Regras do CDC não podem ser usadas para afastar cláusula compromissória que prevê arbitragem

Regras do CDC não podem ser usadas para afastar cláusula compromissória que prevê arbitragem

Não é possível afastar a cláusula compromissória que prevê arbitragem com base em regras do Código de Defesa do Consumidor (CDC), já que nessas hipóteses deve ser respeitado o princípio competência-competência e, de acordo com as regras do artigo 8º da Lei 9.307/1996, a Lei de Arbitragem, cabe ao juízo arbitral pronunciar-se acerca da validade da cláusula, antes que o juízo estatal possa se manifestar sobre a controvérsia.

O caso envolvia duas empresas do complexo de atividades de exploração energética de gás. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no sentido da impossibilidade de afastamento do princípio competência-competência foi reafirmada pela Terceira Turma, ao dar provimento a um recurso da Sonangol Hidrocarbonetos para extinguir o processo e permitir que o juízo arbitral pudesse analisar a existência, validade e eficácia da cláusula contratual que previa a arbitragem como método para solução de conflitos.

Após a rescisão de contrato para transporte de gás da Sonangol, a TPG do Brasil ajuizou ação questionando a rescisão e pleiteando indenização pelos prejuízos sofridos com a quebra do contrato.

A sentença afastou a preliminar da convenção de arbitragem prevista no contrato de adesão por entender que a disparidade econômica entre as empresas prejudicava a possibilidade de a TPG do Brasil estabelecer condições contratuais favoráveis, não podendo ser presumido o seu consentimento quanto a cláusula compromissória. No mérito, a Sonangol foi condenada a indenizar a TPG do Brasil pelos custos suportados para a efetivação do contrato.

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN) manteve a sentença que julgou procedente o pedido de indenização, aplicando analogamente regras do CDC para justificar o afastamento da cláusula de arbitragem.

Prevalência arbitral

Segundo o relator do caso, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, o TJRN, com base na alegada hipossuficiência da TPG, aplicou indevidamente regras do CDC para afastar a prevalência da cláusula arbitral.

"Essa decisão apresenta-se frontalmente contrária à linha jurisprudencial desta Corte Superior, que interpreta a norma extraída do parágrafo único do artigo 8º da Lei de Arbitragem como de caráter obrigatório e vinculante, derrogando-se a jurisdição estatal", explicou.

Sanseverino destacou que a alegação de nulidade da cláusula arbitral – bem como do contrato que contém essa regra – deve ser submetida, em primeiro lugar, à deliberação do juízo arbitral.

A alegada hipossuficiência, de acordo com o relator, não é razão suficiente para afastar os efeitos de cláusula de arbitragem existente, válida e eficaz.

"Ressalte-se que o contrato, mesmo padronizado, foi pactuado entre duas empresas que atuam no complexo ramo de atividades de exploração energética de gás, não sendo possível o reconhecimento da hipossuficiência de qualquer delas para efeito de aplicação analógica do CDC, embora possa existir uma assimetria entre elas", justificou o ministro.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.598.220 - RN (2016/0115824-0)
RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO
RECORRENTE : SONANGOL HIDROCARBONETOS BRASIL LTDA
ADVOGADOS : GUSTAVO FERNANDES DE ANDRADE E OUTRO(S) - RJ087989
MAURO PEDROSO GONÇALVES - DF021278
ROBERTO DE ALBUQUERQUE TOLENTINO - RN004096
ROBERTO CASTRO DE FIGUEIREDO - RJ121315
RECORRIDO : TPG INDUSTRIA E COMERCIO LTDA - ME
ADVOGADO : JAILTON MAGALHÃES DA COSTA - RN008848
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL
CIVIL. ARBITRAGEM. CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA.
COMPETÊNCIA DO JUÍZO ARBITRAL. PRINCÍPIO
KOMPETENZ-KOMPETENZ. PRECEDENTES. DISSÍDIO
NOTÓRIO.
1. Contrato celebrado entre as partes com cláusula
compromissória expressa, estabelecendo a arbitragem como
instrumento para solução das controvérsias resultantes de
qualquer disputa ou reivindicação dele decorrente, e
impossibilitando que as partes recorram ao Poder Judiciário
para solucionar contenda relativa ao seu cumprimento.
2. O princípio Kompetenz-Kompetenz, positivado no art. 8º, §
único, da Lei n. 9.307/96, determina que a controvérsia
acerca da existência, validade e eficácia da cláusula
compromissória deve ser resolvida, com primazia, pelo juízo
arbitral, não sendo possível antecipar essa discussão perante
a jurisdição estatal.
3. Incumbe, assim, ao juízo arbitral a decisão acerca de todas
questões nascidas do contrato, inclusive a própria existência,
validade e eficácia da cláusula compromissória.
4. A hipossuficiência reconhecida na origem não é causa
suficiente para caracterização das hipóteses de exceção à
cláusula Kompetenz-Kompetenz.
5. Dissídio notório do acórdão recorrido com a linha
jurisprudencial do STJ acerca da questão.
6. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por
unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro
(Presidente) e Nancy Andrighi votaram com o Sr. Ministro Relator.
Dr. MAURO PEDROSO GONÇALVES, pela parte RECORRENTE:
SONANGOL HIDROCARBONETOS BRASIL LTDA
Dr. ALEXANDRE RODRIGO VELOSO, pela parte RECORRIDA: TPG
INDUSTRIA E COMERCIO LTDA - ME
Dr. IGOR CESAR RODRIGUES DOS ANJOS, pela parte RECORRIDA:
TPG INDUSTRIA E COMERCIO LTDA - ME
Brasília, 25 de junho de 2019(data do julgamento)
MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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