Segurada deve optar entre aposentadoria concedida pelo INSS e execução de parcelas do benefício obtido na Justiça

Segurada deve optar entre aposentadoria concedida pelo INSS e execução de parcelas do benefício obtido na Justiça

Como forma de afastar quadro semelhante à desaposentação – direito não reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) –, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou que uma segurada escolha entre a aposentadoria obtida na via judicial – que, apesar do valor menor, permitirá a execução do montante não recebido desde a data do pedido administrativo – e o benefício recente (e mais vantajoso) concedido pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) durante o curso da ação judicial.

Após ter sua aposentadoria indeferida pelo INSS, a segurada entrou na Justiça e conseguiu decisão favorável, na qual o INSS foi condenado a conceder o benefício, com pagamento retroativo à data do pedido administrativo. Enquanto o processo ainda corria, o INSS, em decisão administrativa, concedeu a aposentadoria à segurada – em valor maior, porque até esse ponto ela já havia acumulado mais tempo de contribuição.

Por maioria de votos, a Segunda Turma decidiu que, caso a segurada opte pelo benefício mais antigo, obtido judicialmente, este deverá ser implantado definitivamente, sem a necessidade de devolução dos valores recebidos no período em que vigorou a aposentadoria concedida na via administrativa. Todavia, se a segurada decidir pelo benefício administrativo, ela não terá como pleitear as parcelas passadas relativas à aposentadoria judicial.

"O fato de o INSS ter indeferido equivocadamente o primeiro benefício e de a concessão ter sido judicial não sustenta o afastamento da ordem constitucional afirmada pelo STF, de impossibilidade de concessão de duas aposentadorias a um mesmo segurado. Mas reconheço, todavia, a possibilidade de opção por apenas uma das duas, diante da situação sui generis criada de forma indevida pelo INSS" – afirmou o relator do recurso da autarquia, ministro Herman Benjamin.

Prática vedada

O pedido de aposentadoria havia sido negado pelo INSS em 2013. Depois que a Justiça reconheceu o direito da segurada, ela informou nos autos que o INSS decidiu conceder o benefício em 2017. Requereu, então, que fosse resguardado seu direito de optar pelo benefício mais vantajoso e, caso a aposentadoria mais vantajosa fosse a concedida administrativamente, que ela não fosse obrigada a desistir de executar as parcelas retroativas do benefício obtido em juízo.

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) entendeu ser possível a manutenção do benefício autorizado de forma administrativa no curso da ação e, concomitantemente, a execução das parcelas do benefício postulado na via judicial até a data da implantação administrativa. 

Por meio de recurso especial, o INSS alegou que o pedido da beneficiária equivaleria à prática vedada de desaposentação – possibilidade de renúncia a uma aposentadoria e de utilização do mesmo tempo de serviço ou contribuição, somado ao tempo posterior ao primeiro benefício, para obtenção de nova aposentadoria em condições mais vantajosas.

Sem previsão legal

O ministro Herman Benjamin afirmou inicialmente que o STF, sob o rito da repercussão geral, fixou a tese de que, no âmbito do Regime Geral da Previdência Social, somente a lei pode criar benefícios e vantagens, não havendo, por ora, previsão legal do direito à desaposentação. 

Segundo o ministro, na hipótese clássica de desaposentação, o INSS defere administrativamente uma primeira aposentadoria e, algum tempo depois, o segurado renuncia ao benefício e pede novamente para se aposentar. Na situação dos autos, a segurada teve aposentadoria indeferida pelo INSS e, depois, houve a concessão judicial, retroativa à data do requerimento administrativo. Posteriormente, o INSS concedeu a ela um novo benefício.

Apesar das diferenças entre a situação conceitual e a hipótese dos autos, Herman Benjamin afirmou que, se a segurada recebesse o benefício mais antigo (de renda mensal menor) até o início do benefício concedido pela via administrativa (de renda mensal maior), e este último fosse o benefício implementado de forma definitiva, o quadro resultaria em desaposentação, por tornar sem efeito a aposentadoria mais antiga para implantar aposentadoria mais nova. 

"Não é permitido, portanto, conceder ao aposentado qualquer outro tipo de benefício previdenciário, inclusive outra aposentadoria, o que resulta na conclusão de que não poderá ser utilizado mesmo tempo de contribuição já considerado para conceder um benefício (aposentadoria renunciada) para a concessão de nova e posterior prestação (aposentadoria mais vantajosa)", disse o ministro ao dar provimento parcial ao recurso do INSS.

Entretanto, considerando a peculiaridade do caso, o relator entendeu que deve ser permitido que a segurada opte por apenas um dos benefícios – no que foi acompanhado pela maioria.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.793.264 - SC (2018/0346387-4)
RELATOR : MINISTRO HERMAN BENJAMIN
RECORRENTE : INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
RECORRIDO : MARIA DOS SANTOS
ADVOGADOS : DARCÍSIO ANTÔNIO MÜLLER E OUTRO(S) - SC017504
DAIANNA HELOISE HOPFNER - SC030851
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE
PREVIDÊNCIA SOCIAL. APOSENTADORIA CONCEDIDA
JUDICIALMENTE. CONCESSÃO ADMINISTRATIVA DE
APOSENTADORIA NO CURSO DA AÇÃO. RECEBIMENTO DOS DOIS
BENEFÍCIOS. EQUIVALÊNCIA COM DESAPOSENTAÇÃO. ART. 18, §
2º, DA LEI 8.213/1991. PRÁTICA VEDADA. ENTENDIMENTO DO STF
EM REPERCUSSÃO GERAL.
DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA
1. Cuida-se de inconformismo contra acórdão do Tribunal de origem que
reconheceu que "é possível a manutenção do beneficio concedido
administrativamente no curso da ação e, concomitantemente, a execução das
parcelas do beneficio postulado na via judicial até a data da implantação
administrativa".
2. Na hipótese, a segurada, ora recorrida, ajuizou a presente ação em 14.10.2013
com intuito de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição a contar do
requerimento administrativo negado (12.4.2013), tendo obtido êxito. O Tribunal de
origem acolheu Embargos de Declaração da parte ora recorrida para admitir o
recebimento das duas aposentadorias sequencialmente e assegurar o direito de
opção.
3. Alega o INSS, em síntese, que a pretensão da segurada de receber o
benefício concedido judicialmente de 16.5.2013 até o que se iniciou
administrativamente em 31.10.2016, e manter este último (por ser mais
vantajoso financeiramente), equivale à vedada prática de
"desaposentação".
VOTOS DOS MINISTROS MAURO
CAMPBELL MARQUES E OG FERNANDES
4. O e. Ministro Mauro Campbell Marques apresentou voto-vogal no presente
caso divergindo do entendimento do relator, no que foi acompanhado pelo e.
Ministro Og Fernandes, que não apresentou voto escrito, sob o fundamento de
que a presente hipótese não configura desaposentação e, apesar de a recorrida
ter optado pelo benefício concedido administrativamente, pode receber o
benefício judicial até o início daquele.
5. Segundo a divergência, não há pedido de renúncia pela segurada, e esta não
pode ser penalizada por receber o benefício administrativo enquanto estava
pendente de análise o judicial.
6. Como fundamento adiante, realmente o presente caso não reflete a exata
hipótese tratada pelo STF nos REs 381.367, 827.833 e 661.256 por não ter a
mesma sequência temporal, mas possui liames em comum que resultam, ao fim,
na vedação estipulada pela Corte Suprema de recebimento de duas
aposentadorias.
7. Também refiro no meu voto que concordo que a segurada não pode ser
penalizada, e por isso a ela deve ser garantido o direito de optar por um dos
benefícios, possibilidade essa vetada no caso clássico de desaposentação.
A DESAPOSENTAÇÃO E A DECISÃO DO STF
8. A chamada "desaposentação" consiste, na prática, em pedido de
cancelamento de um benefício de aposentadoria deferido pelo INSS para
que outro jubilamento seja concedido em data posterior, considerando os
salários de contribuição recolhidos após a primeira aposentação (o segurado
continuou trabalhando).
9. Essa pretensão foi analisada pelo Supremo Tribunal Federal, sob o rito da
Repercussão Geral, na ocasião do julgamento dos REs 381.367, 827.833 e
661.256, que fixou a tese de que, "no âmbito do Regime Geral de Previdência
Social - RGPS, somente lei pode criar benefícios e vantagens
previdenciárias, não havendo, por ora, previsão legal do direito à
'desaposentação', sendo constitucional a regra do art. 18, § 2º, da Lei nº
8.213/91". 10. Estando a matéria definida pelo STF no sentido do não cabimento da
desaposentação, impende analisar se a presente hipótese equivale a essa prática
vedada.
CONFIGURAÇÃO DO PRESENTE
CASO COMO DESAPOSENTAÇÃO
11. Na clássica hipótese de desaposentação, o INSS defere administrativamente
uma primeira aposentadoria e, algum tempo depois, o segurado pede novo
jubilamento para computar tempo de serviço e contribuição posteriores à
aposentação inicial.
12. Na situação dos autos, a segurada teve aposentadoria indeferida
administrativamente, que posteriormente é concedida judicialmente desde o
indeferimento. No curso da ação, e antes do Cumprimento da Sentença, o
segurado obtém administrativamente aposentadoria após o primeiro requerimento,
que resultou na concessão administrativa de aposentadoria posterior à judicial.
13. Concordo em parte com os votos divergentes no sentido de que a
peculiariedade do caso concreto, notadamente por a segurada não ter recebido
judicialmente as parcelas atrasadas da primeira aposentadoria e por ter que
esperar o resultado do pleito do benefício judicial, permite que a segurada opte
por um dos benefícios. 14. Mas nesse aspecto é que está a minha discordância, com todas as vênias: a)
a segurada deve optar por apenas um dos benefícios; b) se a segurada
optar pelo benefício mais antigo (como ocorreu na hipótese dos autos), é
ele que deverá ser implantado, sem necessidade de a segurada devolver
valores do período em que recebeu aposentadoria concedida
administrativamente; e c) se a segurada optar pelo benefício
administrativo, somente este ela irá receber, não havendo falar em obter
parcelar pretéritas do benefício judicial. 15. Outro aspecto que discordo respeitosamente dos julgados divergentes é que a
segurada, embora não manifeste com todas as letras que quer renunciar à
primeira aposentadoria, está sim, em concreto, expressando vontade, agora na
fase de Cumprimento de Sentença, no mesmo sentido ao pretender receber o
primeiro benefício até o início da segunda aposentadoria, permanecendo esta

como a implantada e cancelando a primeira.
16. Da forma como está sendo julgado o caso, a segurada recebe o benefício
mais antigo (de renda mensal menor) até o início do benefício concedido
administrativamente (de renda mensal maior), sendo este o benefício implantado,
o que acaba por resultar, com todas as vênias, em recebimento de duas
aposentadorias, vedada pelo STF, por tornar sem efeito a aposentadoria mais
antiga para implantar uma aposentadoria mais nova.
17. Essa incompatibilidade foi bem delineada no voto do saudoso Ministro Teori
Albino Zavascki, no julgamento da Repercussão Geral sobre o tema, antes
mencionada, em que ele chamou de "substituição" de aposentadorias: "Presente o
estatuto jurídico acima delineado, não há como supor a existência do direito
subjetivo afirmado na presente demanda, consistente em uma 'desaposentação',
que seria o direito do segurado do RGPS a 'renunciar' a um benefício de
aposentadoria já requerido e concedido, para, simultaneamente, obter outro
benefício da mesma natureza, porém mais vantajoso, em face da agregação de
tempo de contribuição ocorrido nesse interregno e da menor expectativa de
sobrevida. Não é preciso enfatizar que de renúncia não se trata, mas, sim,
de substituição de um benefício menor por um benefício maior, uma
espécie de 'progressão' de escala. Essa espécie de 'promoção' não tem
previsão alguma no sistema previdenciário estabelecido atualmente, o
que, considerada a natureza estatutária da situação jurídica em que se insere,
seria indispensável para gerar um correspondente dever de prestação. E, além de
estranho ao sistema, o benefício não se encontra incluído no rol exaustivo do art.
18, § 2º da Lei 8.213/91, nem pode ser considerado como decorrência necessária,
direta ou indireta, das contribuições vertidas pelo segurado, que, conforme
enfatizado, destinam-se legalmente ao custeio da Seguridade Social".
18. O caso dos autos, embora possua ordem temporal peculiar em relação
àquela analisada pelo STF, resulta na prática vedada do art. 18, § 2º, da
Lei 8.213/1991, dispositivo esse considerado constitucional pelo STF, de
concessão (pagamento) de nova aposentadoria a quem já estava
aposentado, ou, em outras palavras, de pagamento de duas
aposentadorias a um mesmo segurado, ainda que temporalmente
subsequentes. 19. O fato de o INSS ter indeferido equivocadamente o primeiro benefício e de a
concessão ter sido judicial não sustenta o afastamento da ordem constitucional
afirmada pelo STF de impossibilidade de concessão de duas
aposentadorias a um mesmo segurado, mas reconheço, todavia, a
possibilidade de opção por apenas um dos dois, diante da situação sui
generis criada de forma indevida pelo INSS. 20. Aponto alguns julgamentos da Segunda Turma no mesmo sentido do aqui
defendido: REsp 1.762.613/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma,
DJe 21.11.2018; REsp 1.757.414/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda
Turma, DJe 27.11.2018; e REsp 1.734.609/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin,
Segunda Turma, DJe 21.11.2018.
21. Recurso Especial parcialmente provido para determinar à recorrida que opte
por apenas uma das aposentadorias.
ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça: ""Prosseguindo-se
no julgamento, após o voto-vista regimental do Sr. Ministro Herman Benjamin, dando parcial
provimento ao recurso, no que foi acompanhado pela Sra. Ministra Assusete Magalhães e pelo
Sr. Ministro Francisco Falcão, a Turma, por maioria, deu parcial provimento ao recurso, nos
termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Vencidos os Srs. Ministros Og Fernandes e Mauro
Campbell Marques." A Sra. Ministra Assusete Magalhães e o Sr. Ministro Francisco Falcão
votaram com o Sr. Ministro Relator."
Brasília, 23 de maio de 2019(data do julgamento).
MINISTRO HERMAN BENJAMIN
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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