Cabe agravo de instrumento contra decisão sobre intervenção de terceiros que altera competência

Cabe agravo de instrumento contra decisão sobre intervenção de terceiros que altera competência

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que cabe agravo de instrumento contra decisão que trata da admissão de terceiro em ação judicial, com o consequente deslocamento da competência para Justiça distinta. Para o colegiado, nessa hipótese, a intervenção de terceiro – recorrível de imediato por agravo de instrumento (artigo 1.015, inciso IX, do Código de Processo Civil) –, além de influenciar o modo de se decidir a competência, exerce relação de dominância sobre ela, sendo cabível o uso do agravo.

O recurso especial teve origem em ação de responsabilidade obrigacional ajuizada por segurados contra uma companhia de seguros. A Caixa Econômica Federal (CEF) manifestou interesse em integrar a demanda de três dos autores. Com isso, apenas para eles, a competência para o julgamento do processo foi declinada para a Justiça Federal.

A seguradora interpôs agravo de instrumento, argumentando a necessidade de intervenção da CEF em relação aos demais autores, mas o Tribunal de Justiça do Paraná não conheceu do recurso por entender que a decisão quanto à matéria de competência não se encaixa nas possibilidades do rol taxativo do artigo 1.015 do CPC.

Natureza complexa

Segundo a relatora do recurso especial, ministra Nancy Andrighi, o pronunciamento jurisdicional que admite ou inadmite a intervenção de terceiro e que, por esse motivo, modifica ou não a competência, "possui natureza complexa, pois reúne, na mesma decisão judicial, dois conteúdos que, a despeito de sua conexão, são ontologicamente distintos e suscetíveis de inserção em compartimentos estanques".

Para estabelecer a natureza da conexão entre os dois conteúdos, a ministra explicou que pode ser usada como critério a preponderância da carga decisória, ou seja, qual dos elementos que compõem o pronunciamento judicial é mais relevante.

"A partir desse critério, conclui-se que a intervenção de terceiro exerce relação de dominância sobre a competência, sobretudo porque, na hipótese, somente se pode cogitar uma alteração de competência do órgão julgador se – e apenas se – houver a admissão ou inadmissão do terceiro apto a provocar essa modificação", disse.

A relatora destacou que o segundo critério que se pode utilizar é o do antecedente-consequente e a ideia das questões prejudiciais e a das prejudicadas, em que se verifica se a intervenção de terceiro influencia o modo de se decidir a competência.

"No ponto, conclui-se que a intervenção de terceiro é o antecedente que leva, consequentemente, ao exame da competência, induzindo a um determinado resultado – se deferido o ingresso do terceiro sujeito à competência prevista no artigo 109, I, da Constituição Federal, haverá alteração da competência para a Justiça Federal; se indeferido o ingresso do terceiro sujeito à competência prevista no artigo 109, I, da Constituição Federal, haverá manutenção da competência na Justiça estadual."

Decorrência lógica

Para a ministra, é relevante examinar se o agravo de instrumento interposto pela recorrente se dirige à questão da intervenção de terceiro ou à questão da competência. Segundo ela, o foco da irresignação da companhia de seguros foi o fato de que o interesse jurídico que justificou a intervenção da CEF também existiria para todos os demais autores, tendo, em sua argumentação no recurso especial, apenas indicado que a remessa do processo para a Justiça Federal teria como consequência uma série de prejuízos processuais.

"Por qualquer ângulo que se examine a controvérsia, conclui-se que a decisão que versa sobre a admissão ou inadmissão de terceiro é recorrível de imediato por agravo de instrumento fundado no artigo 1.015, IX, do CPC/2015, ainda que da intervenção resulte modificação ou não da competência – que, nesse contexto, é uma decorrência lógica, evidente e automática do exame da questão principal", afirmou Nancy Andrighi.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.797.991 - PR (2019/0044742-7)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : SUL AMERICA COMPANHIA NACIONAL DE SEGUROS
ADVOGADOS : JOÃO FILIPE PARPINELLI - RS090570
ENEIDA DE CASSIA CAMARGO - PR044759
PAULO ANTONIO MULLER - PR067090
MARCO AURELIO MELLO MOREIRA - PR088898
RECORRIDO : JOSÉ MARIA
RECORRIDO : JUMARIO ALVES DA CRUZ
RECORRIDO : JURACI MEDEIROS LEAL
RECORRIDO : LEA APARECIDA DOS SANTOS
RECORRIDO : LIANE DE FATIMA GUIMARAES
RECORRIDO : LOURIVAL DOS SANTOS BUENO
RECORRIDO : LOURIVAL JOSE DE SOUZA
RECORRIDO : MARIA CANDIDA DA SILVA
RECORRIDO : MARIA DA LUZ BUENO
RECORRIDO : MARIA NEUZA COIMBRA
RECORRIDO : MARGARIDA DE SOUZA CASTRO
RECORRIDO : NELSON TEMPS
RECORRIDO : OSMAR DOS ANJOS PAES
RECORRIDO : PAULO BUENO ALVES
RECORRIDO : PEDRO DA LUZ
RECORRIDO : PEDRO RAIMUNDO DOS SANTOS
RECORRIDO : REGINA DE JESUS BITTENCOURT PEREIRA
RECORRIDO : ROSA APARECIDA ARAUJO DA SILVA
RECORRIDO : SEBASTIAO PULIN DE OLIVEIRA
RECORRIDO : TEREZINA SCHARAIBER DOS SANTOS
ADVOGADO : DIOGO LUIZ MARTINS - SC016857
INTERES. : CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
EMENTA
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE RESPONSABILIDADE OBRIGACIONAL
SECURITÁRIA. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE ADMITE A INTERVENÇÃO DE
TERCEIRO E DECLINA DA COMPETÊNCIA PARA A JUSTIÇA FEDERAL.
RECORRIBILIDADE IMEDIATA. ART. 1.015, IX, DO CPC/15.
PRONUNCIAMENTO JUDICIAL DE DUPLO CONTEÚDO. CRITÉRIOS DE EXAME.
INTERVENÇÃO DE TERCEIRO QUE É O ELEMENTO PREPONDERANTE DA
DECISÃO JUDICIAL. ESTABELECIMENTO DE RELAÇÃO DE
ANTECEDENTE-CONSEQUENTE. IMPUGNAÇÃO ADEQUADA DA PARTE, QUE
SE VOLTA ESSENCIALMENTE AOS MOTIVOS PELOS QUAIS A INTERVENÇÃO É
NECESSÁRIA EM RELAÇÃO A TODAS AS PARTES. DELIBERAÇÃO SOBRE O
DESLOCAMENTO DA COMPETÊNCIA QUE É DECORRÊNCIA LÓGICA,

EVIDENTE E AUTOMÁTICA DO EXAME DA QUESTÃO PREPONDERANTE.
1- Ação proposta em 14/08/2009. Recurso especial interposto em
21/08/2018 e atribuído à Relatora em 12/03/2019.
2- O propósito recursal é definir se a decisão interlocutória que versa, a um
só tempo, sobre a intervenção de um terceiro com o consequente
deslocamento da competência para justiça distinta é impugnável desde logo
por agravo de instrumento fundado na regra do art. 1.015, IX, do CPC/15.
3- O pronunciamento jurisdicional que admite ou inadmite a intervenção de
terceiro e que, em virtude disso, modifica ou não a competência, possui
natureza complexa, pois reúne, na mesma decisão judicial, dois conteúdos
que, a despeito de sua conexão, são ontologicamente distintos e suscetíveis
de inserção em compartimentos estanques.
4- Em se tratando de decisão interlocutória com duplo conteúdo –
intervenção de terceiro e competência – é possível estabelecer, como
critérios para a identificação do cabimento do recurso com base no art.
1.015, IX, do CPC/15: (i) o exame do elemento que prepondera na decisão;
(ii) o emprego da lógica do antecedente-consequente e da ideia de questões
prejudiciais e de questões prejudicadas; (iii) o exame do conteúdo das razões
recursais apresentadas pela parte irresignada.
5- Aplicando-se tais critérios à hipótese em exame, verifica-se que: (i) a
intervenção de terceiro exerce relação de dominância sobre a competência,
porque somente se cogita a alteração de competência do órgão julgador se
houver a admissão ou inadmissão do terceiro apto a provocar essa
modificação; (ii) a intervenção de terceiro é o antecedente que leva,
consequentemente, ao exame da competência, induzindo a um determinado
resultado – se deferido o ingresso do terceiro sujeito à competência prevista
no art. 109, I, da Constituição Federal, haverá alteração da competência
para a Justiça Federal e, se indeferido o ingresso do terceiro sujeito à
competência prevista no art. 109, I, da Constituição Federal, haverá a
manutenção da competência na Justiça Estadual; (iii) a irresignação da parte
recorrente está no fato de que o interesse jurídico que justificaria a
intervenção da Caixa Econômica Federal existiria em relação a todas as
partes e não em relação a somente algumas, tendo sido declinados os
fundamentos de fato e de direito correspondentes a essa pretensão e
apontado que a remessa do processo para a Justiça Federal teria como
consequência uma série de prejuízos de índole processual.
6- Recurso especial conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira

Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer e dar provimento ao
recurso especial nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de
Tarso Sanseverino, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra
Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva.
Brasília (DF), 18 de junho de 2019(Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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