Mantida indenização de R$ 125 mil a participante eliminado por erro do programa Amazônia – reality show

Mantida indenização de R$ 125 mil a participante eliminado por erro do programa Amazônia – reality show

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, manteve decisão que condenou as empresas organizadoras do programa Amazônia – reality show, exibido pela TV Record em 2012, ao pagamento de R$ 125 mil a um participante que foi eliminado por erro na contagem de pontos na semifinal da competição. O colegiado também confirmou indenização de R$ 25 mil por danos morais pelas repercussões negativas do episódio na vida pessoal do participante, autor da ação.

"O tribunal de origem demonstrou que ficaram configurados os requisitos para reparação por perda de uma chance, tendo em vista a comprovação de erro na contagem de pontos na rodada semifinal da competição, o que tornou a eliminação do autor indevida, e a violação das regras da competição que asseguravam a oportunidade de disputar rodada de desempate", explicou o relator do recurso no STJ, ministro Villas Bôas Cueva.

Eliminação precoce

Na ação, o ex-participante do Amazônia – reality show pleiteou compensação por danos materiais, morais e à imagem devido à sua precoce eliminação na fase semifinal da competição. 

De acordo com o processo, ele terminou a fase de perguntas e respostas da semifinal em situação de empate com outro competidor – ambos teriam somado 238 pontos, de acordo com as regras do jogo –, mas foi eliminado por um erro na contagem dos pontos.

O autor da ação afirmou que as tentativas de contato com os organizadores do programa para esclarecer os motivos de sua eliminação e da inexistência de prova de desempate foram frustradas.

Sem justificativa

Em primeira instância, o pedido de indenização foi julgado improcedente ao fundamento de que o DVD com a gravação da semifinal – juntado aos autos – não demonstrava erro na contagem dos pontos que pudesse prejudicar o autor ou favorecer o adversário.

Porém, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) concluiu que o autor empatou em pontos com seu adversário, mas não teve a oportunidade de disputar a rodada de desempate por equívoco na contagem. O tribunal paulista ressaltou ser inadmissível a eliminação do participante sem nenhuma justificativa plausível, ao arrepio das próprias regras determinadas para a competição.

Assim, o TJSP condenou as empresas organizadoras do programa – Rádio e Televisão Record S.A. e Endemol Brasil Produções Ltda. – ao pagamento de indenização pela perda de uma chance, no valor de R$ 125 mil, e R$ 25 mil por danos morais.

As empresas recorreram ao STJ alegando a inaplicabilidade da teoria da perda de uma chance ao caso, por inexistência de previsão legal, e a falta de demonstração da ocorrência de ato ilícito que teria privado o autor da oportunidade de disputar o prêmio.

Expectativa frustrada

O ministro Villas Bôas Cueva explicou que a teoria da perda de uma chance tem por objetivo reparar o dano decorrente da lesão de uma legítima expectativa que não se concretizou porque determinado fato interrompeu o curso normal dos eventos e impediu a realização do resultado final esperado pelo indivíduo.

Afirmou que a reparação das chances perdidas tem fundamento nos artigos 186 e 927 do Código Civil de 2002, que estabelecem, respectivamente, uma cláusula geral de responsabilidade civil, utilizando um conceito amplo de dano, e o dever de reparar como consequência da prática de ato ilícito.

"Isso significa dizer que deve ficar demonstrado que a chance perdida é séria e real – não sendo suficiente a mera esperança ou expectativa da ocorrência do resultado, elementos inerentes à esfera de subjetividade do indivíduo – para que o dano seja indenizado", declarou.

O ministro reforçou que a jurisprudência do STJ é firme no sentido de admitir a reparação de danos decorrentes da perda de chance nas hipóteses em que houver demonstração dos elementos ensejadores do dever de indenizar e quando a chance perdida for séria e real, conforme entendimento já consolidado em precedentes como o REsp 1.079.185 e o REsp 1.190.180.

Chances reais

No caso analisado, o relator entendeu que estão presentes todos os elementos necessários para reconhecer o dever de indenizar. Segundo ele, demostrado nos autos o erro na contagem de pontos, "a eliminação do autor torna inequívoca a existência de ato ilícito cometido pelas recorrentes, em clara violação das regras definidas para a competição".

"Também é inequívoco o nexo de causalidade entre a conduta dos organizadores do programa e o dano suportado pelo recorrido, que possuía chances reais de ir para a próxima fase da disputa e, chegando à final, eventualmente sair vencedor", completou.

Para o ministro, embora o resultado final dependesse do êxito do autor em mais duas provas, não há como afastar a aplicação da teoria da perda de uma chance, "pois sua eliminação de forma indevida e contrária às regras da competição interrompeu um fluxo possível dos eventos".

Valor das indenizações

Villas Bôas Cueva explicou que, para quantificar o dano por perda de uma chance, o TJSP entendeu que, se o autor tivesse sido submetido à rodada de desempate com outro competidor, ele teria, em tese, 50% de probabilidade de sair vencedor da fase semifinal. Posteriormente, na fase final, a chance de vencer também seria de 50%, concluindo-se que a probabilidade total de obter a vantagem esperada – a vitória na competição – era de 25%.

Segundo o relator, o acórdão recorrido acertou ao fixar a indenização por danos materiais pela perda da chance em R$ 125 mil, valor que corresponde a 25% do total do prêmio de R$ 500 mil.

Com relação aos danos morais, para o ministro, o acolhimento da pretensão recursal no sentido de afastar a indenização ou reduzir o valor arbitrado esbarraria na Súmula 7/STJ. Ainda que superado esse óbice, "a indenização por danos morais foi arbitrada em conformidade com os parâmetros adotados por este tribunal (R$ 25 mil), não se mostrando excessiva diante das circunstâncias do caso concreto".

RECURSO ESPECIAL Nº 1.757.936 - SP (2018/0050733-1)
RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
RECORRENTE : RÁDIO E TELEVISÃO RECORD S.A
ADVOGADOS : BENEDICTO CELSO BENÍCIO - SP020047
BENEDICTO CELSO BENICIO JUNIOR - SP131896
ADRIANA COUTINHO PINTO - SP201531
LUCIANA APARECIDA DOS SANTOS - SP183890
RENATA STRUZANI DE SOUZA MOREIRA - SP254200
PEDRO ROBSON FERREIRA DE SOUSA - SP296896
ALEXANDRE DE PAULO VIEIRA E OUTRO(S) - SP333598
RECORRENTE : ENDEMOL BRASIL PRODUÇÕES LTDA
ADVOGADO : JOAO PAULO MORELLO E OUTRO(S) - SP112569
RECORRIDO : ALEXEY DODSWORTH MAGNAVITA DE CARVALHO
ADVOGADO : EDIVANIO GONÇALVES DA COSTA E OUTRO(S) - SP334803
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR
DANOS. REALITY SHOW. FASE SEMIFINAL. CONTAGEM DOS PONTOS. ERRO.
ELIMINAÇÃO. ATO ILÍCITO. INDENIZAÇÃO. DANO MATERIAL. PERDA DE UMA
CHANCE. CABIMENTO. DANOS MORAIS DEMONSTRADOS.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código
de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. Cinge-se a controvérsia a discutir o cabimento de indenização por perda de
uma chance na hipótese em que participante de reality show é eliminado da
competição por equívoco cometido pelos organizadores na contagem de pontos.
3. A teoria da perda de uma chance tem por objetivo reparar o dano decorrente
da lesão de uma legítima expectativa que não se concretizou porque determinado
fato interrompeu o curso normal dos eventos e impediu a realização do resultado
final esperado pelo indivíduo.
4. A reparação das chances perdidas tem fundamento nos artigos 186 e 927 do
Código Civil de 2002 e é reforçada pelo princípio da reparação integral dos
danos, consagrado no art. 944 do CC/2002.
5. Deve ficar demonstrado que a chance perdida é séria e real, não sendo
suficiente a mera esperança ou expectativa da ocorrência do resultado para que
o dano seja indenizado.
6. Na presente hipótese, o Tribunal de origem demonstrou que ficaram
configurados os requisitos para reparação por perda de uma chance, tendo em
vista (i) a comprovação de erro na contagem de pontos na rodada semifinal da
competição, o que tornou a eliminação do autor indevida, e (ii) a violação das
regras da competição que asseguravam a oportunidade de disputar rodada de
desempate.
7. O acolhimento da pretensão recursal, no sentido de afastar a indenização por
danos morais ou de reduzir o valor arbitrado, demandaria o revolvimento do
acervo fático-probatório dos autos (Súmula nº 7/STJ).
8. O montante arbitrado a título de indenização por danos morais (R$ 25.000,00 - vinte e cinco mil reais) encontra-se em conformidade com os parâmetros
adotados por esta Corte, não se mostrando excessivo diante das particularidades
do caso concreto.
9. Recursos especiais não providos.
ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a
Terceira Turma, por unanimidade, negar provimento aos recursos especiais, nos termos do voto
do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro (Presidente),
Nancy Andrighi e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 20 de agosto de 2019(Data do Julgamento)
Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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