESISTÊNCIA MEDIANTE IMPUGNAÇÃO. DEPÓSITO INTEGRAL NO PRAZO DE
15 DIAS ÚTEIS SEM RESISTÊNCIA DA PARTE EXECUTADA. NÃO APLICAÇÃO DA
MULTA.
1. Ação ajuizada em 2/5/17. Recurso especial interposto em 28/5/18. Autos
conclusos ao gabinete em 28/6/19. Julgamento: CPC/15.
2. O propósito recursal consiste em dizer da violação do art. 523, §1º, do
CPC/15, acerca do critério de quando deve incidir, ou não, a multa de dez
por cento sobre o débito, além de dez por cento de honorários advocatícios.
3. São dois os critérios a dizer da incidência da multa prevista no art. 523,
§1º, do CPC, a intempestividade do pagamento ou a resistência manifestada
na fase de cumprimento de sentença.
4. Considerando o caráter coercitivo da multa, a desestimular
comportamentos exclusivamente baseados na protelação da satisfação do
débito perseguido, não há de se admitir sua aplicação para o devedor que
efetivamente faz o depósito integral da quantia dentro do prazo legal e não
apresenta impugnação ao cumprimento de sentença.
5. Na hipótese dos autos, apesar de advertir sobre o pretendido efeito
suspensivo e da garantia do juízo, é incontroverso que a executada realizou
tempestivamente o depósito integral da quantia perseguida e não
apresentou impugnação ao cumprimento de sentença, fato que revela,
indene de dúvidas, que houve verdadeiro pagamento do débito, inclusive
com o respectivo levantamento pela exequente. Não incidência da multa
prevista no art. 523, §1º, do CPC e correta extinção do processo, na forma
do art. 924, II, do CPC.
6. Recurso especial conhecido e não provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer e negar provimento ao
recurso especial nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Ricardo
Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra
Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino.
Brasília (DF), 03 de dezembro de 2019(Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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