Ação de usucapião não está condicionada à negativa do pedido na via extrajudicial

Ação de usucapião não está condicionada à negativa do pedido na via extrajudicial

Mesmo com as alterações feitas na Lei de Registros Públicos pela lei que instituiu o Código de Processo Civil de 2015, o ajuizamento da ação de usucapião não está condicionado à negativa do pedido em cartório.

Com base nesse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou o retorno de um processo que discute a usucapião de um imóvel ao juízo de origem, para que prossiga com a ação.

A interessada afirmou que adquiriu o direito possessório referente ao imóvel em 2003, realizando benfeitorias e reformas ao longo de 13 anos de posse mansa e pacífica. Em junho de 2016, ela entrou com o pedido judicial de usucapião.

Enunciado

A sentença, desfavorável à autora, citou o Enunciado 108, aprovado em encontro de desembargadores promovido pelo Centro de Estudos e Debates (Cedes-RJ), segundo o qual a ação de usucapião é cabível somente quando houver óbice ao pedido na esfera extrajudicial. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) manteve a decisão.

No recurso especial, a Defensoria Pública alegou que as alterações promovidas com o CPC de 2015 facultam ao interessado fazer o pedido de usucapião em cartório, porém sem prejuízo de optar pela via judicial.

Segundo a DP, o artigo 1.071 do CPC/2015 incluiu o artigo 216-A na Lei de Registros Públicos para possibilitar a alternativa extrajudicial, mas não exige que o interessado tenha uma negativa nessa via para só então ajuizar a demanda.

O ministro Paulo de Tarso Sanseverino, relator do recurso especial, deu razão à DP. Ele destacou que a redação do artigo 216-A da Lei de Registros Públicos é clara: "Como se verifica já na abertura do caput desse enunciado normativo, o procedimento extrajudicial de usucapião foi disciplinado 'sem prejuízo da via jurisdicional'".

Conflito presumível

O relator afirmou que é salutar a intenção do Cedes-RJ de fomentar a desjudicialização de conflitos com o Enunciado 108, mas não se pode ignorar o texto legal.

"Ademais, como a propriedade é um direito real, oponível erga omnes, o simples fato de o possuidor pretender se tornar proprietário já faz presumir a existência de conflito de interesses entre este e o atual titular da propriedade, de modo que não seria possível afastar de antemão o interesse processual do possuidor, como parece sugerir o enunciado do tribunal de origem", concluiu o ministro.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.824.133 - RJ (2018/0066379-3)
RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO
RECORRENTE : SELMA DA CUNHA
ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
RECORRIDO : LUIZ CLAUDINO DO NASCIMENTO
RECORRIDO : REJANE MARIA DOS SANTOS PEREIRA
ADVOGADO : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS - SE000000M
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL
CIVIL. CPC/2015. AÇÃO DE USUCAPIÃO. INTERESSE
PROCESSUAL. EXIGÊNCIA DE PRÉVIO PEDIDO NA VIA
EXTRAJUDICIAL. DESCABIMENTO. EXEGESE DO ART.
216-A DA LEI DE REGISTROS PÚBLICOS. RESSALVA
EXPRESSA DA VIA JURISDICIONAL.
1. Controvérsia acerca da exigência de prévio pedido de
usucapião na via extrajudicial para se evidenciar interesse
processual no ajuizamento de ação com o mesmo objeto.
2. Nos termos do art. 216-A da Lei 6.015/1973: "Sem prejuízo
da via jurisdicional, é admitido o pedido de reconhecimento
extrajudicial de usucapião, que será processado diretamente
perante o cartório do registro de imóveis da comarca em que
estiver situado o imóvel usucapiendo [...]".
3. Existência de interesse jurídico no ajuizamento direto de
ação de usucapião, independentemente de prévio pedido na
via extrajudicial.
4. Exegese do art. 216-A da Lei 6.015/1973, em âmbito
doutrinário.
5. Determinação de retorno dos autos ao juízo de origem para
que prossiga a ação de usucapião.
6. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por
unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro
(Presidente) e Nancy Andrighi votaram com o Sr. Ministro Relator.
Dr(a). DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO,
pela parte RECORRENTE: SELMA DA CUNHA
Brasília, 11 de fevereiro de 2020(data do julgamento)
MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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