Plano de saúde coletivo não pode rescindir contrato de beneficiário em tratamento até alta médica

Plano de saúde coletivo não pode rescindir contrato de beneficiário em tratamento até alta médica

Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), é possível a rescisão unilateral e imotivada de contrato coletivo de plano de saúde, desde que cumprida a vigência de 12 meses e feita a notificação prévia do contratante com antecedência mínima de 60 dias, e respeitada, ainda, a continuidade do vínculo contratual para os beneficiários que estiverem internados ou em tratamento médico, até a respectiva alta.

Com esse entendimento, o colegiado decidiu que uma operadora de seguro-saúde pode rescindir unilateral e imotivadamente o contrato firmado com empresa de transportes, contanto que os beneficiários em tratamento médico continuem assegurados. 

"Não obstante seja possível a resilição unilateral e imotivada do contrato de plano de saúde coletivo, deve ser resguardado o direito daqueles beneficiários que estejam internados ou em pleno tratamento médico, observando-se, assim, os princípios da boa-fé, da segurança jurídica e da dignidade da pessoa humana", afirmou o relator, ministro Marco Aurélio Bellizze.

Cláusulas anuladas

No caso analisado, uma empresa ajuizou ação em desfavor da operadora de seguro-saúde para garantir a manutenção do contrato de plano coletivo e da respectiva cobertura médico-hospitalar para os seus 203 funcionários.

Em primeiro grau, a ação foi julgada parcialmente procedente para obrigar a seguradora a manter como beneficiários apenas os funcionários em tratamento médico.

O Tribunal de Justiça de São Paulo reformou a sentença, condenando a operadora a não cancelar a cobertura médico-hospitalar de nenhum funcionário e declarando nulas as cláusulas e condições gerais do contrato que autorizavam sua rescisão unilateral e imotivada.

Ao recorrer ao STJ, a operadora pediu a reforma da decisão alegando tratar-se de resilição unilateral de contrato de plano coletivo, e não individual.

Função social

De acordo com o relator, o artigo 13, inciso II, da Lei 9.656/1998 (Lei dos Planos de Saúde) – que veda a suspensão ou a rescisão unilateral do contrato, salvo por fraude ou não pagamento da mensalidade por mais de 60 dias – incide apenas nos contratos individuais ou familiares. No caso dos planos coletivos, a jurisprudência pacífica do STJ admite a rescisão unilateral e imotivada.

Todavia, segundo Bellizze, a liberdade de contratar não é absoluta, devendo ser exercida nos limites da função social dos contratos. Ele destacou que a saúde e a vida do beneficiário do plano se sobrepõem a cláusulas de natureza eminentemente contratual, impondo-se, no caso analisado, a manutenção do vínculo entre as partes até o fim do tratamento médico.

O ministro lembrou que a Lei dos Planos de Saúde estabelece ainda que as operadoras privadas poderão, voluntariamente, requerer autorização para encerramento de suas atividades, desde que garantam a continuidade da prestação de serviços aos beneficiários internados ou em tratamento.

"Tomando como base uma interpretação sistemática e teleológica da referida lei, em observância aos princípios da boa-fé, da segurança jurídica e da dignidade da pessoa humana, é de se concluir que o referido dispositivo legal – artigo 8º, parágrafo 3º, "b", da Lei 9.656/1998 –, que garante a continuidade da prestação de serviços de saúde aos beneficiários internados ou em tratamento médico, deverá ser observado não só nos casos de encerramento das atividades da operadora de assistência à saúde, mas também quando houver resilição unilateral do plano de saúde coletivo, como ocorrido na espécie", afirmou.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.818.495 - SP (2019/0159700-8)
RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE
RECORRENTE : BRADESCO SAUDE S/A
ADVOGADOS : SERGIO BERMUDES E OUTRO(S) - RJ017587
ALESSANDRA MARQUES MARTINI - SP270825
RECORRIDO : MEGATRANZ TRANSPORTES LTDA
ADVOGADOS : LUCIANO CORREIA BUENO BRANDÃO E OUTRO(S) - SP236093
LUIZ AUGUSTO VIEIRA DE CAMPOS - SP289003
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL.
NÃO OCORRÊNCIA. QUESTÕES DEVIDAMENTE ANALISADAS PELO TRIBUNAL DE
ORIGEM. CONTRATO COLETIVO DE PLANO DE SAÚDE. RESILIÇÃO UNILATERAL E
IMOTIVADA. POSSIBILIDADE. NORMA DO ART. 13, INCISO II, DA LEI 9.656/1998 QUE
INCIDE APENAS NOS CONTRATOS INDIVIDUAIS OU FAMILIARES. JURISPRUDÊNCIA
PACÍFICA DESTA CORTE SUPERIOR. REFORMA DO ACÓRDÃO RECORRIDO NESSE
PONTO. MANUTENÇÃO, PORÉM, DO PLANO DE SAÚDE PARA OS BENEFICIÁRIOS QUE
ESTIVEREM INTERNADOS OU EM TRATAMENTO MÉDICO, EM OBSERVÂNCIA AOS
PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ, DA SEGURANÇA JURÍDICA E DA DIGNIDADE DA PESSOA
HUMANA. LIBERDADE DE CONTRATAR QUE DEVE SER EXERCIDA NOS LIMITES E EM
RAZÃO DA FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS. BENS JURIDICAMENTE TUTELADOS
PELA LEI DE REGÊNCIA - SAÚDE E VIDA - QUE SE SOBREPÕEM AOS TERMOS
CONTRATADOS. APLICABILIDADE DO DISPOSTO NO ART. 8º, § 3º, "B", DA LEI
9.656/1998, EM INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA E TELEOLÓGICA. RESTABELECIMENTO
DA SENTENÇA. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.
1. O propósito recursal é definir se, a par da adequação da tutela jurisdicional prestada
(omissão no acórdão recorrido), é possível a resilição unilateral do contrato de plano de
saúde coletivo, bem como se operam ou não efeitos em relação aos beneficiários que estão
com tratamento médico em curso.
2. Não há que se falar em negativa de prestação jurisdicional na hipótese, pois todas as
questões suficientes ao julgamento da causa foram devidamente analisadas no acórdão
recorrido.
3. O posicionamento adotado pelo Tribunal de origem diverge da jurisprudência pacífica do
Superior Tribunal de Justiça, a qual proclama ser perfeitamente possível a resilição unilateral
e imotivada de contrato coletivo de plano de saúde, desde que cumprido o prazo de vigência
de 12 (doze) meses, bem como haja notificação prévia do contratante com antecedência
mínima de 60 (sessenta) dias, uma vez que o art. 13, inciso II, da Lei 9.656/1998, incide tão
somente nos contratos individuais ou familiares.
4. Entretanto, não obstante seja possível a resilição unilateral e imotivada do contrato de
plano de saúde coletivo, deve ser resguardado o direito daqueles beneficiários que estejam
internados ou em pleno tratamento médico, observando-se, assim, os princípios da boa-fé,
da segurança jurídica e da dignidade da pessoa humana.
4.1. Com efeito, a liberdade de contratar não é absoluta, devendo ser exercida nos limites e
em razão da função social dos contratos, notadamente em casos como o presente, cujos
bens protegidos são a saúde e a vida do beneficiário, os quais se sobrepõem a quaisquer
outros de natureza eminentemente contratual, impondo-se a manutenção do vínculo
contratual entre as partes até que os referidos beneficiários encerrem o respectivo
tratamento médico.
4.2. Ademais, não se pode olvidar que a própria Lei dos Planos de Saúde (Lei n. 9.656/1998)
estabelece, em seu art. 8º, § 3º, alínea "b", que as operadora privadas de assistência à
saúde poderão voluntariamente requerer autorização para encerramento de suas atividades,
desde que garanta a continuidade da prestação de serviços dos beneficiários internados ou
em tratamento médico, dentre outros requisitos.
4.3. Assim sendo, tomando como base uma interpretação sistemática e teleológica da
referida lei, é de se concluir que o disposto no art. 8º, § 3º, alínea "b", da Lei n. 9.656/1998,
que garante a continuidade da prestação de serviços de saúde aos beneficiários internados
ou em tratamento médico, deverá ser observado não só nos casos de encerramento das
atividades da operadora de assistência à saúde, mas também quando houver resilição
unilateral do plano de saúde coletivo, como ocorrido na espécie, razão pela qual deve ser
restabelecida a sentença de procedência parcial do pedido.
5. Recurso especial parcialmente provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam
os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar parcial
provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Moura Ribeiro (Presidente), Nancy Andrighi, Paulo de Tarso
Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 08 de outubro de 2019 (data do julgamento).
MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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