TST decide que multa do artigo 475-J do CPC é inaplicável ao processo trabalhista
A matéria é polêmica: a
possibilidade de aplicação ao processo trabalhista da multa de dez por
cento sobre o valor da condenação em caso de não pagamento pelo devedor
no prazo de quinze dias, conforme estabelece o artigo 475-J do Código de
Processo Civil. Depois de muitas discussões na última Seção I
Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho,
venceu a tese do relator dos embargos, ministro Brito Pereira, no
sentido da incompatibilidade da norma.
Como explicou o relator, o artigo 769 da CLT só permite a aplicação
subsidiária da norma processual civil no processo do trabalho quando
houver omissão da legislação sobre o tema e compatibilidade das normas.
Assim, na medida em que a CLT tem dispositivos específicos para tratar
de liquidação e execução de sentença (artigos 876 a 892), a aplicação do
artigo 475-J, nessas situações, afronta o comando do artigo celetista.
O relator reconhece a angústia do juiz do trabalho, em especial no
momento da execução, para assegurar a efetivação da sentença e a
celeridade da tramitação processual, e ainda garantir o devido processo
legal às partes. Contudo, na opinião do ministro Brito Pereira, as
normas em questão são incompatíveis. Enquanto a regra do artigo 475-J do
CPC fixa prazo de 15 dias para o executado saldar a dívida sob pena de
ter que pagar multa de dez por cento sobre a quantia da condenação, o
artigo 880 da CLT impõe prazo de 48 horas para que o executado pague o
débito ou garanta a execução, sob pena de penhora.
Para o relator, portanto, a aplicação da multa de 10% em caso de não
pagamento em 48 horas contraria os dois dispositivos legais, porque
promove, por um lado, a redução do prazo de quitação do débito previsto
no CPC e, por outro, acrescenta sanção inexistente na CLT. Mesmo se o
julgador fixar prazo de 15 dias para pagar o débito sob pena de receber
multa, estará ampliando o prazo celetista de 48 horas, sem amparo legal.
Por todas essas razões, afirmou o ministro, a falta de pagamento da
quantia em execução pelo devedor deve seguir as orientações do próprio
processo do trabalho.
A divergência
Durante o julgamento, o ministro Vieira de Mello Filho apresentou
voto divergente do relator, por entender que as normas celetistas quanto
ao cumprimento da decisão final por parte do devedor não tratam,
especificamente, da aplicação de penalidade – condição que atende ao
primeiro requisito do artigo 769 da CLT no que diz respeito à
necessidade de omissão da legislação trabalhista para autorizar a
utilização subsidiária das regras do processo comum. De acordo com o
ministro, o silêncio do legislador, ao deixar de criar penalidade
específica no âmbito do processo do trabalho, constitui mero
esquecimento.
Em relação ao segundo requisito mencionado no artigo 769 da CLT – a
compatibilidade entre as normas –, o ministro Vieira também considera
atendido, pois acredita que a aplicação da regra do artigo 475-J do CPC
agiliza o cumprimento das decisões judiciais transitadas em julgado. O
ministro ainda chamou a atenção para o fato de que o TST se utiliza da
legislação processual civil para aplicar multas com o objetivo de
impedir atos processuais protelatórios que retardam o desfecho da causa.
Citou, como exemplo, a aplicação da multa prevista no parágrafo
único do artigo 538 do CPC nos casos de embargos de declaração
protelatórios, ainda que o artigo 897-A da CLT trate das hipóteses de
cabimento dos embargos de declaração, sem se referir a qualquer tipo de
penalidade. Desse modo, diante da semelhança entre as situações
debatidas, o ministro defendeu a aplicação, no processo do trabalho, da
multa do artigo 475-J do CPC. Apesar de minoritária, essa interpretação
foi acompanhada pelos ministros Lelio Bentes Corrêa, Rosa Maria Weber,
Augusto César de Carvalho e o juiz convocado Flávio Portinho Sirangelo.
Inaplicabilidade da norma
Em reforço à tese vencedora do relator, o ministro João Oreste
Dalazen, vice-presidente do TST, argumentou que a aplicação do artigo
475-J do CPC contribui para retardar a satisfação do crédito
trabalhista, uma vez que abre espaço às partes para apresentação de
outros recursos, por exemplo, em torno da própria aplicabilidade da
norma.
O vice-presidente sustentou que as normas são incompatíveis e
conflitam entre si quando se observam as diferenças de prazos e
procedimentos previstos (para o artigo 475-J, o devedor tem 15 dias para
quitar a dívida sob pena de ter que pagar multa de 10%, e para o artigo
880 da CLT, tem 48 horas para pagar a dívida ou garantir a execução,
sob pena de penhora). Isso significa que a CLT permite ao devedor
garantir a execução, já o CPC determina o imediato pagamento da dívida
sob pena de receber uma sanção.
A exigência de citação, nessa fase processual, nos termos da norma
celetista, em comparação com a ausência de citação no processo comum foi
outro ponto de incompatibilidade entre as normas destacado pelo
ministro Dalazen. Por fim, ele lembrou que a nova redação do artigo 880
da CLT (que impõe prazo de 48 horas para o devedor saldar a dívida ou
garantir a execução, sob pena de penhora) é recente (ano 2007), e mesmo
assim o legislador não se referiu à possibilidade de aplicação da multa
do artigo 475-J.
O resultado prático do julgamento é que a SDI-1 excluiu da
condenação do Tijuca Tênis Clube a multa prevista no artigo 475-J do
CPC, como havia sido pedido pela parte e negado na Terceira Turma do
TST.