STJ define conceito de decisão interlocutória que versa sobre tutela provisória no CPC
Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o conceito de “decisão interlocutória que versa sobre tutela provisória” abrange as decisões que examinam a presença ou não dos pressupostos que justificam o deferimento, indeferimento, a revogação ou alteração da tutela provisória e também as decisões que dizem respeito ao prazo e ao modo de cumprimento da tutela, à adequação, suficiência, proporcionalidade ou razoabilidade da técnica de efetivação da tutela provisória e, ainda, à necessidade ou dispensa de garantias para a sua concessão, revogação ou alteração.
De acordo com a relatora, ministra Nancy Andrighi, “o artigo 1.015, I, do Código de Processo Civil de 2015 deve ser lido e interpretado como uma cláusula de cabimento de amplo espectro, de modo a permitir a recorribilidade imediata das decisões interlocutórias que digam respeito não apenas ao núcleo essencial da tutela provisória, mas também que se refiram aos aspectos acessórios que estão umbilicalmente vinculados a ela, porque, em todas essas situações, há urgência que justifique o imediato reexame da questão em segundo grau de jurisdição”.
No entanto, Nancy Andrighi ressalvou que isso não significa dizer que toda e qualquer questão relacionada ao cumprimento, à operacionalização ou implementação fática da tutela provisória se enquadra no conceito de decisão interlocutória que versa sobre tutela provisória e, consequentemente, possa ser impugnada de imediato.
Despesas
Com base nesse entendimento, a turma decidiu que o conceito de “decisões interlocutórias que versarem sobre tutelas provisórias”, previsto no artigo 1.015, I, do CPC, não abrange a decisão interlocutória que impõe ao credor fiduciário o dever de arcar com as despesas relacionadas ao depósito de automóvel em pátio de terceiro.
Por unanimidade, o colegiado negou recurso de credor fiduciário de uma empresa que foi alvo de ação de busca e apreensão de veículo. O banco, em decisão interlocutória, foi condenado a custear as despesas relacionadas ao veículo apreendido pela Polícia Rodoviária Federal.
Segundo os autos, em 13 de março de 2014, foi determinada a busca e apreensão de uma série de veículos alienados fiduciariamente e que foram dados em garantia da dívida contraída pela empresa. Uma das medidas resultou na apreensão de um veículo pela polícia e no seu recolhimento ao pátio do órgão.
Dois anos depois, o banco requereu a liberação do veículo sem quaisquer custos para si, alegando que as despesas relacionadas ao depósito deveriam ser pagas pela empresa devedora.
Em primeiro grau, o requerimento do banco foi indeferido, sob o argumento de que as despesas e os débitos tributários referentes à liberação do veículo devem ser custeados pelo credor fiduciário. O recurso apresentado ao Tribunal de Justiça do Paraná não foi conhecido.
Ao recorrer ao STJ, o banco alegou que a decisão judicial que não reconheceu ser do devedor fiduciante a obrigação de pagar as despesas do pátio equivalia à revogação parcial da liminar anteriormente deferida, motivo pelo qual seria cabível o recurso de agravo de instrumento com base no artigo 1.015, I, do CPC.
Distinção
No caso analisado, segundo a ministra Nancy Andrighi, a decisão interlocutória que impõe ao beneficiário o dever de arcar com as despesas da estadia do bem móvel objeto da apreensão em pátio de terceiro não se relaciona de forma indissociável com a tutela provisória.
Para ela, a interlocutória diz respeito a aspectos externos e dissociados do conceito principal, relacionando-se com a executoriedade, operacionalização ou implementação fática da medida.
“A relação estabelecida entre a decisão interlocutória que disciplina o modo de custeio da execução da tutela provisória e a decisão interlocutória que versa sobre tutela provisória é, pois, muitíssimo distante e dissociada, quase inexistente, não se podendo enquadrar a primeira na hipótese de cabimento do artigo 1.015, I, do CPC/2015, por mais amplo que seja o seu espectro”, afirmou.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.752.049 - PR (2018/0164549-8)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : BANCO SAFRA S A
ADVOGADOS : ALEXANDRE NELSON FERRAZ - PR030890
ALEXANDRE N. FERRAZ & CICARELLI ADVOGADOS ASSOCIADOS - PR000918
RECORRIDO : V PILATI EMPRESA DE TRANSPORTES RODOVIARIOS LTDA
ADVOGADOS : JULIANO HUCK MURBACH - PR023562
ANDRÉ VINICIUS BECK LIMA - PR034774
ANTONIO AUGUSTO GRELLERT - PR038282
EMENTA
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. CONCEITO DE
“DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE VERSA SOBRE TUTELA PROVISÓRIA” PARA
FINS DE RECORRIBILIDADE IMEDIATA COM BASE NO ART. 1.015, I, DO
CPC/15. ABRANGÊNCIA. CONCEITO QUE COMPREENDE O EXAME DOS
PRESSUPOSTOS AUTORIZADORES, A DISCIPLINA SOBRE O MODO E PRAZO
PARA CUMPRIMENTO, A ADEQUAÇÃO DAS TÉCNICAS DE EFETIVAÇÃO E A
NECESSIDADE OU A DISPENSA DE GARANTIAS. EXTENSÃO PARA A HIPÓTESE
EM QUE SE IMPÔS AO BENEFICIÁRIO O DEVER DE ARCAR COM AS DESPESAS
DE ESTADIA DO BEM IMÓVEL EM PÁTIO DE TERCEIRO. IMPOSSIBILIDADE.
1- Ação proposta em 18/02/2014. Recurso especial interposto em
27/11/2017 e atribuído à Relatora em 13/07/2018.
2- O propósito recursal é definir se o conceito de “decisões interlocutórias
que versarem sobre tutelas provisórias”, previsto no art. 1.015, I, do CPC/15,
abrange também a decisão interlocutória que impõe ao credor fiduciário o
dever de arcar com as despesas relacionadas ao depósito do bem em pátio
de terceiro.
3- O conceito de “decisão interlocutória que versa sobre tutela provisória”
abrange as decisões que examinam a presença ou não dos pressupostos que
justificam o deferimento, indeferimento, revogação ou alteração da tutela
provisória e, também, as decisões que dizem respeito ao prazo e ao modo
de cumprimento da tutela, a adequação, suficiência, proporcionalidade ou
razoabilidade da técnica de efetiva da tutela provisória e, ainda, a
necessidade ou dispensa de garantias para a concessão, revogação ou
alteração da tutela provisória.
4- Na hipótese, a decisão interlocutória que impõe ao beneficiário o dever
de arcar com as despesas da estadia do bem móvel objeto da apreensão em
pátio de terceiro não se relaciona de forma indissociável com a tutela
provisória, mas, sim, diz respeito a aspectos externos e dissociados do
conceito elementar desse instituto, relacionando-se com a executoriedade,
operacionalização ou implementação fática da medida.
5- Recurso especial conhecido e desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer do recurso especial e
negar-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros
Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura
Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 12 de março de 2019(Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora