Deslocamento de produto sem mudança de titularidade não gera incidência de IPI

Deslocamento de produto sem mudança de titularidade não gera incidência de IPI

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou recurso da Fazenda Nacional por entender que o mero deslocamento do produto de uma localidade para outra, ou entre estabelecimentos da empresa, não justifica a incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Para haver a tributação, é necessária a transferência de titularidade do produto industrializado.

O caso analisado pelos ministros diz respeito a uma empresa fabricante de explosivos que presta serviços de detonação de rochas. Ela entrou com mandado de segurança contra o pagamento de IPI cobrado na saída dos explosivos da fábrica para os locais de serviço.

Para o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), a saída dos explosivos da fábrica limita-se a simples transferência, deslocamento físico de material necessário para a prestação do serviço, sem mudança de titularidade, o que não justifica a cobrança de IPI.

A Fazenda Nacional sustentou no recurso especial que a mudança de titularidade não era condição necessária para o fato gerador da incidência do IPI, bastando a saída do produto industrializado da fábrica – o que teria efetivamente ocorrido.

O ministro Gurgel de Faria, relator, disse que a interpretação do TRF4 está correta quanto à não incidência de IPI na hipótese.

Grandeza tributável

"Mero deslocamento de bens, sem transferência de titularidade e riqueza, apresenta-se indiferente à hipótese de incidência do tributo em tela. A Constituição Federal, ao definir sua materialidade, exige que os fatos imponíveis revelem a exigência de capacidade contributiva em relação às pessoas envolvidas na ocorrência do fato gerador. Se não há riqueza, não há grandeza tributável", explicou o relator.

Ele lembrou que o aspecto material do IPI alberga dois momentos distintos e necessários: a industrialização e a transferência de propriedade ou posse do produto industrializado, que deve ser onerosa.

De acordo com o ministro, "a saída do estabelecimento a que refere o artigo 46, II, do Código Tributário Nacional, que caracteriza o aspecto temporal da hipótese de incidência, pressupõe, logicamente, a mudança de titularidade do produto industrializado".

Insumos

"A sociedade empresária promove a detonação ou desmonte de rochas e, para tanto, industrializa seus próprios explosivos, utilizando-os na prestação dos serviços. Não promove a venda desses artefatos separadamente, quer dizer, não transfere a propriedade ou posse do produto que industrializa. A 'saída' do estabelecimento dá-se a título de mero deslocamento até o local onde será empregado na sua atividade-fim", argumentou.

Gurgel de Faria afirmou que os explosivos de fabricação própria assumem a qualidade de insumos na prestação dos serviços executados, havendo simples saída física – e não jurídica – do estabelecimento da empresa.

Segundo o relator, o entendimento de que não há tributação de IPI sobre o simples deslocamento de mercadoria entre estabelecimentos do mesmo contribuinte está alinhado à jurisprudência do STJ em relação ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS).

RECURSO ESPECIAL Nº 1.402.138 - RS (2013/0298017-6)
RELATOR : MINISTRO GURGEL DE FARIA
RECORRENTE : FAZENDA NACIONAL
ADVOGADO : PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL
RECORRIDO : DINACON INDÚSTRIA, COMÉRCIO E SERVIÇOS LTDA
ADVOGADO : HUGO RAUCH - RS057371
EMENTA
TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL.
ART. 535 DO CPC/1973. VIOLAÇÃO. ALEGAÇÃO GENÉRICA.
DEFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. IPI. SAÍDA DO
ESTABELECIMENTO DO CONTRIBUINTE. AUSÊNCIA. MERO
DESLOCAMENTO DO PRODUTO PARA PRESTAÇÃO DE
SERVIÇOS. NÃO INCIDÊNCIA.
1. Conforme estabelecido pelo Plenário do STJ, "aos recursos interpostos
com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de
março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na
forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça" (Enunciado
Administrativo n. 2).
2. A alegação genérica de ofensa ao art. 535 do CPC/1973,
desacompanhada de causa de pedir suficiente à compreensão da
controvérsia e sem a indicação precisa dos vícios de que padeceria o
acórdão impugnado, atrai a aplicação da Súmula 284 do STF.
3. O aspecto material do IPI alberga dois momentos distintos e
necessários: a) industrialização, que consiste na operação que modifique
a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a
finalidade do produto, ou o aperfeiçoe para o consumo, nos termos do
art. 4º do Decreto n. 7.212/2010 (Regulamento do IPI); b) transferência
de propriedade ou posse do produto industrializado, que deve ser
onerosa.
4. A saída do estabelecimento a que refere o art. 46, II, do CTN, que
caracteriza o aspecto temporal da hipótese de incidência, pressupõe,
logicamente, a mudança de titularidade do produto industrializado.
5. Havendo mero deslocamento para outro estabelecimento ou para
outra localidade, permanecendo o produto sob o domínio do contribuinte,
não haverá incidência do IPI, compreensão esta que se alinha ao
pacífico entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça,
consolidado em relação ao ICMS, que se aplica, guardada as devidas
peculiaridades, ao tributo sob exame, nos termos da Súmula do STJ, in
verbis: "Não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de
mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte".
6. Hipótese em que a sociedade empresária promove a detonação ou
desmonte de rochas e, para tanto, industrializa seus próprios explosivos,
utilizando-os na prestação dos seus serviços, não promovendo a venda
desses artefatos separadamente, quer dizer, não transfere a propriedade
ou posse do produto que industrializa.
7. In casu, a "saída" do estabelecimento dá-se a título de mero
deslocamento até o local onde será empregado na sua atividade fim, não
havendo que se falar em incidência de IPI, porquanto não houve a
transferência de propriedade ou posse de forma onerosa, um dos
pressupostos necessários para a caracterização da hipótese de
incidência do tributo.
8. Recurso especial conhecido em parte e desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por
unanimidade, conhecer parcialmente do recurso especial e, nessa parte, negar-lhe provimento,
nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho,
Benedito Gonçalves, Sérgio Kukina e Regina Helena Costa votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 12 de maio de 2020 (Data do julgamento).
MINISTRO GURGEL DE FARIA
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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