Contrato eletrônico com assinatura digital, mesmo sem testemunhas, é título executivo

Contrato eletrônico com assinatura digital, mesmo sem testemunhas, é título executivo

Um contrato de mútuo eletrônico celebrado sem a assinatura de testemunhas pode, excepcionalmente, ter a condição de título executivo extrajudicial e, dessa forma, permitir a execução em caso de inadimplência.

Baseada nesse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a recurso da Fundação dos Economiários Federais (Funcef) para determinar o prosseguimento de uma execução, por entender que o contrato firmado eletronicamente e com assinatura digital prescinde da assinatura das testemunhas previstas no artigo 585, inciso II, do Código de Processo Civil de 1973.

Segundo o relator do caso, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, nem o Código Civil nem o Código de Processo Civil (inclusive o de 2015) são permeáveis à realidade vigente, em virtude da evolução tecnológica vivenciada nas últimas décadas.

Segurança e autenticidade

A utilização em massa dessas novas tecnologias impõe um novo olhar do Poder Judiciário, incluindo, segundo o relator, o reconhecimento da executividade de determinados títulos, “em face da nova realidade comercial, com o intenso intercâmbio de bens e serviços em sede virtual”.

Sanseverino destacou que os contratos eletrônicos só se diferenciam dos demais em seu formato, possuindo requisitos de segurança e autenticidade.

“A assinatura digital de contrato eletrônico tem a vocação de certificar, através de terceiro desinteressado (autoridade certificadora), que determinado usuário de certa assinatura a utilizara e, assim, está efetivamente a firmar o documento eletrônico e a garantir serem os mesmos os dados do documento assinado que estão a ser sigilosamente enviados”, disse o ministro.

Eficácia de título

No caso analisado pelo colegiado, o financiamento foi firmado eletronicamente no site da instituição financeira, sem a presença de testemunhas. Verificada a inadimplência, a Funcef ajuizou execução contra o tomador do empréstimo, pleito que foi extinto sem resolução de mérito em primeira instância, sob o argumento da taxatividade do rol de títulos extrajudiciais aptos a serem executados, sendo que, entre eles, não se encontra documento particular sem testemunhas, como o contrato eletrônico.

No entendimento do juízo de primeiro grau, ratificado pela segunda instância, o contrato eletrônico, apesar de válido e verdadeiro, não produz a eficácia de um título executivo extrajudicial.

Exigência inviável

No voto, acompanhado pela maioria da turma, Sanseverino justificou que a exigência formal das testemunhas poderia ser inviável no ambiente virtual. O sistema, segundo o ministro, foi concebido para não necessitar de demais encaminhamentos, e as assinaturas eletrônicas são utilizadas amplamente em outros meios, como no processo eletrônico judicial.

“A assinatura digital do contrato eletrônico, funcionalidade que, não se deslembre, é amplamente adotada em sede de processo eletrônico, faz evidenciada a autenticidade do signo pessoal daquele que a apôs e, inclusive, a confiabilidade de que o instrumento eletrônico assinado contém os dados existentes no momento da assinatura”, observou o relator.

Sanseverino ressaltou que o executado nem sequer foi citado para responder à execução, oportunidade em que poderá suscitar defesa que entenda pertinente, inclusive questionando o método de celebração do contrato.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.495.920 - DF (2014/0295300-9)
RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO
RECORRENTE : FUNDAÇÃO DOS ECONOMIÁRIOS FEDERAIS FUNCEF
ADVOGADOS : ESTEFANIA FERREIRA DE SOUZA DE VIVEIROS E
OUTRO(S) - DF011694
MARINA PAIVA VALLADÃO EVARISTO E OUTRO(S) - DF033302
RECORRIDO : EMERSON MARTINELI RODIGUERO
ADVOGADO : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS - SE000000M
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL.
EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL.
EXECUTIVIDADE DE CONTRATO ELETRÔNICO DE
MÚTUO ASSINADO DIGITALMENTE (CRIPTOGRAFIA
ASSIMÉTRICA) EM CONFORMIDADE COM A
INFRAESTRUTURA DE CHAVES PÚBLICAS BRASILEIRA.
TAXATIVIDADE DOS TÍTULOS EXECUTIVOS.
POSSIBILIDADE, EM FACE DAS PECULIARIDADES DA
CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO, DE SER EXCEPCIONADO O
DISPOSTO NO ART. 585, INCISO II, DO CPC/73 (ART. 784,
INCISO III, DO CPC/2015). QUANDO A EXISTÊNCIA E A
HIGIDEZ DO NEGÓCIO PUDEREM SER VERIFICADAS DE
OUTRAS FORMAS, QUE NÃO MEDIANTE TESTEMUNHAS,
RECONHECENDO-SE EXECUTIVIDADE AO CONTRATO
ELETRÔNICO. PRECEDENTES.
1. Controvérsia acerca da condição de título executivo
extrajudicial de contrato eletrônico de mútuo celebrado sem a
assinatura de duas testemunhas.
2. O rol de títulos executivos extrajudiciais, previsto na
legislação federal em "numerus clausus", deve ser interpretado
restritivamente, em conformidade com a orientação tranquila
da jurisprudência desta Corte Superior.
3. Possibilidade, no entanto, de excepcional reconhecimento da
executividade de determinados títulos (contratos eletrônicos)
quando atendidos especiais requisitos, em face da nova
realidade comercial com o intenso intercâmbio de bens e
serviços em sede virtual.
4. Nem o Código Civil, nem o Código de Processo Civil,
inclusive o de 2015, mostraram-se permeáveis à realidade
negocial vigente e, especialmente, à revolução tecnológica que

tem sido vivida no que toca aos modernos meios de celebração
de negócios, que deixaram de se servir unicamente do papel,
passando a se consubstanciar em meio eletrônico.
5. A assinatura digital de contrato eletrônico tem a vocação de
certificar, através de terceiro desinteressado (autoridade
certificadora), que determinado usuário de certa assinatura a
utilizara e, assim, está efetivamente a firmar o documento
eletrônico e a garantir serem os mesmos os dados do documento
assinado que estão a ser sigilosamente enviados.
6. Em face destes novos instrumentos de verificação de
autenticidade e presencialidade do contratante, possível o
reconhecimento da executividade dos contratos eletrônicos.
7. Caso concreto em que o executado sequer fora citado para
responder a execução, oportunidade em que poderá suscitar a
defesa que entenda pertinente, inclusive acerca da regularidade
formal do documento eletrônico, seja em exceção de
pré-executividade, seja em sede de embargos à execução.
8. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, prosseguindo
no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva,
divergindo do voto do Sr. Ministro Relator, por maioria, dar provimento ao recurso
especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Votou vencido o Sr. Ministro
Ricardo Villas Bôas Cueva. Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze (Presidente) e
Moura Ribeiro votaram com o Sr. Ministro Relator. Impedida a Sra. Ministra Nancy
Andrighi.
Brasília, 15 de maio de 2018. (Data de Julgamento)
MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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